Vídeo mostra enviado de Bolsonaro tentando recuperar joias avaliadas em R$ 16,5 milhões

Imagens foram obtidas com exclusividade pela GloboNews

O momento em que um enviado do então presidente Jair Bolsonaro (PL) tenta retirar um conjunto de joias apreendido pela Receita Federal no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, foi obtido com exclusividade pela GloboNews e divulgado nesta quarta-feira (8). 

Avaliadas em R$ 16,5 milhões, as joias — um colar, um anel, um relógio e um par de brincos de diamantes da marca de luxo Chopard — foram apreendidas no dia 26 de outubro de 2021. Elas estavam na mala de um integrante da comitiva de Bolsonaro que viajou à Arábia Saudita.

À época, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que também integrava a comitiva, ainda tentou recuperar as joias, mas não teve êxito. As peças continuaram bloqueadas na alfândega da Receita Federal.

No entanto, no dia 28 de dezembro do ano passado, de acordo com o g1, às vésperas do fim do mandato de Bolsonaro à frente do Executivo nacional e um dia antes de o ainda presidente deixar o Brasil para embarcar para os Estados Unidos, o sargento da Marinha, Jairo Moreira da Silva, foi enviado em um voo oficial ao aeroporto de Guarulhos para buscar as joias. Mas, novamente, a tentativa foi frustrada, e os acessórios continuaram na alfândega.

Veja a transcrição das conversas

Trecho 1: Sargento mostra ofício de braço-direito de Bolsonaro

O sargento Jairo chega a Guarulhos e mostra ao auditor um ofício enviado pelo tenente-coronel Mauro Cid, um dos "homens fortes" de Bolsonaro, ao chefe da Receita Federal, Julio Cesar Vieira Gomes, que chegou a pedir aos funcionários do órgão para atender ao pedido.

Jairo: Opa! Como vai?
Auditor: Como vai, tudo bom?
Jairo: Boa tarde, desculpa incomodar.
Auditor: Nada! tudo bom?
Jairo: (se apresenta) Jairo, como vai?
Auditor: Prazer.
Jairo: Deixa eu pegar aqui no celular...em cima da hora, correria!
Auditor: Então, não tá...não sei...deixa eu dar uma olhada.
Jairo: (aponta para o celular e entrega para o auditor): Achei que entraram em contato.
Auditor: (com o celular de Jairo na mão, lendo) Ao senhor Julio Cesar (...).

Trecho 2: Sargento tenta por braço-direito de Bolsonaro ao telefone com auditor

Jairo fala com Mauro Cid ao telefone e tenta passar o aparelho ao auditor, que recusa.

Jairo: Coronel, eu tô aqui na alfândega. Aqui, já. Estou falando com o supervisor deles, aqui. Quer falar com ele? Ele falou que não está ciente aqui do que se trata. Posso passar aqui para ele?
Auditor: (faz o sinal de negativo com o dedo para Jairo): Eu não posso falar ao celular.

Trecho 3: 'É de urgência', diz sargento

O auditor da Receita Federal explica que a liberação de itens apreendidos depende de um Ato de Destinação de Mercadoria (ADM). Jairo argumenta que está "na correria" e que o caso é de "urgência".

Auditor: Entendeu? Existe uma necessária para essa incorporação aí, que é o ADM.
Jairo: É que tô na correria, cara. Passagem de comando, como se diz, né, um entrando, outro saindo
Auditor: Você não mora em Brasília? Chegou agora de Brasília?
Jairo: Tô chegando agora. Vim direto para cá.
Auditor: Então, assim, esse ADM seria necessário, não tem. Não tenho conhecimento também dessa liberação. Não sei onde estaria, talvez no cofre, mas eu não tenho acesso, então... Não sei se teve algum atropelo, assessoria, alguma coisa muito de urgência...
Jairo: Não, é de urgência, com certeza.

Trecho 4: Sargento alega que ' tem que tirar tudo' antes do fim do governo

O sargento tenta argumentar que a retirada das joias é um passo burocrático na transição de governos, que ocorreria dias depois. O argumento não foi aceito pelos auditores, e as joias permaneceram apreendidas na Receita.

Auditor: Mas o clima lá está tranquilo?
Jairo: O clima em Brasília está sempre tranquilo, cara, por incrível que pareça. Assim, tá pegando fogo no Brasil todo, ahhhh, lá está tranquilo.
Auditor: Está tranquilo? Não tem erro, nada que...
Jairo: Não. Tudo correndo normal. Assim, lá fora o pessoal gritando e a gente fazendo o que tem que fazer, passagem normal. Tanto que isso aqui faz parte da passagem, não pode ter nada do antigo para o próximo. Tem que tirar tudo, tem que levar. Não pode, é burocrático, é burocracia.

Trecho 5: Sargento diz que documento para liberação está sendo providenciado

Jairo afirma que o ato de destinação de mercadoria (ADM) está sendo providenciado e pede para que o auditor ligue para outro funcionário da Receita.

Auditor: A questão é a seguinte. Independente de eu ter, de onde esteja, tem que ter o ato de destinação de mercadoria, porque é uma incorporação. Não tendo, não teria nem como liberar. Nem que eu pudesse, não teria como liberar. Não estou sabendo.
Jairo: Alô. Ele falou que não pode atender o celular, mesmo que ele quisesse não poderia liberar, porque não tem um...
Auditor: Um ADM, ADM.
Jairo: Um ADM.
Jairo: Ele falou para o senhor ligar para o Fabiano, o Fabiano está ciente. A ADM já está sendo feita e ele vai assinar daqui a pouquinho. E tu conhece: é em cima da hora mesmo.
Jairo: A AM está sendo providenciada, já.
Auditor: Aham.
Jairo: Está sendo providenciada a ADM. Ele falou que ele vai assinar.
Auditor: Então, vamos aguardar. Essa ADM, se ela for providenciada, e ele mandar. Eu não vou ligar para o (diz o nome de outro funcionário da Receita) porque, assim, eu não tenho acesso direto ao (diz o nome novamente). (Diz o nome mais uma vez) Está na superintendência. Ele não é da alfândega aqui de Guarulhos. Entendeu? Ele está como superintendente-adjunto de aduana lá na superintendência. Com isso, ele ficou como delegado aqui muito tempo. Então, vamos aguardar.