Um grupo formado por sete pessoas foi condenado a 81 anos de prisão pelos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico pela Vara de Delitos de Organizações Criminosas. Os réus André Duarte de Oliveira da Silva, Francisco Sávio Teixeira Araújo, Gabriel Machado Ferreira, José Cleber Moreira Costa, Lindomar de Carvalho Lima, Maria Silvana da Silva Marinho e Vitor Assunção Costa devem cumprir as penas em regime fechado. Dos sete condenados, dois estão foragidos. Cabe recurso da decisão.
A engendrada e meticulosa investigação realizada para chegar aos integrantes desse grupo são descritas em documentos obtidos pela reportagem. Em janeiro deste ano, o Ministério Público do Ceará denunciou 36 pessoas, que seriam integrantes de uma facção criminosa cearense, pelos crimes de tráfico de drogas, associação para o tráfico e organização criminosa. Conforme o MP, a Polícia Civil do Ceará (PCCE) instarou Inquérito Policial para apurar a prática do crime de tráfico ilícito de entorpecentes na área da Área Integrada de Segurança 3 (AIS-3).
Trecho da denúncia do MP aponta que equipes da Delegacia de Narcóticos (Denarc) iniciaram as apurações. “Apesar da resistência da população em fornecer informações, por medo de represálias, os policiais civis insistiram e devido à persistência da equipe, após diversas visitas aos locais mais críticos, alguns moradores acabaram fornecendo informações anonimamente”.
Segundo consta nos autos, os informantes narraram aos investigadores da Denarc que após a prisão de um homem identificado como ‘Brutus’, apelido de Francisco das Chagas de Sousa Veras, ocorrida no decorrer do ano de 2021, a liderança criminosa da região do Bairro Santa Rosa/Pôr do Sol, na Grande Messejana, passou a ser uma pessoa conhecida como ‘Tom’, o qual foi identificado como sendo Juslene Batista Sobral. Conforme ainda os levantamentos policiais, ‘Tom’ é um “criminoso contumaz” e responde por vários crimes, dentre eles, porte ilegal de arma de fogo e tráfico de entorpecentes.
Por estar sendo investigado e ser conhecido na região pelo apelido de ‘Tom’, as investigações policiais afirmam que depois de prisões e operações naquela área da cidade, ‘Tom’ passou a exigir que as pessoas do bairro se referissem a ele como ‘Carlinhos’. O objetivo? Ter sua identidade preservada. Mesmo assim, ele já estava na mira dos investigadores da Denarc.
De acordo com um Relatório de Investigação da Polícia Civil, a região do "Santa Rosa", dominada por ‘Tom’ ou ‘Carlinhos’, é responsável pelo “abastecimento e distribuição de drogas nos bairros Messejana, Levada, Parque Manibura, Lagoa Redonda e Curió, o que faz a organização descrita naquele relatório o braço central e mais forte do tráfico e dos demais crimes ocorridos na região da AIS-3”.
Tendo o tráfico de drogas como motor propulsor, outras movimentações criminosas na região da Grande Messejana e outros pontos críticos de Fortaleza estavam sendo investigadas com lupa pelos investigadores da Polícia Civil. A teia criminosa envolvendo o narcotráfico, homicídios e disputas criminais sangrentas foram alvo de outro Relatório Técnico, dessa vez da Delegacia de Repressão às Organizações Criminosas.
A Draco analisou os contornos criminosos que surgiram “com a origem da ‘Massa Criminosa” e os impactos do “novo grupo” sobre a Segurança Pública do Estado do Ceará, “especialmente, as disputas acerca do controle dos pontos de tráfico de drogas e os índices de homicídios”, diz o documento. Constam também do Relatório da Draco análises “das ordens (salves) do ‘Comando Vermelho’ e da ‘Massa Criminosa’”.
Essa dissidência estava gerando consequências nefastas. Com o desenrolar das investigações, prisões e apreensões de celulares de alvos com funções hierárquicas importantes nas organizações criminosas foi possível saber os detalhes da “acirrada disputa territorial entre indivíduos envolvidos diretamente com o tráfico de drogas e delitos conexos (homicídios, roubos, etc.) no âmbito dos bairros Barroso, Messejana, Curió, Grajerú, Lagoa Redonda, Jangurussu, Parque Santa Maria, Coaçu, Ancuri, Paupina, São Bento, Ancuri, Pedras, Conjunto Palmeiras e adjacências, todos pertencentes à Área Integrada de Segurança 3 (AIS 03)”, aponta a investigação.
"Apurou-se que um dos fatores que rendeu ensejo à sangrenta disputa pelo domínio territorial do tráfico de drogas teria sido a cisão entre lideranças da facção/organização criminosa autodenominada “Comando Vermelho”, que culminou na tentativa, por parte de diversos criminosos, de se desvincularem da referida facção criminosa, causando uma verdadeira “guerra” no território cearense".
OPERAÇÃO SINERGIA
Municiados das informações repassadas pelos investigadores de campo, houve pedidos de quebras de sigilos e outras ordens judiciais. Tudo isso resultou na ‘Operação Sinergia’. Conforme os documentos obtidos pela reportagem, diante do deferimento das interceptações “foi possível especificar as condutas e elaborar Relatórios Individuais que se encontram aportados nesse processo criminal, os quais tiveram como base várias chamadas captadas durante a medida”.
As investigações culminaram na identificação de 37 pessoas. As prisões foram solicitadas à Justiça e deferidas pelo Poder Judiciário, assim como a apreensão de aparelhos celulares e quebra de sigilo telefônico e telemático dos investigados. O Inquérito Policial foi enviado ao Poder Judiciário com os indiciamentos.
A primeira do MP foi recebida pela Justiça em agosto de 2022. O processo foi desmembrado e essa decisão condenatória diz respeito apenas aos sete réus citados no início do texto.
DEFESAS
As defesas dos acusados afirmaram no processo que as interceptações telefônicas foram feitas ilegalmente e solicitaram “a declaração de nulidade do ato e a consequente anulação do presente processo e de todos os demais atos realizados a partir das interceptações telefônicas”. No mérito, pediram a absolvição dos seus clientes.
Sobre o pedido de nulidade das interceptações telefônicas, ao analisarem o caso, no último dia 12 de dezembro, os magistrados da Vara de Delitos e Organizações Criminosas afirmaram que “a ação penal foi instaurada após exaustiva investigação denominada “Operação Sinergia”, que incluiu diversas interceptações telefônicas, transcritas na denúncia, todas autorizadas e devidamente fundamentadas por este Colegiado”.
SENTENÇA
No que diz respeito ao crime de integrar organização criminosa, “a denúncia imputou sua prática a todos denunciados, ao argumento de que são integrantes da 'Massa Carcerária', com atuação na região da AIS – 3 (Área Integrada de Segurança 03)”. No entanto, para os magistrados, a investigação foi “claudicante em demonstrar que efetivamente esses comandos ocorriam a mando e por membros da ‘Massa Carcerária’.”
O Colegiado entendeu não ter sido demonstrado de forma eficaz que “as atividades criminosas ocorriam em uma ação determinada pela organização criminosa ‘Massa Carcerária’, em razão da realidade do tráfico de drogas local, ou mesmo por atos de outra organização criminosa, que também adotasse práticas punitivas”.
Os juízes fizeram a ressalva de que, apesar de os diálogos colhidos na investigação apontarem “indícios concretos de atuação de organização criminosa, não avançou a investigação em demonstrar que citadas atividades foram praticadas dentro da realidade da denunciada organização criminosa”, destacaram.
“Não se está dizendo aqui que os réus não integram uma orcrim, mas apenas que, diante dos elementos trazidos a este processo, não resta claro que eles são membros da Massa Carcerária, já que não há sequer um diálogo em que eles mencionem organizações criminosas ou "salves", além de outros elementos”.
Já com relação aos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico, o Colegiado afirma que em relação a todos os sete réus condenados ficou comprovada a participação nesses crimes. Mesmo que, efetivamente, com eles não tenha sido apreendido entorpecente.
“Assim, diante dos apontamentos apresentados, mormente os paradigmas apontados pelo STF, a ausência de apreensão de drogas e a inexistência de laudo pericial de constatação de substância entorpecente não são limitantes para análise dos crimes imputados, registrando que a condenação, diante de tal nuance, ocorrerá de forma excepcional e quando cabalmente demonstrado pelas demais provas que havia a presença de uma das hipóteses do art. 33 da Lei no 11.343/06”, afirmaram na decisão.
Fica claro na individualização das condutas na sentença que nenhum dos condenados exercia papel de liderança na região, mas atuavam diretamente na engrenagem do tráfico naquela localidade. Os demais processos desmembrados vão tratar das condutas dos demais denunciados na 'Operação Sinergia'.
VEJA AS PENAS DE CADA UM DOS RÉUS
André Duarte de Oliveira da Silva (preso)
8 anos de prisão por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Regime fechado.
Francisco Sávio Teixeira Araújo (foragido)
10 anos e 10 meses por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Regime fechado.
Gabriel Machado Ferreira (preso)
10 anos e 10 meses por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Regime fechado
Lindomar Carvalho Lima (preso)
10 anos e 10 meses por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Regime fechado
Maria Silvana da Silva Marinho (presa)
10 anos e 10 meses por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Regime fechado.
Vítor Assunção Costa (foragido)
10 anos e 10 meses por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Regime fechado.
José Cléber Moreira Costa (preso)
10 anos e 10 meses por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Regime fechado.