Com o cenário de chuvas intensas no Ceará, 8 cidades já registram o dobro do volume de precipitações previsto para o mês de março inteiro. Em Porteiras, por exemplo, o acumulado já supera a média histórica em 172%.
Os dados são da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), coletados pelo Diário do Nordeste às 15h dessa segunda-feira (27).
No Ceará como um todo, o volume esperado para março também já foi ultrapassado. A “normal pluviométrica”, que corresponde à média histórica, é de 203.4 milímetros – mas até ontem (27), o mês já registrava 252.3 mm de chuvas (24% acima).
Chuvas já eram esperadas
O volume de precipitações pode impressionar, principalmente diante dos efeitos estruturais, mas já era esperado, como aponta Lucas Fumagalli, meteorologista da Funceme. “Já aconteceram chuvas mais intensas no passado”, contextualiza.
O acumulado de 230 mm em 24h em Deputado Irapuan Pinheiro, por exemplo, é a 17ª chuva mais intensa desde 1970, segundo Lucas. “Mas, mesmo assim, chama atenção pelo volume”, frisa.
O meteorologista explica que os rastros deixados pela água nas cidades do interior têm relação com fatores naturais. “Temos o relevo, altas temperaturas durante o dia, e a Zona de Convergência Intertropical, que está mais próxima da zona litorânea, mas vem causando impactos no interior”, pontua.
"Um alto volume de chuva traz consequências para o solo e danos de infraestrutura, como em rodovias, claro. Mas os elementos que caracterizam essas chuvas intensas são comuns, e já estávamos com essa previsão"
Mas já que as precipitações eram previstas, a Funceme alertou os órgãos de proteção, como a Defesa Civil, por exemplo. “Nós emitimos avisos nos grupos, mas como as instituições vão usar a gente não pode prever. Não podemos falar como eles vão reagir”, destaca Lucas.
Estragos nas cidades
Uma semana após Uruburetama, Itapajé e Itapipoca contabilizarem perdas causadas pelas fortes chuvas, os municípios de Porteiras, Senador Pompeu, Milhã e Deputado Irapuan Pinheiro entraram na lista de populações prejudicadas.
Em Porteiras, a prefeitura decretou situação de emergência após as chuvas deixarem um rastro de destruição na cidade. Além de alagamentos, casas chegaram a ter desabamento parcial e famílias ficaram desalojadas.
Primeiro, caiu a caixa d'água, o banheiro afundou, a parede da cozinha caiu e caíram móveis dentro do rio. Comecei a escutar o pessoal gritando pedindo ajuda e saí para socorrer. Foi aquele nervosismo, pânico pavoroso
Já em Senador Pompeu, uma rodovia que liga o município a uma cidade vizinha foi invadida pela enxurrada e precisou ser interditada. Um distrito ficou isolado, e o prefeito Maurício Pinheiro decretou estado de calamidade.
“Estamos com dois grandes açudes públicos com imagens muito preocupantes: o açude do Poço Grande e o Riacho do Meio, que está prestes a arrombar. Se isso acontecer, Senador Pompeu ficará debaixo d'água”, afirmou, em entrevista sobre o cenário.
No município de Deputado Irapuan Pinheiro, que faz divisa com Milhã e Senador Pompeu e registrou a maior chuva do ano no Ceará (230 milímetros), as aulas foram suspensas pela prefeitura, diante dos riscos de locomoção “em estradas intransitáveis”.
Sedes de órgãos públicos também ficaram sem funcionar. O prefeito da cidade, Gildecarlos Pinheiro, solicitou cautela aos moradores e orientou que permanecessem em casa. A gestão informou que não houve danos maiores pelas precipitações.
Em Milhã, por outro lado, famílias ficaram desalojadas após móveis e até o próprio teto sucumbirem às enchentes.
A população precisou receber apoio na creche municipal, localizada na sede da prefeitura, de acordo com a Defesa Civil. Moradores relataram que a velocidade com que a água transbordada de um rio próximo invadiu as residências foi “surpreendente”.
“Saí de casa e quando voltei a enchente já tinha invadido tudo, umas 8 horas da manhã. Foi ligeiro demais, com mais de 1 metro de altura. Perdi tudo: fogão, televisão, geladeira, sofá, armário”, descreveu o agricultor Carlos Vandik da Silva.
10 maiores chuvas acumuladas por posto no mês
- Maranguape - 709 mm
- Ibiapina - 669.6 mm
- Itapipoca - 581.6 mm
- Uruburetama - 562.5 mm
- Granja - 547 mm
- Camocim - 540 mm
- Ubajara - 531.3 mm
- Milhã - 517 mm
- Itapajé - 511.5 mm
- Cariré - 503 mm
Previsão para próximos meses
O meteorologista da Funceme observa que, para abril, “o cenário indica que as chuvas devem ficar acima da média”. A normal histórica para o mês no Ceará é de 203.4 mm. “Mas é um resultado preliminar, então isso pode mudar”, pondera o especialista.
“Isso deve contribuir para fecharmos com a quadra chuvosa com o patamar de normalidade ou acima da média. Mas primeiro tem de se concretizar o mês de abril, então ainda temos um bom período”, complementa.
Para Lucas, o cenário é “otimista”, uma vez que as chuvas “podem ajudar a encher os reservatórios no Estado”, embora “eventualmente possamos ter chuvas intensas que causam danos”.