Um homem que supostamente se passava por desembargador e enganou autoridades é investigado por fraude e plágio pela Polícia Civil do Rio Grande do Sul. Segundo a investigação, João Riél Manoel Hibner Nunes Vieira Teles de Oliveira Brito, de 31 anos, não é advogado ou mesmo magistrado.
Em setembro de 2019, ele chegou a ser recebido pelo então vice-presidente da República, Hamilton Mourão, como "desembargador do Tribunal de Justiça do RS", com o futuro ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Kassio Nunes Marques.
Ao portal G1, o general justificou que, na época, houve um erro no cadastramento da informação na agenda oficial. "Não lembro da agenda e, segundo minha equipe, houve um erro de lançamento na mesma, onde constou o mesmo como desembargador". Além do militar, o homem também possui fotos ao lado de diversos ministros do STF, políticos, reitores de universidade e com o presidente Jair Bolsonaro.
De ex-estagiário a falso advogado
O nome de João Riél é citado em mais de 10 inquéritos por fraude e plágio da Polícia Civil. Em um deles, os investigadores apuram como ele conseguiu dar entrada em pelo menos uma dezena de ações no Foro da Comarca de Arroio do Tigre sem ter registro como advogado. Na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o homem consta somente como estagiário — com inscrição já expirada.
"Essa história começou em 2018, quando o Ministério Público verificou uma ação em que ele figurava como advogado e alguém informou que ele não tinha OAB. No processo, ele declarava que tinha esquecido de fazer constar o 'E' de Estagiário no número utilizado nos processos", detalhou ao G1 a delegada Graciela Foresti Chagas, de Arroio do Tigre, onde ocorrem as apurações.
Segundo as investigações, ele usaria o número suspenso da OAB de uma jurista que se tornou juíza para assinar as ações. Na organização, o nome do homem consta como "estagiário" e está "cancelado". O Estatuto da Advocacia, implementado por lei federal sancionada em 1994, indica que estudantes de Direito podem exercer a função desde que registrados e sob responsabilidade de um advogado.
Ao portal, ele disse que o "processo sobre o uso da identificação da magistrada está arquivado e tem sentença procedente ao meu respeito".
A delegada Graciela contou ao G1 que o inquérito foi concluído com indiciamento e remetido ao Poder Judiciário, mas teve o andamento na Justiça atrasado durante a pandemia da Covid-19, período em que a acusação por fraude prescreveu.
Autor de 30 livros e suposto plágio
O homem afirmar ser autor de mais de 30 livros, que abordam desde poesia, passando pela história da cidade natal, Tunas (RS), a títulos sobre princípios do Direito. Pelo menos uma dessas publicações é alvo de investigação da Polícia por plágio. Conforme as autoridades, a obra foi utilizada por João Riél como trabalho de conclusão de curso em um suposto pós-doutorado feito por ele na Itália.
"As investigações estão em curso, então os dados são sigilosos, mas posso dizer que há uma investigação de plágio bastante consistente, que descortinou que as obras publicadas por ele utilizam trechos de autores diversos", declarou o promotor de Justiça da comarca de Arroio do Tigre, Heráclito Neto ao G1.
"A investigação também mostra uma incompatibilidade de datas e períodos para os cursos que ele diz ter feito. Ele diz ter cursado mestrado, doutorado e pós-doutorado em três anos", detalhou.
As apurações indicam que há cópias em outros livros do suspeito. João Riél declarou, ao G1, não está a par das investigações contra ele. Sobre os livros, o homem disse que todos foram escritos por ele e negou as denúncias de plágio. "Escrevi meu primeiro livro com 17 anos", garantiu à publicação.
Participação no Caldeirão do Huck
O nome do homem ganhou destaque após uma publicação nas redes sociais ultrapassar 21 mil curtidas e mais de 2 mil replicações. Na postagem, o autor Francisco Campis expõe as supostas realizações de João Riél, as quais classifica como dignas "de filme".
Além das investigações policiais, o usuário relembra a participação do homem no quadro "Quem quer ser um milionário", do Caldeirão do Huck, em 2019, quando ele ganhou um prêmio de R$ 15 mil após não acertar perguntas consideradas simples, como: quantos segundos existem em uma hora; qual é a figura mitológica que é meio mulher e meio peixe. O ex-estagiário ainda seria autor de diversos artigos publicados em um jornal gaúcho e seria figura frequente em quadros de TV do Rio Grande do Sul.
Versão do suspeito
João Riél confirmou à publicação a versão do ex-vice-presidente de que o título de desembargador atribuído a ele na agenda oficial seria "um erro". O ex-estagiário declarou que a repercussão sobre o assunto aconteceu devido a uma série de publicações realizadas nas redes sociais por um "advogado iniciante".
"O rapaz eu não sei quem é, mas vou acioná-lo judicialmente. Ele tentou denegrir minha imagem. Não sei por que veio à tona agora", disse ao G1.
Na terça-feira (2), o autor das postagens se pronunciou sobre a possibilidade da ação contra ele.
"João Riél está ameaçando me processar, pois que processe. Aproveito a situação e levo todas as informações que consegui sobre ele pro conhecimento da justiça. No final do processo ele ainda vai ter que pagar as custas e os meus honorários", escreveu em uma rede social.
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