Ney Latorraca completou 80 anos e a chegada da idade veio tranquila, segundo o ator. Em entrevista à Globo, Ney disse que os números não representam tanto diante da sua vontade de viver e encarar novos desafios.
“Até hoje estou no lucro. Não sei nem explicar como me sinto nessas datas redondas. Dizer que não sente nada é mentira. A gente sente o corpo. Não tem mais aquela vivacidade. Dar três voltas na Lagoa não dá mais. A gente fica querendo menos e vivencia todas as etapas”.
Ney estreou sua primeira novela, Escalada, em 1975. Apenas um ano depois de se mudar para o Rio de Janeiro para trabalhar na TV Globo.
Na novela, escrita por Lauro César Muniz e dirigida por Régis Cardoso, Ney, na época com 30 anos, dava vida a Felipe.
Este foi o ponto de partida para diversos trabalhos inesquecíveis de Latorraca na Globo, que ano passado renovou seu contrato com a emissora por mais dez anos.
Papéis na televisão
Na televisão, Ney viveu os mais diversos papéis, desde um playboy em Estúpido Cupido, nos anos 70 até um Vampiro em Beijo do Vampiro, de 2003.
Os trabalhos inesquecíveis de Latorraca são inúmeros e isso para o ator foi algo grandioso:
“Ser eclético na arte é uma delícia para mim. Não é aquela coisa acomodada no sentimento. É sempre uma coisa de risco, mas de nível. As comédias, os musicais... Tudo é uma maneira de eu me exercitar. Mesmo com 80 anos, me sinto como se estivesse na escola de teatro, começando tudo de novo”, disse.
Ney, também falou do quanto ama ter novos desafios, “Me mantém vivo! Claro, tem fases que estou com preguiça, que quero estar na minha casa. Tenho preguiça. O conforto que tenho conquistei com o meu trabalho”.
Vida tranquila
O ator vive em uma cobertura, na zona sul do Rio de Janeiro. Casado há 20 anos com o escritor, ator e diretor Edi Botelho, de 64 anos, com quem passa a maior parte do tempo. Na casa dos dois, Ney passa horas com suas orquídeas, toma banho de piscina e lê bastante. Sobre a vida mais caseira, Latorraca comentou:
“As pessoas falam que estou muito retraído, dentro de casa. Já fui arroz de festa. Eu gosto de estar na minha casa. Sou muito sincero. A pessoa convida, eu digo que não posso ir. E quando perguntam por que não vou, digo simplesmente: 'Porque não quero'”.
Além disso, Ney também tem o costume de revisitar seus trabalhos, os assistindo pela Globoplay, mas é bastante crítico quanto as próprias atuações.
"Eu não tinha tempo de ver e hoje faria tudo diferente. Sou muito crítico. Me questiono porque fiz aquilo. Porque não fiz menos... Minha exuberância me leva para um caminho de realização que se eu danço tango, danço mesmo. Se é para chorar, eu choro. Vou com tudo! É uma delícia isso."
Sem medo do tempo
Ney não é contra procedimentos estéticos, mas contou que não gosta deles. O veterano encara sem medo o espelho e as marcas que o tempo traz:
“Sabe que de vez em quando eu me olho no espelho e vejo rugas que eu não conhecia um dia antes? Elas aparecem de repente, quando olho para aquele espelho maior, com lente de aumento. Mas que loucura! Olho e me pergunto: ‘O que é isso? Eu não tinha!’. Mas têm dias que me olho e falo: ‘Você está muito bem!’. Também disfarço, né! Ponho um boné, um óculos escuros, e pronto!”
Saudade dos amigos
Com sua trajetória eternizada por duas biografias: “Em Muito Além do Script”, de Lucia Rito, e “Uma Celebração”, de Tania Carvalho, Ney confessou que com a idade algo que passa a doer mais é a saudade de amigos que já se foram.
O ator contou que tem um pequeno ritual antes de dormir para não ficar tão nostálgico:
“Deito, rezo um Pai-Nosso, uma Ave-maria e começo a pensar nas pessoas que foram embora. Numa boa, sabe. Aí, vou indo, vou indo e pego no sono. Sonho muito com eles.”
Ney Latorraca disse ainda que a perda de Marília Pera, sua madrinha do teatro, em 2015 o deixou profundamente abalado.
“Fiquei muito mal com sua morte. Fiquei de luto, triste. Eu ligava para a Marília todos os dias para falar as mesmas coisas. Falava sobre as peças que eu fazia e ela dizia: ‘Já reparou que quando você liga para mim, só você fala?’ Eu falava, ‘Tá bom, não vou ligar mais para você.’ E ligava um minuto depois.”
Os pais de Latorraca eram um crooner e uma corista, que costumavam se apresentar nos cassinos do Rio. Como padrinho de batismo, Ney teve o ator Grande Otelo.
Durante sua infância, o ator passou por dificuldades financeiras e chegou até a passar fome, mas nunca desistiu de seus sonhos. Ao olhar para o passado, Latorraca afirma que tudo valeu a pena:
“Ele (Ney menino) apostou e deu certo. Valeu a pena ter feito tudo isso com a maneira de ser como profissional. Sou um apaixonado pelo que faço no cinema, no teatro e na televisão. Tenho orgulho de ter sido um ótimo filho, um bom amigo e um bom ator. Mas ator só acaba quando morre, né?”