Calor no litoral, calor no interior. As altas temperaturas têm sido presentes nas variadas regiões cearenses, atingindo a todos. Serra, praia, Sertão. Ninguém está imune à onda de calor que parece ter estacionado sob o Ceará nas últimas semanas.
Seis municípios, no entanto, mostram maior criticidade. Eles se destacam, ao longo deste segundo semestre de 2021, pelas altas temperaturas registradas. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) mapeia, diariamente, as 20 cidades mais quentes do Brasil. Conforme levantamento realizado pelo Diário do Nordeste, neste período apareceram na lista os municípios de Jaguaruana, Morada Nova, Crateús, Iguatu, Fortaleza e Tauá.
Entre os dias 1º de junho - data que marca o fim da quadra chuvosa no Ceará - e 18 de outubro, as cidades de Morada Nova, Crateús e Jaguaruana foram as que mais se repetiriam na lista diária nacional. Neste intervalo de 139 dias - ou quase 5 meses - dois municípios atingiram o topo do ranking brasileiro.
Em 29 de junho deste ano, Jaguaruana registrou a mais alta temperatura do País, com 36,2 graus Celsius. No dia seguinte, foi a vez de Crateús liderar com a maior máxima registrada: 36,4 ºC. Já a maior temperatura absoluta registrada neste segundo semestre aconteceu na cidade de Corumbá (MS), com 43,9°C, em 20 de setembro.
Com pouco mais de 32 mil habitantes, Jaguaruana foi a cidade do Ceará que mais apareceu na lista diária do Inmet. Dos 139 dias contemplados pelo levantamento do Diário do Nordeste, o Muncípio esteve presente em 42 (30,12%). Quem por lá mora há várias décadas tem notado o aumento da temperatura nos últimos anos.
"Aqui nunca foi frio, mas esse calor de ultimamente está demais. Cada ano tem sido mais quente". O relato é do empresário Pinheiro Júnior, de 56 anos e que há 37 mora em Jaguaruana. "O calor não dá trégua. Por volta do meio dia quem não tem um ventilador ou um ar condicionado sofre muito, é insuportável", acrescenta.
Para se proteger do sol, ele conta que tem evitado sair de casa nos horários mais quentes. "A gente procura ficar mais em casa, aí vem outro problema, a conta de energia. Com tantos eletros ligado, a conta vai lá pra cima", lamenta.
Crateús é a segunda cidade cearense que mais consta na lista. Foram 35 dias (25,17%) nos últimos meses. Quem por lá mora tem o mesmo sentimento externado pelo empresário jaguaruense. A enfermeira Monica Portela afirma que, devido ao forte calor, "temos visto muitas pessoas indo ao hospital com complicaçoes leves", como problemas respiratórios.
Ela avalia que 2021 tem sido mais quentes se comparado a anos anteriores. "Está quase pegando fogo. É um calor muito forte", completa a profisisonal da saúde. O aposentado Gonçalve Dias, 71, releva ter mudado os hábitos.
"Sento na calçada no fim da tarde acompanhado de uma garrafa de água. Não tinha esse costume, mas agora tem que ficar bebendo direto pra amenizar essa quentura. Lá dentro [de casa] é quente, aqui também é, mas pelo menos corre um vento as vezes", detalhada.
Dias quentes
Outro dado levantado pelo Diário do Nordeste mostra que, em três datas, o Ceará teve quatro das 20 maiores temperaturas. Em 16 de outubro, Morada Nova (38,9ºC), Crateús (38,2ºC), Jaguaruana (37,9ºC) e Iguatu (37,5ºC) ficaram entre as 20 mais altas do País.
Em 30 de julho, Crateús (37,3º, terceira posição), Jaguaruana (36,7º, 9ª colocação), Morada Nova (36º, décima-quinta posição) e Iguatu (35,9ºC, 19ª colocação) também estiveram entre as 20 cidades brasileiras mais quentes para o dia.
Antes, em 15 de junho, aconteceu cenário semelhante. Jaguaruana foi a segunda cidade mais quente do País (36,1ºC). Na lista apareceram ainda Crateús (35,1ºC, na décima posição), Morada Nova (34,9º, na 14ª posição) e Tauá, com 34,6º, ocupando a vigésima posição.
Combinação de fatores
Mas, o que essas cidades, sobretudo Jaguaruana, Morada Nova, Crateús, têm em comum? Por que elas registram sucessivas altas temperaturas? E o que explica essas máximas registradas no segundo semestre do ano? Para responder essas e outras questões, o Diário do Nordeste conversou com especialistas do Inmet e da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme).
Eles explicam que uma combinação de fatores climáticos convergem para o aumento das temperaturas no Ceará, principalmente a partir de setembro, quando tem início os meses de setembro a dezembro, popularmenbte chamados de B-R-O Bró.
O meteorologista do Inmet Flaviano Fernandes explica que a localização das cidades é um dos fatores que influencia as altas temperaturas. Dos seis municípios que aparecem na lista das 20 mais altas do Brasil, apenas Fortaleza fica no litoral.
"Em uma região, vários fatores influenciam no aumento das temperaturas. Por exemplo, se for próxima ao oceano tem temperaturas mais amenas. Se tiver em altitude, as temperaturas também são mais agradáveis. Por outro lado, as cidades que estão entre serras estão propícias a serem mais quentes e secas", detalha o especialista.
Nessas regiões os ventos geralmente são subsidentes, ou seja, ventos quentes. No período chuvoso muda um pouco e ocorrem os ventos ascendentes.
Movimento aparente do Sol explica porque é mais quente nesta época
Fernandes revela ainda que as altas temperaturas nos meses finais do ano, no Ceará, estão ligadas a combinação de fenômenos climáticos. A primavera no Ceará é considerada a estação mais quente do ano "devido o movimento aparente do Sol em relação a Terra".
O especialista acrescenta que o Sol "ao atingir o Equador (Equinócio de Primavera), desloca-se (aparentemente) em direção ao sul do Hemisfério Sul, e é neste período que ele fica mais próximo e culminando sobre os municípios do estado do Ceará".
Neste caso, a radiação solar está mais intensa e com poucas nuvens e incide diretamente na superfície terrestre. Em um dia ensolarado sem nuvens tem-se temperaturas mais quentes.
A gerente de meteorologia da Funceme, Meiry Sakamoto, pontua também que a temperatura do ar no Ceará "é alta o ano todo". Porém, explica ela, durante os meses B-R-O Bró (setembro a novembro, principalmente) "as temperaturas médias são mais altas, devido ao período estiagem, além disso, nessa época, os ventos ficam mais intensos, e os máximos de radiação solar são justamente observados em outubro".
Para além das altas temperaturas registradas nas estações, Flaviano ressalta que, para os moradores, a sensação térmica é ainda maior, podendo passar dos 2º Celsius de diferença para o que marca no termômetro. "Vai depender da velocidade do vento, da umidade, da radiação que chega", pontua.
Cuidados com o organismo
A médica pediatra Luana Barbosa alerta que a exposição a altas temperaturas exigem cuidados específicos para que não ocorra dano ao organismo humano. Ela detalha que idosos e crianças estão entre os mais vulneráveis e pontua alguns cuidados básicos.
"É necessário aumentar a ingestão de água nestes períodos mais quentes. Também se puder usar umidificadores de ar é muito válido. E, se precisar sair de casa nos picos de calor, é necessário se proteger com óculos, protetor solar, guarda-sol, roupas de mangas. São detalhes que nos protegem dos raios solares", conclui.