A catedral Notre-Dame de Paris, devastada por um incêndio nesta segunda-feira, é um monumento que já foi celebrado e menosprezado ao longo da história da França, explica a historiadora Claude Gauvard, especialista em Idade Média e autora de um livro sobre essa obra-prima do Gótico.
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O que a Notre-Dame de Paris representa na história da França?
É um símbolo de Paris, um símbolo de paz, de união e de concórdia, onde se celebraram os te-déuns ao longo dos séculos, e que ocupa um lugar excepcional no coração da cidade. A praça da catedral é o quilômetro zero da França.
Para mim, é talvez uma das catedrais mais equilibradas, simbolizando o trabalho dos artistas e dos homens que a construíram, mas ao longo do tempo já foi amada e odiada.
Por que você acredita que esse monumento emblemático de Paris e da França foi em parte menosprezado?
A Notre-Dame de Paris é muito querida pelos franceses e pelos milhões de estrangeiros que a visitam a cada ano, mas eles entram e saem, acho, sem ter compreendido o que é essa catedral.
O Renascimento e o século XVIII a mutilaram, por exemplo, não se hesitou em cortar o tímpano do portal central para fazer passar o dossel do rei! Foi todo o trabalho do século XIX, com [os escritores] Prosper Mérimée e Victor Hugo, e [os arquitetos] Viollet-le-Duc e [Jean-Baptiste-Antoine] Lassus, o que permitiu voltar a colocar em seu lugar a arte gótica.
Acho que não foram investidos os recursos necessários para mantê-la. Os trabalhos em curso finalmente foram iniciados, e já era hora, mas talvez um pouco tarde. Subi para ver o pé da torre [antes do início do trabalho] e havia pedras soltas, apoiadas por uma grade para evitar que caíssem.
Você já viu catástrofes similares? É possível recuperar os danos?
Que o pináculo tenha caído não é tão grave, porque se reconstruirá graças aos planos de Viollet-le-Duc, que respeito muito porque sem ele a catedral não estaria mais ali. Foi ele que reconstruiu a torre, porque ela havia desmoronado em 1792, em um evento sem relação com a Revolução Francesa.
No entanto, não teremos mais a "foret" (o bosque), essa magnífica moldura de madeira que suportava o telhado. E o que temo é que o fogo afete o coro. O problema da Notre-Dame é que abarca várias jurisdições: o arcebispado, a cidade de Paris, os monumentos históricos... O que torna sua manutenção mais complicada. Espero que haja uma campanha nacional, até mesmo internacional, para financiar as obras, porque vai ser muito caro.