A Área Integrada de Segurança (AIS) 3 completou o terceiro ano seguido como a região que apresenta o maior número de homicídios de Fortaleza: 137 mortes violentas foram registradas em 2023, o que representa 18,5% do número total da Capital (738 assassinatos), conforme dados da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS). Fortaleza terminou o ano passado com redução de 13,2% nos homicídios.
A Pasta divide o território da Capital em 10 áreas. A AIS 3 inclui os bairros Ancuri, Barroso, Coaçu, Conjunto Palmeiras, Curió, Guajeru, Jangurussu, Lagoa Redonda, Messejana, Parque Santa Maria, Paupina, Pedras e São Bento.
Professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV), o sociólogo Luiz Fábio Paiva afirma que "os bairros da AIS 3 têm um histórico de situações de violência, que não são restritas apenas a esses bairros (citados acima)".
Nos últimos anos, teve uma concentração de grupos armados e de situações de violência que envolvem, sobretudo, o conflito entre facções", aponta o pesquisador, que chama a atenção também para o crescimento da cidade através dessa Área: "Pedras e São Bento são áreas de expansão de Fortaleza. Vários imóveis estão sendo vendidos, uma expansão do mercado imobiliário, abertura de novos empreendimentos. Mas, ao mesmo tempo, essas regiões têm periferias, áreas precárias, e o tráfico tem buscado exercer o controle desses territórios".
Luiz Fábio ainda acrescenta que "essa é uma região de entrada e saída de produtos na cidade de Fortaleza. É uma área estratégica para a mobilidade do crime. Tem situações de acerto de conta, dívidas e interesses pelo controle de conjuntos habitacionais".
"Quando a gente fala em homicídios, a gente não fala de um fenômeno circunscrito às facções. Nós temos dinâmicas relacionadas ao feminicídio, à transfobia, à homofobia. Todos esses problemas também afetam essas áreas", lembra o sociólogo.
A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social respondeu, em nota, que "mantém ofensivas permanentes na Área Integrada de Segurança 3 (AIS 3) com intuito de manter os indicadores de Crimes Violentos Letais e Intencionais (CVLIs) em redução, conforme os dados da Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública (Supesp), que apontam a diminuição de 25,9% nos CVLIs ocorridos na região em 2023. Ao todo, foram 137 mortes violentas no ano passado contra 185 registros em 2022. Somente no mês de dezembro, a redução ficou em 44,4%. Durante o mês, aconteceram dez CVLIs, contra 18 ocorrências em dezembro de 2022".
Ofensivas integradas, sob a gerência da Coordenadoria Integrada de Planejamento Operacional (Copol), ajudam nesse cenário de combate à criminalidade, segundo a SSPDS. Foram realizadas cerca de 13 edições de operações como Focus, Pegasus e Opus, no ano passado.
A inteligência também é uma aliada dos trabalhos policiais de combate aos CVLIs. Em novembro do ano passado, o Governo do Ceará inaugurou o Centro de Inteligência do Ceará (CIC), um dos equipamentos instalados no Centro Integrado de Segurança Pública (Cisp). O local contempla seis agências de inteligências – sendo quatro delas vinculadas à SSPDS, como a Coordenadoria de Inteligência (Coin)."
A SSPDS destaca ainda a importância do trabalho preventivo: "Com intuito de manter a redução dos indicadores criminais, o Governo do Ceará promoveu três reuniões nas últimas semanas, no Cisp, com a presença de secretários da SSPDS, Secretaria de Proteção Social, Secretaria de Educação, Secretaria de Cultura, do Esporte, do Trabalho, das Mulheres, Secretaria da Juventude, Secretaria da Diversidade, Superintendência do Sistema Socioeducativo e representante do Programa Integrado de Prevenção e Redução da Violência (PreVio). O intuito é desenvolver políticas sociais que se conectem com os trabalhos desenvolvidos pelas Forças de Segurança do Ceará".
A AIS 7, que reúne Aerolândia, Alto da Balança, Boa Vista, Cajazeiras, Cambeba, Cidade dos Funcionários, Dias Macedo, Edson Queiroz, Jardim das Oliveiras, José de Alencar, Parque Dois Irmãos, Parque Iracema, Parque Manibura, Passaré, Sabiaguaba e Sapiranga, teve o segundo maior número de homicídios de Fortaleza, em 2023: 118 casos (15,9% do total).
Já a AIS 10 - Cidade 2000, Cocó, Dionísio Torres, Engenheiro Luciano Cavalcante, Guararapes, Joaquim Távora, Lourdes, Manuel Dias Branco, Papicu, Praia do Futuro I, Praia do Futuro II, Salinas e São João do Tauape - teve o menor número de mortes violentas no ano passado: 28 crimes (3,7% do total de Fortaleza).
Números dos anos anteriores
Em 2022, a AIS 3 também liderou o ranking negativo da Capital, com 185 homicídios (21,7% do total de 850 homicídios apresentados em Fortaleza, naquele ano). Apesar de continuar com a pior marca em 2023, houve uma redução de mortes violentas de 25,9%, na comparação dos números da Área nos dois últimos anos.
Já em 2021, a mesma Área terminou o ano com 150 assassinatos (16,6% do total de homicídios na Capital, que foi de 900 crimes). O ano de 2020 foi o último em que a AIS 3 não teve o maior número de mortes violentas da cidade, quando registrou 163 casos (13% do total, que foi 1250 mortes).
Naquele ano, a AIS 9 - Aracapé, Canindezinho, Conjunto Esperança, Jardim Cearense, Maraponga, Mondubim, Novo Mondubim, Parque Presidente Vargas, Parque Santa Rosa, Parque São José, Planalto Ayrton Senna, Prefeito José Walter e Vila Manoel Sátiro - teve o maior número de homicídios: 210 (16,8% do total).
Divisão entre facções criminosas
A reportagem apurou, com fonte da Segurança Pública, que um dos motivos para o aumento de homicídios na Área Integrada de Segurança 3 foi o surgimento de uma nova facção cearense, em 2021, dissidente de uma facção carioca. Bairros como Conjunto Palmeiras e Jangurussu viraram umas das principais zonas de conflito entre os dois grupos criminosos, nos meses seguintes.
Uma denúncia do Ministério Público do Ceará (MPCE), contra uma quadrilha ligada à nova facção cearense, enviada ao Poder Judiciário em agosto de 2022, detalhou a divisão da AIS 3 e redondezas entre as duas facções criminosas, com base em investigações da Polícia Civil do Ceará (PC-CE).
O mapa mostra que as comunidades do Barreirão, Conquista, São Bernardo e Mangueira eram dominadas pela facção cearense, à época; enquanto Violeta, Lagoa Seca, Carrapicho e Coqueirinho tinham o controle do grupo criminoso de origem carioca.
A denúncia levou à condenação de sete réus ligados à facção cearense, por um total de 81 anos de prisão (se somadas as penas), pelos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico, em decisão da Vara de Delitos de Organizações Criminosas, da Justiça Estadual. Ao contrário do que a investigação afirmou, o colegiado de juízes da Unidade entendeu que não havia provas para condenar o grupo por integrar organização criminosa.