Da arquibancada para dentro do Ceará: Janaína Queiroz e a nova coordenação para mulheres e minorias

Aos 38 anos, alvinegra tem a missão de lutar por inclusão e diversidade no Alvinegro

Janaína Queiroz terá pela frente um novo desafio na vida. Aos 38 anos, a alvinegra vai assumir a nova coordenação voltada para mulheres no Ceará, time do coração. Ela, que recentemente tornou-se conselheira do clube, é uma das fundadoras da Torcedoras Raiz, primeira torcida organizada formada apenas por mulheres, no Nordeste. Plano de sócia-torcedora para mães de baixa renda, camarote para autistas, desconto para sócia-proprietária e segurança da mulher no estádio estão entre os projetos iniciais.

Atualmente, Inês Cabral, torcedora-símbolo, é coordenadora da Torcida Feminina e é a única mulher entre os 30 homens que compõem diretoria, coordenações e executiva da instituição. À Janaína, o convite veio no telefonema de João Paulo Silva, presidente do clube. Neste início, o trabalho será ligado à Diretoria de Promoções e Atividades Sociais, sob comando de Veridiano Pinheiro. No entanto, o trabalho dela deve abranger outras áreas. 

“Vai transitar entre as diretorias. De ação social, de marketing, do futebol feminino também. Vou trabalhar isso com elas. É uma pasta nova que a gente vai desenvolver e ver as necessidades. Tenho algumas coisas em mente, principalmente com relação a inclusão de torcedores, tanto mulheres como pessoas com deficiência…É esse olhar atento também às minorias, que são muito importantes. Tenho certeza que será de grande valia para o clube. Não vou botar minha mão onde eu acho que não vou fazer a diferença. Vou começar com eles, mas colocando também a minha cara e mostrando que já era pra ter esse tipo de movimentação antes. A gente sabe que clube de futebol é muito fechado”, explicou. 

NOVA COORDENAÇÃO E PROJETOS

“Acho que o Castelão tem que ter um camarote para crianças autistas, como a Arena Corinthians. Aqui, como a arena é dos dois clubes, quero que o Alvinegro encabece e seja benéfico para ambos (Ceará e Fortaleza). A questão da segurança da mulher no estádio, que precisa ser mais reforçada, é algo que serve também para os dois clubes. Ver a possibilidade do título de sócia-proprietária ter desconto, para inclusão de novas mulheres no conselho. A viabilidade também de um sócio-torcedor para mães de baixa renda, mães solo…”, apontou. 

Assim, o objetivo de Janaína é ampliar o trabalho voltado não só ao público feminino mas às mulheres que fazem parte direta e diariamente da rotina do Alvinegro, como jogadoras. Mas também sensibilizar o olhar para outras minorias no futebol. A alvinegra sabe que o trabalho não será fácil e busca preparo. Porém, vê a abertura do clube centenário como grande oportunidade de mudança.

“Quero poder me profissionalizar mais, fazer cursos, para poder trazer mais dinâmica para dentro do clube. É um clube muito fechado. Mas é um passo importante. E sei que esse passo começou lá nas Torcedoras Raiz e me tornei conselheira agora. A gente vai se mostrando, e as pessoas vão percebendo a vontade de ajudar. Acho que foi o que aconteceu. Era uma coisa que realmente não se imaginava há dois, três anos… Uma coordenação feminina ativa. João Paulo deixou claro que vou participar de fato. Não vai ser nada só para ter. E eles sabem que não é meu perfil isso”, ressaltou. 

DIRETORIA DO CEARÁ

O Ceará viveu um momento político turbulento, com a renúncia do ex-presidente Robinson de Castro após o rebaixamento do time masculino para a Série B. Atual presidente, João Paulo era diretor financeiro daquela gestão. Janaína avalia o início do novo mandatário.

“Acho que o João Paulo tem conseguido colocar o rosto dele. Depois de uma derrota traumática pra gente, ele dialogou com o torcedor. É uma abertura importante porque eu sempre disse que o Ceará tem uma dívida com a torcida feminina. Vejo boa vontade nele, sinto que querem que eu construa essa pasta, mas vejo a expectativa para que eu construa isso junto com eles, porque, talvez, nem tenham essa percepção e esse olhar mais profundo que posso levar para o clube”, pontuou.

Janaína trabalha como representante comercial, é mãe de Caio e Levi. O amor pelo Ceará é compartilhado por toda a família. Das arquibancadas para a atuação dentro do clube de coração, ela tem buscado conversar com mulheres em cargos semelhantes em outros times pelo Brasil para entender sobre dinâmicas e possibilidades. Ela também pensa em ser diretora um dia. 

“É mais uma oportunidade de trocar ideia com algumas mulheres que façam esse tipo de trabalho. Não sei se isso acontece em outros clubes, mas o Ceará agora vai fazer a diferença, e eu vou participar disso. No momento, não acho que estaria preparada para a diretoria, por exemplo. Gosto de ir devagar, constante, e me capacitando para alcançar voos maiores. É uma oportunidade que eu vou ter de conhecer os processos, me especializar, e aí sim quem sabe fazer parte de uma diretoria. Mas é o que almejo”, revelou. 

A alvinegra garante que será a mesma torcedora de arquibancada. No entanto, consciente da importância da nova função. 

“É gratificante escutar que sou inspiração para outras meninas e mulheres, mas a responsabilidade é imensa. Então, a Janaina que o clube vai encontrar é a torcedora apaixonada, a que vai cuidar desse clube como cuida dos filhos. Mas é a que vai lutar por esses espaços. Vou defender os interesses do Ceará, mas acima de tudo, o torcedor do clube que é o nosso maior patrimônio. É um olhar feminino também que o clube vai ter. Já que passou tanto tempo com esse estereótipo machista, de não se posicionar, de não incluir… É uma oportunidade, acima de tudo pra mim, mas sei também que posso fazer a diferença lá dentro. Todo mundo vai sair do Ceará um dia, mas o clube vai permanecer e é a torcida e a instituição que a gente tem que respeitar. É a mesma Jana das Torcedoras Raiz, mas que sabe da responsabilidade que ela vai ter lá dentro agora”, concluiu.