Extorsão e morte de jovem: quem são os policiais investigados que devem ser reintegrados à PMCE

Os policiais também devem receber o pagamento dos salários de forma retroativa, conforme decisão proferida na Vara da Auditoria Militar

Dois policiais militares investigados em casos de extorsão e morte de um jovem em 'encontro de paredões' devem ser reintegrados aos quadros da Polícia Militar do Ceará (PMCE), por decisão da Justiça. O Diário do Nordeste teve acesso às sentenças proferidas neste mês de outubro, a favor dos agentes Jonathas Wilker de Oliveira e Fabrício Sousa dos Santos.

Os dois PMs foram alvos de processos administrativos na Controladoria Geral de Disciplina (CGD) e expulsos da Corporação. Fabrício chegou a ir a julgamento pela morte do jovem Gabriel Oliveira França, mas foi inocentado pelo Júri Popular. Já Jonathas Wilker de Oliveira foi suspeito de participar de uma extorsão, em Aquiraz, Região Metropolitana de Fortaleza (RMF).

Conforme decisões proferidas pelo juiz da Auditoria Militar do Estado do Ceará, Roberto Soares Bulcão Coutinho, devem ser declaradas nulas as decisões finais dos processos administrativos disciplinares, os policiais reintegrados e receberem o pagamento dos salários de forma retroativa correspondente ao período da exclusão.

O QUE DIZEM AS DEFESAS

Oswaldo Cardoso, advogado do PM Fabrício, diz que o Judiciário fez "Justiça neste caso". "Poder ver um policial militar, honrado e que sempre prestou seus serviços a sociedade alencarina de forma sacerdotal voltar de onde nunca deveria ter sido excluído, nos deixa mais que felizes. Agradecemos todo o apoio prestado por colegas de farda. Sua inocência era cristalina. Justiça feita e que o Militar continue a nos proteger e cumpra sua missão", disse a defesa.

Já Kaio Castro, que representa a defesa de Jonathas Wilker, diz que ingressou no Poder Judiciário porque, ao receber a demanda e analisar o caso, percebeu que "existiam provas técnicas que excluem o policial dos fatos investigados e que não foram consideradas pela CGD".

"Contudo, a Justiça, agindo de forma mais técnica e com maior amplitude do trabalho da defesa, reconheceu que o seu reingresso representa uma medida justa e de reparação moral, pois ele é inocente (comprovadamente) e deverá agora receber a remuneração retroativa desde quando foi expulso indevidamente", segundo Kaio Castro.

MORTE DE JOVEM EM 'ENCONTRO DE PAREDÕES'

Gabriel foi morto a tiros na saída de um encontro de paredões, em 2019. Fabrício foi preso em 2021 e sentou no banco dos réus devido ao crime em 2022. Ele foi absolvido no Tribunal do Júri e, após a decisão dos jurados, o Ministério Público do Ceará (MPCE) recorreu da sentença, que acabou sendo mantida em 2º Grau.

Em maio do ano passado, o Judiciário considerou que "os elementos de prova constantes dos autos não comprovam, cabalmente, a autoria delitiva, de maneira que o veredito, ao não reconhecer a autoria delitiva (o que ensejou a absolvição do recorrido), não contrariou a prova dos autos".

Mesmo com inocência no processo criminal, Fabrício foi punido na CGD com a pena de demissão. A defesa dele pediu na Justiça que a decisão fosse reformada.

"O Estado do Ceará argumentou que a Administração pública pode instaurar processo disciplinar para apurar a conduta de seus servidores, não necessitando nem sequer a instauração de processo criminal para isso, bem como pode aplicar punição que entender cabível, uma vez comprovada a infração funcional, como de fato aconteceu no caso em liça"

No entanto, segundo o Juiz da Auditoria Militar, "embora as esferas dos poderes sejam independentes entre si, quando o juízo penal decidir sobre a autoria ou a inexistência do fato, essa decisão vinculará todas as demais esferas, em razão do maior rigor probatório exigido na instância penal. Diante disso, rogou que a decisão de absolvição do autor em sede de sentença penal, seja vinculado à esfera administrativa e reformule-a, a fim de que ocorra a reintegração do requerente ora demitido".

"Embora o Poder Judiciário não possa proferir juízos acerca da conveniência e oportunidade da Administração em seus assuntos disciplinares, poderá interferir nos casos de abusos em seus atos, tendo em vista que estes não podem se confundir com arbítrio. No caso em questão, a Administração cumpriu o ordenamento legal ao proceder à instauração de comissão processante para apurar fatos que vão de encontro aos valores da Policia Militar do Estado do Ceará, como a hierarquia e a disciplina"
Juiz da Auditoria Militar

EXTORSÃO

A mesma argumentação do juiz da Auditoria Militar consta na decisão referente ao caso do PM Jonathas Wilker de Oliveira.

Jonathas foi demitido, segundo a defesa dele, devido a uma suposta ocorrência de extorsão ocorrida em 2018, envolvendo outros dois PMs presos em flagrante. A ocorrência se deu em um posto de combustíveis no Porto das Dunas.

A vítima teria sido extorquida em R$ 50 mil e em troca não seria presa por venda de armas de fogo. Jonathas alega que não estava no local do crime e que não participou da negociação, mas que um dia antes estava nessa mesma composição, enquanto motorista e que ficou na viatura realizando a proteção do veículo.

A defesa "afirma que o processo violou a legalidade ao aplicar a sanção de demissão de forma desproporcional, pois a própria administração reconheceu que não conseguia comprovar o envolvimento do autor com possível crime de extorsão e sim apenas sua omissão no ato de abordagem anterior. Reafirma que na referida abordagem quase não interagiu com a vítima, pois como motorista era responsável pela viatura. Afirma a vítima que quando foi torturada só haviam dois policiais militares, podendo afirmar que o SD Wilker não era um deles".

Ao decidir pela reintegração, o magistrado disse ter observado que "o requerente não foi preso em flagrante no ato que deu origem a ação penal contra os demais integrantes da composição" e que "a conduta do requerente de conduzir o carro de um abordado após determinação de seu superior hierárquico, apesar de ilegal, não justifica a aplicação da sanção máxima administrativa, tendo em vista que por conta da hierarquia e disciplina muitas vezes subordinados não questionam decisões arbitrária de seus superiores".

Para o juiz, o caso em questão não "restou violada a proporcionalidade e razoabilidade no ato atacado, tendo em vista que a conduta do autor não violou os deveres militares".