Na última década, 183 bebês cearenses menores de um ano foram diagnosticados com tuberculose – uma doença prevenível com a vacina BCG. Só neste ano, sete pacientes dessa faixa-etária já foram notificados com a infecção, como detalha a plataforma IntegraSUS da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa).
A tuberculose é uma doença causada pela bactéria Mycobacterium tuberculosis, conhecida como bacilo de Koch, e afeta principalmente os pulmões, podendo levar à morte.
Entre 2014 e 2023, o Ceará teve uma média de 3,6 mil casos e 206 mortes por tuberculose anualmente. Os dados do IntegraSUS não detalham as mortes por faixa etária, mas a doença preocupa mais quando atinge os pacientes com menos de um ano.
Yolanda Morano, articuladora dos programas de tuberculose e hanseníase do Estado, observa o aumento relacionado com a queda na cobertura vacinal.
“As baixas taxas de vacinação de BCG tem afetado o nosso Estado, o que explica o aumento de casos, e a gente acende o alerta para toda a população porque temos a vacina disponível nos postos de saúde”, detalha.
A BCG é aplicada ao nascer ou, no máximo, nos menores de cinco anos. A meta preconizada pelo Ministério da Saúde (MS) para essa vacina é de 90%. "Sempre fomos campeões nesse quesito, mas nos últimos anos tivemos uma baixa”, acrescenta.
O Estado conseguiu superar a meta de cobertura vacinal da BCG até 2018, quando 104,89% do público foi protegido contra a doença. Já em 2019, o número caiu para 86,05% e atingiu o menor índice em 2020, com 70,2%, de acordo com o MS. O ano de 2020, inclusive, teve o maior número de casos entre bebês no período analisado.
Num movimento de retomada da vacinação, o último ano fechou acima da meta para BCG
Vanuza Chagas, médica pediatra, explica que qualquer pessoa pode ser acometida pela tuberculose, seja vacinada ou não. Mas quem não garante a proteção está sujeito às formas graves da doença. De acordo com o Ministério da Saúde, a vacina BCG apresenta uma eficácia elevada, principalmente contra a forma disseminada da tuberculose, com cerca de 78% de proteção.
"É uma doença ligada à população que vive em situações extremas, como moradores em situação de rua, pacientes em situações sanitárias precárias, pacientes com doenças crônicas", detalha sobre hipertensão, diabetes, obesidade e até a respeito de hábitos como o tabagismo.
"Outro ponto que a gente não pode esquecer são os pacientes com HIV e com doenças que alteram o sistema imunológico, como pacientes em tratamento contra câncer ou que usam corticoides em alta dose", destaca.
Os riscos (para os bebês menores de um ano) já começam pela dificuldade de diagnóstico, os sintomas se confundem com outras doenças do trato respiratório, e há o risco de evoluir para as formas graves
A pneumologista pediátrica Lívia Albuquerque acrescenta estudos e publicações mais recentes ainda mostram uma forte relação entre fatores socioeconômicos e a tuberculose, mas que "nos últimos anos, essa relação vem diminuindo e a tuberculose se tornando uma doença que pode acometer qualquer faixa etária, qualquer situação socioeconômica ou nível de escolaridade."
Em relação à prevenção da tuberculose, vale salientar a importância da vacina BCG, que vai proteger as crianças contra as formas graves da doença, como a tuberculose miliar e a meníngea
A tuberculose também pode afetar outras áreas do corpo – como rins, ossos e meninges. Nesse caso, a doença é chamada de tuberculose extrapulmonar, sendo mais frequente em pessoas vivendo com HIV.
O sintoma mais significativo da tuberculose pulmonar é a tosse, que pode ser seca ou com catarro. Por isso, a recomendação do Ministério da Saúde é que todos os pacientes com sintomas respiratórios, que incluem tosse por três semanas ou mais, passem por uma investigação de tuberculose.
Sintomas da tuberculose
- Tosse por 3 semanas ou mais;
- Febre vespertina;
- Sudorese noturna;
- Emagrecimento.
Como se "pega" a tuberculose?
A transmissão da tuberculose se dá por meio da tosse, fala ou espirro de uma pessoa com a doença ativa e que não faz tratamento. A estimativa é de que um paciente nessa condição possa infectar, em média, de 10 a 15 pessoas.
Contudo, a tuberculose não é transmitida por objetos compartilhados, porque as bactérias que se depositam em roupas, lençois, copos e talheres dificilmente se dispersam no ar e não são de importância para contaminação.
Além disso, como o bacilo é sensível à luz solar, os ambientes ventilados e com luz natural direta dificultam o risco de transmissão.
É importante frisar que os pacientes, geralmente, após 15 dias do início do tratamento, têm redução na possibilidade de contaminar outras pessoas com a doença.
"O paciente transmite a doença, necessita de isolamento e tratamento por 15 dias e, depois disso, ele pode voltar à normalidade e conviver com as pessoas. Enquanto tiver usando os medicamentos direito, não transmite", explica Yolanda.
Como saber se estou com tuberculose?
O diagnóstico da tuberculose pode ser clínico, diferencial, bacteriológico, por meio de exame de imagem, histopatológico (biópsia), dentre outros testes. Por causa da semelhança entre sintomas, a doença pode ser confundida inicialmente com pneumonia ou coqueluche.
Para o diagnóstico laboratorial, são usados três exames: teste rápido molecular para tuberculose (TRM-TB) ou baciloscopia; Cultura; Teste de Sensibilidade aos fármacos. Além disso, deve ser feita avaliação com médico e realização da radiografia do tórax, que é indicada como um método complementar para esse diagnóstico.
"O profissional de saúde, quando desconfia de tuberculose, pede um teste rápido ou uma baciloscopia para ter o diagnóstico", destaca Yolanda.
A partir do momento que a pessoa recebe o diagnóstico de tuberculose, é feita a notificação no sistema e temos a investigação de contato: todas as pessoas que tiveram contato no trabalho, dentro de casa ou no lazer, precisam ser testadas
Tratamento
O tratamento contra a tuberculose é gratuito no Sistema Único de Saúde (SUS) e se estende por, pelo menos, seis meses. No caso, são usados quatro medicamentos para o tratamento dos casos de tuberculose que utilizam o esquema básico: rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol.
Um dos principais desafios para os profissionais da saúde é a interrupção do tratamento contra a tuberculose, porque parte dos pacientes não dá seguimento ao uso dos remédios quando há uma melhora do quadro. Isso pode gerar uma resistência da doença e dificultar a cura.
"Quando o paciente deixa de tomar o remédio da tuberculose por mais de 30 dias, isso é uma interrupção do tratamento e deixa o leque aberto para a resistência. Temos um tratamento diretamente observado, feito pela equipe de saúde, com um acolhimento na atenção primária para que o paciente não deixe o tratamento", analisa Yolanda.