Raro, mas perigoso. Embora represente apenas 1% do total de casos de câncer, o tumor maligno ósseo foi a causa do óbito de 108 pessoas somente nos seis primeiros meses de 2018, no Ceará, segundo os dados mais recentes da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa), registrados até 2 de julho. Destas, 54 tinham idade igual ou superior a 60 anos.
A predominância dos óbitos nesta faixa etária se mantém desde 2016, quando foram registradas 122 mortes pela doença no Ceará; destas, 62 eram pessoas com 60 anos ou mais. Em 2017, foram 105 óbitos, com 52 incluídos nesta faixa etária. O menor índice de mortes é o de pacientes de até 9 anos de idade, que tiveram um total de quatro óbitos de 2016 a julho de 2018.
A doença rara pode se originar de duas formas: a partir de um tumor maligno primário, formado inicialmente no osso; e através da metástase de um câncer que surgiu em outra parte do corpo - sendo, assim, um tumor maligno secundário, conforme explica Roberto Castro, ortopedista oncológico do Hospital Haroldo Juaçaba. Os tipos que mais comumente afetam o osso dessa maneira são os cânceres de mama, de próstata e de tireoide.
Entre as distintas formações, a mais frequente é a lesão óssea maligna metastática, que também atinge prioritariamente os idosos. "São pessoas com idade mais avançada, de 40 a 60 anos, que têm sabidamente outro tumor, ou não sabe que têm e já se manifesta com a metástase óssea".
O oncologista destaca, porém, que é nas duas primeiras décadas de vida que há o maior crescimento ósseo, condição que favorece a transformação da célula normal para uma célula anormal, formando o câncer. Às vezes, segundo Castro, o paciente tem uma fratura patológica, com o osso enfraquecido pelo comprometimento do tumor, e o diagnóstico é "descoberto" através de biópsias e outros exames complementares. No caso do câncer primário, que se inicia no osso, a idade dos pacientes pode variar até a idade de 30 anos.
Sintomas
Uma dor contínua no osso, e que aumenta progressivamente, aliada a um inchaço no local, são os principais sintomas característicos do câncer ósseo. "Hoje em dia, as pessoas querem de imediato recorrer a uma ressonância da perna, do braço, do joelho, quando tem dor naquela região. Na realidade, o mais importante para o diagnóstico do tumor ósseo é um Raio-X simples. Ele permite, em mais de 90% das vezes, que eu tenha a ideia se essa lesão é maligna, se compromete a estabilidade e enfraquece o osso, podendo levar à fratura, e já me dá uma ideia do tecido que forma aquele tumor", detalha o ortopedista oncológico.
Foi dessa forma que Ana Raquel Boriz, 34, recebeu a notícia que marcou sua adolescência. Em 2001, prestes a completar 16 anos, ela caiu durante uma partida de vôlei. Sem conseguir levantar, apesar de não sentir dores, percebeu um inchaço no joelho esquerdo. Ela foi levada até o hospital, onde, após exame de raio-x, foi constatado o tumor ósseo primário.
"Eu estava no primeiro ano do ensino médio e tive que cancelar a matrícula. Fiz quimioterapia por três meses no ICC (Instituto do Câncer do Ceará). Em setembro, fui fazer a cirurgia da retirada do tumor, tiraram todo o osso do joelho, e mais uma 'margem' pra cima e outra pra baixo. Aí colocaram a prótese de platina", relata. Passada a cirurgia, Ana Raquel teve que permanecer no Instituto por mais três meses, para passar pela quimioterapia pós-operatória. A alta foi dada em fevereiro de 2002.
"O efeito ( da quimioterapia)era muito forte. Perdi os cabelos, emagreci bastante. Eu vomitava até a água que eu bebia", lembra. Ao fim do tratamento, ela passou mais um mês fazendo sessões diárias de fisioterapia. A volta às aulas aconteceu logo depois do término da quimioterapia, mas foi somente após três meses que Ana pôde voltar a andar normalmente.
Hoje, ela trabalha como auxiliar administrativa do Corpo de Bombeiros, e a prótese quase não se faz notar. "Dor, só quando 'tá' muito frio. Mas já me acostumei. É só um incômodo. Levo uma vida normal, com algumas limitações. Não posso correr nem engordar, por isso me exercito fazendo natação e hidroginástica".
Diagnóstico
Em diagnósticos similares ao de Ana Raquel, os pontos do corpo mais acometidos são a região distal do fêmur, na coxa, a região proximal da tíbia, na perna e, em seguida, o ombro, por terem um crescimento ósseo mais acentuado nos jovens. Já os tumores originados por metástase não têm predileção por local, mas frequentemente acometem a parte central do osso.
"Além das dores, do inchaço e da deformidade do membro, quando o tumor já está na fase mais avançada, vem o comprometimento do estado geral do paciente. Fraqueza, perda de peso, falta de apetite. Pode vir associado à febre, devido à condição imunológica do paciente, entre outras condições", pontua Roberto Castro.
As abordagens para o tratamento do câncer ósseo também variam de acordo com sua origem. Com relação ao tumor primário, é preciso estudar primeiramente o estado da doença. Essa lesão costuma afetar o pulmão como sítio de metástase por isso, depois de realizar o Raio-x do membro comprometido, é necessária a tomografia computadorizada do tórax. Depois, é indicada uma biópsia e, dependendo do resultado, inicia se o tratamento.
Endoprótese
Cumprindo esse protocolo, dependendo da agressividade do tumor, o tamanho e o local em que ele compromete o osso, é realizada a cirurgia. "Em termos de chance de cura, é a mesma entre você preservar ou amputar o membro", avalia. Entre as possibilidades de táticas cirúrgicas, existe a reconstrução da articulação com uma endoprótese modular não-convencional.
"Eu crio um defeito com a ressecção, e tenho uma prótese que vem em pequenos pedaços, que permite reconstruir a articulação de acordo com o defeito que eu criei. Preservo o membro, resolvo localmente a doença e possibilito que o paciente mantenha a funcionalidade do membro", explica Castro. Em casos extremos, porém, é preciso recorrer à amputação.
Por fim, em cima de onde o tumor foi retirado, é feita uma nova biópsia para ter ideia da resposta do tumor à quimioterapia. Então, avaliam se é preciso uma quimioterapia de pós-operatório, para dar segurança ao paciente.
No caso das lesões metastáticas, a abordagem é modificada porque a doença pode estar em outra víscera. O tratamento do paciente passa a ser feito a fim de oferecer qualidade de vida, podendo ir desde o tratamento não-cirúrgico, só com radioterapia para aliviar a dor e controlar a doença localmente, até a uma abordagem cirúrgica, quando se tem uma lesão suspeita de gerar fratura.