'Carimba é inclusão’: jovens da periferia relatam amor ao esporte no 1º torneio de Fortaleza

Realizado na Praia dos Crush, o evento reuniu diversas pessoas da comunidade LGBTQIAP+ para uma competição entre times de bairros periféricos

Escrito por Lívia Carvalho , livia.carvalho@svm.com.br
Legenda: Seis times competem no torneio
Foto: Fabiane de Paula/SVM

De brincadeira de rua a torneio, o carimba ganhou um novo reconhecimento com o primeiro 1º Torneio de Carimba da Praia de Iracema, que aconteceu neste domingo (27). Realizado pelo Instituto Iracema na Praia dos Crush, o evento levou uma programação com oficinas de dança, de peteca, música, além dos campeonatos.  

A presidente do Instituto, Paola Braga, explica que a proposta do evento é de levar inclusão, proporcionando atividades culturais e esportivas para todos os públicos. “É fazer com que as pessoas vejam que todo mundo tem espaço, especialmente a comunidade LGBTQIAP+”.  

“Todo mundo tem uma lembrança afetiva do carimba na escola, quem não chegou tarde em casa porque estava jogando carimba depois da aula? Existem times de carimba nos bairros de Fortaleza e a gente decidiu transformar isso num torneio, trazendo para a Praia de Iracema”. 

Segundo Braga, a proposta do Instituto é levar o torneio para outras praias da Capital cearense, porém ainda não há uma periodicidade definida.   

Legenda: Esporte proporciona segurança e diversão aos praticantes
Foto: Fabiane de Paula/SVM

Ocupar espaços 

Além da diversão pela modalidade esportiva, o torneio contou com a apresentação das drag queens Deydianne Piaf e Camilly Leycker, e comentários e Rochelle Santrelly, Sangalo e Morgana Camila.  

Para Deydianne, integrante do coletivo As Travestidas, essa é a uma forma de relembrar a infância e divertir-se com saúde e alegria.  

Legenda: Evento contou com a apresentação de Deydianne Piaf
Foto: Fabiane de Paula/SVM

"É muito importante que a prefeitura esteja realizando esse evento pra mostrar que esses espaços têm que ser ocupados pelos nossos corpos, temos que estar na rua sim, nenhuma homofobia, transfobia vai nos calar e é muito legal a gente ver essa praia com essa multidão de gente”.  
Deydianne Piaf
humorista

A humorista conta ainda que o carimba era o único esporte que fazia na época da escola. “Não sabia jogar futebol, vôlei eu era péssima, então quando fazia educação física na escola eu me divertia muito no carimba, mas se vier uma bola saio correndo, porque a peruca pode cair”, brincou. 

‘Todo mundo pode fazer um esporte’ 

Um dos competidores, o recepcionista Renan Monteiro, de 31 anos relata que joga carimba desde criança e conheceu seu atual time, Atracajaras, ainda no colégio e, desde então, jogam juntos como lazer e saúde.  

“O carimba proporciona inclusão para as pessoas que já são excluídas do futebol, como nós LGBT, algumas tem até uma abertura no vôlei, mas o carimba veio pra gente se empoderar e se apossar disso. Hoje em dia, a gente joga por lazer, mas também pra ter uma atividade física”, diz. 

Legenda: Para jovens, carimba é esporte de inclusão e diversidade
Foto: Fabiane de Paula/SVM

Por isso, ele destaca que o evento é importante por dar visibilidade tanto para o esporte quando para as pessoas da comunidade LGBT.  

“Eu venho de uma construção de movimento social, de luta. Vejo que é uma forma de colocar a cara no sol e de dizer pra sociedade que os gays, as lésbicas, as trans, os homens trans, todo mundo pode fazer um esporte e estar incluso em algo”.  
Renan Monteiro
recepcionista

O sentimento é partilhado pelo estudante Ruan Beserra, de 16 anos. Desde pequeno, ele joga com os amigos na rua e, para ele, o carimba foi uma ferramenta para fazer amigos e se sentir acolhido.  

“Sempre fui muito tímido e hoje construí essas relações. Carimba é inclusão. Hoje, estamos num mundo um pouco mais inclusivo, mas ainda vejo muita homofobia por todo canto, eu fico passado, em pleno século XXI com a internet”. 

Legenda: Disputa de carimba será entre os times campeões do Campeonato Cearense de Carimba na Praia de Iracema 2022
Foto: Fabiane de Paula/SVM

‘Me sentia rejeitado’ 

“Comecei a me envolver com o carimba, porque não tinha muitos esportes por eu ser LGBT, eu me sentia rejeitado pelos meninos que jogavam futebol, que diziam que só era pra homem, como os machistas falam, e foi com o carimba que me senti acolhido”, relata o estudante Gabriel Lucas, de 19 anos.  

Para o jovem, a realização do torneio é uma vitória, uma vez que é um reconhecimento do esporte que ele joga desde a infância.  

Com mais experiência, o estudante Fidelis Ramos de 32 anos, destaca que o esporte como um todo é uma alternativa de dar um direcionamento aos jovens periféricos para além do que a sociedade os condiciona.  

“O carimba por si só já um esporte muito representativo, em que a maior parte das pessoas que jogam são da comunidade LBGT e fazer um torneio oficial com repercussão traz ainda mais visibilidade e importância pra gente”.  
Fidelis Ramos
estudante

Legenda: Estudante Lohanna Mendes vê no carimba um meio para praticar atividade física
Foto: Fabiane de Paula/SVM

Há dois anos, a descoberta da transexualidade trouxe para a estudante Lohanna Mendes, de 15 anos, um esporte para chamar de seu. Integrante de um time do bairro Vicente Pinzón, hoje, ela participa do evento.  

 “E acho que o carimba é diferente porque engloba todos os tipos de pessoas, não tem gênero, nem sexualidade, nem cor e é isso que me faz gostar muito de jogar”.  

 

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