Tecnologia é a palavra da vez, inclusive para melhorar o fluxo e a operação de complexas redes de esgoto a partir de centrais de monitoramento em tempo real e mapas virtuais de estações de tratamento. Esse modelo deve ser replicado em 24 cidades do Ceará, atingindo mais de 4 milhões de pessoas, após a assinatura de uma parceria público-privada (PPP) entre o Governo do Estado e uma empresa da área.
A convite da Aegea Saneamento, o Diário do Nordeste viajou a Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, para conhecer na prática como esse processo ocorre. Por lá, uma PPP firmada há dois anos permite o tratamento de esgoto em 68 dos 79 municípios do Estado.
No Ceará, a primeira parceria foi firmada em fevereiro, após a Aegea vencer o leilão de 17 cidades. Outro leilão também abrange Fortaleza e mais 6 municípios da Região Metropolitana, mas está pendente de assinatura. A missão é garantir que, até 2033, 90% da população desses locais tenha acesso à coleta e ao tratamento de esgoto.
Atualmente, a Ambiental Ceará, braço da empresa no Estado, está na fase de estudos técnicos de campo, formação de equipes e planejamento das atividades, como informou Águeda Muniz, diretora de Relações Institucionais da Ambiental Ceará.
Ela adianta que a empresa ficará responsável pela operação diária dos serviços, como implantação de rede, substituição de hidrômetros, padronização de ligações, atualização cadastral e fiscalização e combate às fraudes. Cobranças de fatura, recebimento de reclamações e abastecimento de água continuam a cargo da Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece).
O investimento total no projeto cearense é de R$ 6,2 bilhões, aplicados na construção de 27 Estações de Tratamento de Esgoto (ETE), 249 Estações Elevatórias e mais de 4.000 km de novas redes de esgoto. Segundo a Aegea, devem ser coletados e tratados, por mês, mais de 1 bilhão de litros de esgoto.
O grupo Aegea já atuava no Ceará, no município do Crato. Por lá, a cobertura de esgoto passou de 3% para 16%, em quatro meses. A previsão é chegar a 50% até 2024.
Como funciona o mapa virtual
A empresa desenvolveu uma tecnologia chamada de “Infra Inteligente”, mapeamento de precisão feito com drones, GPS e câmeras 360º. Ao todo, devem ser digitalizados 5 mil equipamentos e mais de 100 plantas das Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs) do Ceará.
Os “gêmeos digitais” das estações permitem que as equipes operacionais visualizem e analisem os equipamentos pela tela de um computador. Com as imagens em 3D, é possível visitar virtualmente as instalações e identificar pontos de melhoria.
Você faz um projeto e vê se cabe, o que muda, se tem que girar, ou aumentar, ou seja, consegue fazer um refinamento tecnológico antes de desembarcar a obra. Assim, você ganha tempo de projeto, tempo de execução e melhora a assertividade do projeto.
Para obter esse nível de detalhamento, são catalogadas edificações, plantas, estações de tratamento e elevatórias, assim como bombas, motores e painéis elétricos, com descrição de vazão, pressão, capacidade dos equipamentos e condição elétrica.
Monitoramento em tempo real
Conhecer todas essas informações é essencial para realizar, no dia a dia, o bom monitoramento do sistema. Afinal, centenas de estações e quilômetros de tubulação são avaliadas em tempo real nos Centros de Operação da empresa. No Ceará, Maracanaú e Juazeiro do Norte devem receber equipamentos do tipo.
“Daqui, eu consigo saber o que está acontecendo: se caiu o nível de pressão, se deu alguma pane no motor, e aciono o operador mais próximo para fazer a verificação”, exemplifica Ítalo Souza, gerente do Centro de Controle Operacional (CCO) da MS Pantanal, mostrando painéis que ocupam duas paredes da sede da empresa.
Nos monitores, as equipes conseguem avaliar a entrada de novas solicitações, a progressão dos serviços e o cumprimento de prazos. Há diversos indicadores para avaliar a qualidade, produtividade e performance do trabalho - um deles é entregar 97% dos serviços prontos dentro do prazo estabelecido em contrato.
A atenção aos clientes também é desenvolvida pelo monitoramento de redes sociais. Se houver alguma notificação de problema na rede, como extravasamento de esgoto, verifica-se qual é a questão e abre-se uma ordem de serviço.
“Todos os municípios e estações têm equipes. O investimento em tecnologia nos permite ter maior qualidade e controle dos nossos processos e nos antecipar ao problema porque direcionamos melhor as equipes com essas informações”, garante Ítalo.
Importância das ligações corretas
O ponto central das operações da Aegea, segundo Gabriel Buim, diretor executivo da Águas Guariroba, é entender qual é a principal demanda da região onde ocorrerá a instalação. Isso passa, inclusive, pela contratação de mão de obra local e de parcerias para a capacitação de profissionais que possam fazer a ligação correta à rede, como encanadores e pedreiros.
Águeda Muniz, da Ambiental Ceará, confirma que a geração de emprego e renda é um pedido de parte das 17 cidades do Bloco 1 cearense. Outro ponto levantado nas discussões é que impacto as obras devem trazer ao cotidiano dos municípios.
“Obra desse tipo dá muito trabalho, você fica um dois dias com uma vala aberta, a população reclama”, reconhece Buim. “Mas o benefício vem ao longo do tempo, ter seu esgoto tratado e a desativação de fossas é algo muito maior do que ter problema para entrar em casa dois ou três dias. Temos a expertise de executar essas obras estruturantes”.
O diretor executivo ainda lembra que, como as parcerias público-privadas são longas (no Ceará, será de 30 anos), é preciso firmar, desde o início, um bom relacionamento com a gestão pública e com a população.
Assim, de forma transparente, a ligação correta à rede de esgoto pode ser estimulada a fim de afastar o esgoto das cidades e diminuir a incidência de doenças de veiculação hídrica, como diarreia, amebíase, cólera, hepatite A e esquistossomose.
Para conscientizar as populações atingidas durante e após a instalação da rede, a empresa também investe em parcerias com lideranças comunitárias e projetos sociais (como a fabricação de sabão a partir do reuso do óleo de cozinha), e discute com o poder concedente a possibilidade de aplicar tarifas sociais onde for possível.