O tráfico humano é um dos crimes mais rentáveis mundialmente. Em menos de uma década, por meio do Disque 100, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos registrou 31 denúncias sobre tráfico de pessoas no Ceará. O Estado ocupa a terceira posição na Região Nordeste com mais notificações. No ranking de todo o Brasil, está no 10º lugar.
Das 31 denúncias de 2011 a 2019, 29 são envolvendo crianças e adolescentes como vítimas, uma LGBT e uma classificada como "outros". Não há informações mais específicas sobre quem são esses traficados e como o crime aconteceu. No Nordeste, os primeiros colocados são Bahia (43) e Pernambuco (32).
Ao longo dos nove anos, no Brasil, foram 852 denúncias, sendo mais da metade, 684, referente às vítimas com menos de 18 anos de idade. No primeiro semestre de 2020 não foi registrado nenhum caso no Estado do Ceará. Já os dados referentes ao segundo semestre do ano passado permanecem sendo estruturados, conforme informado pelo Ministério no levantamento intermediado pela agência de dados 'Fiquem Sabendo', por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).
Vulnerabilidade
Historicamente, o crime é silenciado e subnotificado. O Ministério da Justiça e Segurança Pública alerta que, atualmente, a prática muitas vezes está ligada à exploração sexual comandada por redes internacionais que formam roteiros de turismo sexual, além de quadrilhas especializadas em remoção de órgãos.
O titular da Delegacia Regional de Investigação e Combate ao Crime Organizado (Drcor) da Polícia Federal (PF) Regional Ceará, Alan Robson Alexandrino, afirma: "O Ceará está na rota de diversos crimes, inclusive o de tráfico de pessoas". A presença do Estado nesta rota se deve à posição geográfica que, consequentemente, faz da localidade porta de saída para o continente europeu.
Alan destaca que hoje não há informações sobre uma rede de tráfico humano ativa no Estado, mas existem investigações pontuais com inquéritos em andamento, os quais detalhes não podem ser repassados para não comprometer possíveis prisões e resgates das vítimas.
"Fortaleza é uma área turística, então alguns criminosos se aproveitam para prometer coisas que não existem e encantam pessoas em vulnerabilidade. O tráfico mais comum ainda é com fim sexual. O para retirada de órgãos é raro, não temos notícias de casos assim no Ceará, e no Brasil é quase que inexistente", disse o delegado.
A supervisora do Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas da Defensoria Pública do Ceará, Mariana Lobo, acrescenta que dentre a multiplicidade de fatores que leva ao tráfico há ainda o de adoções ilegais de crianças: "É um crime que muitas vezes é trabalhado na invisibilidade e pode sim o núcleo familiar da criança e do adolescente estar envolvido na questão. É importante que a gente consiga observar sobre ser algo mais presente na sociedade do que podemos ver".
Ranking Nacional
- São Paulo 202
- Rio de Janeiro 84
- Rio Grande do Sul 53
- Minas Gerais 53
- Pará 37
- Paraná 37
- Bahia 43
- Pernambuco 32
- Goiás 32
- Ceará 31
Medo
O Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc) estima que o tráfico de pessoas faz cerca de 2,5 milhões de vítimas e movimenta quase 32 bilhões de dólares, a cada ano. A dificuldade em chegar até às vítimas é, segundo Alan Robson, a dificuldade delas próprias se perceberem como aliciadas em um primeiro momento.
"A vítima acredita que está sendo beneficiada por alguém que se compromete a conseguir alguma coisa para ela. E aí só se percebe como vítima quando está no exterior. É assim que os flagrantes costumam acontecer. Precisamos destacar que a PF trabalha no aeroporto e que o controle do passaporte não é só um carimbo. A PF está atenta às situações suspeitas. Famílias que desconfiem de algum parente indo ao exterior em determinada situação, pode procurar diretamente a Polícia Federal. Vítimas que estão em outros países podem entrar em contato conosco", alertou o delegado.
A defensora pública Mariana Lobo cita como caso comum de vítima ludibriada a mulher que viaja ao exterior sob promessa que em outro país irá casar e pontua a necessidade de uma rede de amparo pronta para receber de volta essa pessoa.
"São mulheres levadas a acreditarem que seus sonhos serão realizados. Muitas vezes elas têm vergonha, têm medo de falar o que, de fato, aconteceu. Se retornam, vêm com uma série de sequelas e com a necessidade de acompanhamento para reinserção ao ambiente. A sociedade tende a tornar a vítima como algoz em um primeiro momento, e isso não deve acontecer", disse a defensora.
Como denunciar:
- Disque 100
- Plantão 24 horas PF/CE: (85) 3392-4900