Administradora morre da mesma forma que avó, vítima de temporal há meio século em Petrópolis

Duas mortes separadas por meio século em uma mesma família evidenciam o problema histórico causado pelas chuvas no Rio de Janeiro

Em meio ao desastre que já registra 78 óbitos em Petrópolis, no Rio de Janeiro, a história se repete. Uma mesma família registra a segunda morte causada pelas chuvas, com certa de meio século entre o registro das duas perdas

Conforme o portal Extra, foi na manhã de 25 de novembro de 1971, em meio a um forte aguaceiro que Cecilia Eler de Lima morreu aos 55 anos, após um deslizamento de terra na Rua Bernardo de Vasconcelos, no bairro Cascatinha, em Petrópolis, na Região Serrana do Rio.

Nascida uma década depois da primeira tragédia, Cecilia Lima Fiorese, primeira filha de Nadir Eler de Lima, recebeu, como forma de homenagem, o nome da avó. No entanto, seguindo o trágido destino da matriarca, faleceu aos 40 anos depois de temporal que atingiu a cidade na última terça-feira (15).

Assim, as duas Cecílias, avó e neta, tiveram seus destinos cruzados do batismo à despedida. Assim como a mãe, a dona Nadir, de 71 anos, Cecilia morou a vida inteira em Petrópolis.

O cenário apresenta não apenas as perdas sofridas por uma mesma família, como evidencia o problema histórico causado pelos temporais no estado do Rio de Janeiro.

MEDO DAS CHUVAS

De acordo com o ex-marido de Cecília, o comerciante Alessandro de Araújo Dutra, com quem ela ainda era casada no papel, os dois consideraram se mudar de cidade. Porém, com o nascimento do filho do casal, que já tem 6 anos, abandonaram a ideia. 

Apesar disso, o medo dos temporais e dos riscos sempre foi contante em Cecília e em Nadir, que perdeu tanto a mãe, quanto a filha para as chuvas. 

"Ela sempre teve medo. Chove e minha mãe fica agoniada. Tenho muita vontade de levá-la embora, mas ela tem raízes aqui", descreve a irmã de Cecília, Camila Lima, de 37 anos. Há 21 anos, a servidora pública se mudou de Petrópolis para Brasília.

"Nós somos uma família cristã, e nós cremos que minha irmã está melhor, com Deus, na eternidade. E isso é muito mais aceitável pra gente. Minha mãe só está conformada por isso".
Camila Lima Fiorese
Servidora Pública

ÚLTIMO CONTATO COM A FAMÍLIA

O último contato de Cecilia com a família aconteceu às 17h58, quando trocou mensagem com o ex-marido. Alessandro enviou vídeos do local onde estava alagado, chegando a perguntar como ela estava. "De boa", respondeu Cecília. 

Em seguida, ela enviou imagens que já mostravam a água tomando a Rua Teresa, uma das vias mais conhecidas de Petrópolis, reduto de dezenas de lojas de roupa.

A especialista na área de saúde trabalhava há menos de um mês em um consultório dentário na região, uma das mais atingidas pelo temporal.

Então, após algum tempo sem contato, os parentes já não conseguiram mais falar com a administradora, e não demorou para que chegasse a informação de que a clínica havia desabado.

CHEGADA DOS PARENTES AO LOCAL

Depois de saber sobre o desabamento da clínica, Alessandro foi o primeiro a chegar no local, encontrando o estabelecimento destruído. Ainda assim, seguiu carregando as esperanças de encontrar a ex-esposa com vida

No entanto, funcionários do consultório que escaparam a tempo explicaram que ela só não sobreviveu porque, segundos antes, tinha subido para pegar um café no segundo andar.

"Quando cheguei, eu ajoelhei, pedi a Deus, chorei muito. A família me ligava, eu só respondia que o que nos restava era orar por um milagre, porque a cena era apavorante. Infelizmente, não adiantou".
Alessandro de Araújo
Comerciante

Uma testemunha contou que Cecilia se comunicou depois o desabamento e que explicou estar presa pela perna. Porém, não foi socorrida a tempo.

"Eu perdi o amor da minha vida. Nós estávamos separados há dois anos, mas ainda éramos casados no papel, tínhamos uma relação muito boa. Saíamos juntos, passeávamos com o nosso menino. Eu não sei como vou seguir em frente", finalizou.