Novo ensino médio: como entidades educacionais avaliam as mudanças propostas pelo MEC

Após 4 meses, o Governo apresentou as proposições que serão debatidas com setores da educação até o dia 21 de agosto. Depois, parte delas seguirá para votação no Congresso

As propostas de mudança para o Novo Ensino Médio apresentadas pelo Ministério da Educação (MEC), na última segunda-feira (7), que inclui, dentre outras, o aumento da carga horária das disciplinas básicas obrigatórias e reduz o número de itinerários formativos, estão sendo avaliadas por entidades educacionais. Segundo o MEC, as alterações foram sugeridas a partir dos resultados da consulta pública realizada entre março e julho. As ideias do Governo Federal devem receber contribuições de conselhos, setores da educação e do Congresso Nacional até 21 de agosto. O que já foi avaliado sobre as proposições?

O novo modelo de Ensino Médio foi aprovado em 2017 e está em vigor desde 2022 nas escolas brasileiras. A consulta pública realizada pelo MEC, cujos resultados foram apresentados pelo ministro Camilo Santana, na segunda (7), foi feita após crescerem as críticas de estudantes, professores, gestores e pesquisadores sobre a forma de implementação das mudanças. 

Na divulgação do sumário com os principais resultados da consulta, o MEC apresentou as seguintes propostas para reestruturar o Novo Ensino Médio:

  • O aumento da carga horária destinada à Formação Geral Básica que hoje é de 1.800 para 2.400 horas nos 3 anos do Ensino Médio;
  • Mas com exceção no caso da oferta de cursos técnicos, nos quais o MEC indica que esse aumento pode ser para 2.200 horas; 
  • Sugestão de que espanhol, arte, educação física, literatura, história, sociologia, filosofia, geografia, química, física, biologia e educação digital estejam entre as disciplinas obrigatórias. Atualmente, o ensino da língua portuguesa e da matemática são obrigatórios nos 3 anos do ensino médio e no caso da língua estrangeira, o espanhol tem caráter optativo e o inglês é obrigatório;
  • Redução do número de itinerários formativos, de 5 para 3, passando a se chamar “percursos de aprofundamento e integração de estudos”; 
  • Hoje os percursos são: Linguagens e suas tecnologias; Matemática e suas tecnologias; Ciências da natureza e suas tecnologias; Ciências humanas e sociais aplicadas e Formação técnica e profissional e a proposta é que passem a ser: Linguagens, matemática e ciências da natureza; Linguagens, matemática e ciências humanas e sociais; e Formação técnica e profissional;
  • Proibição do uso de Educação a Distância na Formação Geral Básica e que se autorize o uso de até 20% na oferta para a Educação Profissional Técnica;
  • Manutenção do Enem 2024 da forma como é feito atualmente e que novo formato seja definido junto à sociedade na elaboração do novo Plano Nacional de Educação (PNE) que deve vigorar a partir de 2025. 

No cenário nacional, as entidades educacionais como o Todos Pela Educação e a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que reúnem especialistas e pesquisadores da área, avaliam que as proposições trazem avanços em relação ao atual modelo, mas apontam a consistência e aplicabilidade do que foi apresentado, bem como o que ainda precisa ser aprimorado. 

O Diário do Nordeste também entrou em contato com a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e com o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) na terça-feira (8). Ambos ainda devem se posicionar formalmente sobre as propostas.  

O Consed, informa a assessoria, terá uma reunião dos secretários nos dias 10 e 11 de agosto para discutir o tema. Dessa reunião deve sair um posicionamento oficial. Já a CNTE vai se reunir dia 11 de agosto para fazer uma avaliação coletiva e, após a data, terá uma avaliação oficial da entidade.

Qual a avaliação sobre o aumento da carga horária?

O Todos Pela Educação, em nota técnica publicada na terça-feira (8), diz concordar com a ampliação da carga horária da Formação Geral Básica, que atualmente está limitada em, no máximo, 1.800 horas para 2.400. Mas, afirma  ver com “preocupação a forma como essa ampliação está sendo considerada”. 

De acordo com a entidade, a proposta de uma formação básica de 2.400 horas mas que permite a exceção de ser de 2.200 horas para os alunos de cursos técnicos, “pode ser de difícil operacionalização pelas redes e escolas”. 

Além disso, a organização destaca que não concorda com a sinalização de que os estudantes que optem pelos cursos técnicos terão a formação geral básica reduzida. Uma sugestão da entidade é unificar essa carga horária da formação geral básica em, no mínimo,  2.200, independentemente do modelo escolar que o aluno esteja. 

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação também demonstra preocupação com essa proposta de distintas cargas horárias para formação geral básica entre alunos de outras modalidades e os de escolas profissionalizantes. O professor da Faculdade de Educação da USP e dirigente da Campanha, Daniel Cara, pondera que as sugestões trazem avanços, mas também carecem de aprimoramento. 

No caso da “exceção” de carga horária dos cursos técnicos, ele enfatiza que “isso é problemático, pois a educação técnica não deve concorrer com a Formação geral básica, deve ser integrada”.

Inclusão de disciplinas como obrigatórias

Outro importante princípio, diz Daniel, mas que foi “apenas sugerido” na proposta do MEC é a ideia de que Artes, Educação Física, Literatura, História, Sociologia, Geografia, Filosofia, Química, Física e Biologia  estejam entre as disciplinas obrigatórias. “A posição do MEC deveria ser firme”, acrescenta.

De acordo com ele, o MEC deve avançar para uma oferta obrigatória de Espanhol como língua estrangeira, concomitante ao Inglês., tendo em vista que na sugestão apresentada Espanhol figura como “alternativo” ao Inglês.

Já o Todos pela Educação avalia que o MEC não deixou claro como será a inclusão dos outros 12 componentes curriculares nas disciplinas obrigatórias. 

“O Todos Pela Educação é altamente crítico à possibilidade de o MEC tornar esses componentes curriculares obrigatórios na Formação Geral Básica”, pois acrescenta, isso promove o retorno “a um modelo com múltiplas disciplinas, o que distanciaria a ideia de um currículo que promova uma formação mais interdisciplinar”.

Como fica a aplicação do Enem?

Em relação à proposta do MEC de manter o Enem 2024 no formato já conhecido e discutir a mudança para os próximos anos, o Todos Pela Educação afirma concordar com a proposta, mas destaca que há necessidade de que o Enem 2024 já seja alinhado à Base Nacional Curricular Comum, já que ela “já está implementada nos estados e nas redes particulares”.

Para o integrante da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, é acertada a escolha por pautar o Enem pela Formação Geral Básica. Mas pondera que, “há um grave risco de extensão de desigualdades: os alunos da educação profissional ficaram aquém das 2400 horas da Formação Geral Básica, com apenas 2.200 horas”. 

Com isso, completa: “considero que isso deva ser revisto, sob pena dos estudantes desse modelo terem muitas dificuldades de ingressar na Educação Superior”.

Mudanças precisam virar lei ou não?

Na apresentação das propostas, o MEC destacou que algumas mudanças serão infralegais, ou seja, serão feitas através das resoluções ou decretos do próprio MEC ou do Conselho Nacional de Educação. Contudo, outras precisarão de leis e, por isso, terão que tramitar no Congresso Nacional. 

O MEC informou que pretende definir referenciais nacionais, em instrumento infralegal, pelo Ministério, em conjunto com o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed). 

Na terça-feira, o Ministro da Educação, Camilo Santana foi ao Senado para entregar à Comissão de Educação, por meio da Subcomissão Temporária para Debater e Avaliar o Ensino Médio no Brasil (Ceensino), as propostas da pasta. De acordo com ele, o pedido do Ministério é de trabalho em colaboração para a definição de uma política pública para o setor. A projeção é que o Governo Federal encaminhe até o início de setembro um projeto de lei para o Congresso Nacional para alterar o Novo Ensino Médio.