Série Influências Partidárias: a história do PDT, presidido por Cid Gomes, no Ceará

Na terceira reportagem da série “Influências Partidárias”, a história do PDT. Com entrevista, na live do PontoPoder, do presidente da sigla, Cid Gomes

Criado na esteira da redemocratização, em 1979, o Partido Democrático Trabalhista (PDT) é um dos mais antigos do País. Naquele ano, começava a vigorar a Lei da Anistia, que possibilitou a repatriação de Leonel Brizola, entre outros exilados políticos, e a retomada de atividades da oposição à Ditadura Militar (1964-1985). 

Incorporou ideais e nomes do antigo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), extinto pelo AI-2 em 1965. A Carta de Lisboa (1979), que iniciou o processo de criação do partido, levou à aprovação do registro pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 1980.

Foi nesse contexto que a legenda começou a se estruturar, a disputar as primeiras eleições diretas e a ocupar os primeiros cargos eletivos. No Ceará, o crescimento foi gradativo, primeiro com representantes no Legislativo, depois ocupando o Executivo.

Na terceira reportagem da série “Influências Partidárias”, o Diário do Nordeste conta a história do PDT – legenda com maior número de prefeituras do Ceará – e entrevista, na live do PontoPoder, o presidente da sigla, o senador Cid Gomes. Esta compõe uma série de entrevistas com dirigentes partidários a cerca de um ano das eleições de 2024.

Estruturação

O PDT disputou quase todas as eleições presidenciais do pós-Ditadura (três vezes com Brizola, sendo uma como vice de Lula, do PT, e duas com Ciro Gomes) e algumas ao governo cearense.

Compôs a gestão estadual na condição de vice em dois momentos: no primeiro, foi representado na gestão de Ciro Gomes (à época, no PSDB) com Lúcio Alcântara (PDT), entre 1991 e 1994. 

Ciro deixou o cargo antes do tempo para assumir o Ministério da Fazenda, mas Lúcio não chegou a assumir o governo, já que se afastou do Executivo para a campanha vitoriosa a senador.

O segundo momento foi no governo de Camilo Santana (PT) e Izolda Cela (ex-PDT), entre 2015 e 2022. Esta, inclusive, foi governadora entre abril e dezembro do último ano, após o petista se desincompatibilizar para a disputa ao Senado.

Izolda, contudo, deixou o partido em julho do ano passado, após uma crise interna que a impediu de disputar a reeleição. À época, a agremiação escolheu Roberto Cláudio como candidato.

Foi ele também quem levou o PDT à Prefeitura de Fortaleza, mas apenas no fim do primeiro mandato, em 2015. Conquistou o segundo mandato no ano seguinte e elegeu o sucessor e correligionário em 2020, José Sarto. Atualmente, Roberto é presidente do diretório municipal.  

Fundação no Ceará e pedetistas históricos

No Ceará, o PDT foi fundado pelo ex-senador Flávio Torres, hoje presidente de honra da legenda. Em participação no quadro “Trabalhismo na História”, do próprio PDT, em 2021, ele lembrou o momento do nascimento da legenda no Estado.

“Quando foi para refundar o PTB, eu fui para a primeira reunião aqui no Ceará e tinha 100 pessoas, entre dois ou três deputados federais, cinco ou seis deputados estaduais, dez vereadores de mandato. Gente que tinha alguma relação antiga (com a legenda de Getúlio Vargas)”, recordou.

Mas a investida sobre o PTB foi frustrada. Em maio de 1980, o TSE concedeu a gerência do partido à ex-deputada Ivete Vargas, que registrou a sigla antes. O momento foi classificado por Brizola como um “esbulho” patrocinado por figuras da Ditadura. Daí, o ímpeto de investir forças no PDT.

Quando Brizola perdeu o PTB e resolveu inventar o PDT, muita gente desacreditou. Aliás, todos os políticos do Ceará. Não ficou nenhum. E sobrou eu. [...] Nunca recebemos dinheiro e nem o partido tinha. Fizemos com o nosso esforço 
Flávio Torres
Ex-senador e fundador do PDT Ceará

Desde então, diversas lideranças passaram pela legenda, como Heitor Férrer, Iraguassu Teixeira, Araújo Castro, Lúcio Alcântara, André Figueiredo, entre outros. 

Este, inclusive, foi presidente da sigla por quase 20 anos antes de uma crise interna aprofundada neste ano levar à troca do comando, que, hoje, está com Cid Gomes. André Figueiredo iniciou sua trajetória no PDT pela militância, em 1984.

Fundou e foi o primeiro presidente da Juventude Socialista do Ceará. Subiu ao Diretório e à Executiva Nacional do partido. Hoje, é presidente interino do PDT nacional e líder do partido na Câmara dos Deputados. 

Também chegou a ser ministro das Comunicações do Governo Dilma Rousseff (PT), sendo responsável pelo lançamento do Programa Banda Larga para Todos, cujo foco é universalizar o acesso à internet em alta velocidade em todo o País.

Estão nos quadros dos pedetistas ilustres, ainda, Cid e Ciro Gomes, que iniciaram um novo ciclo no partido. Após passagem por diversas legendas e a eleição a cargos no Legislativo e no Executivo, os irmãos pousaram no PDT para estruturar, também, as estratégias futuras das suas próprias trajetórias políticas.

A onda Ferreira Gomes

A partir de 2015, o PDT passou a viver um momento diferente no Ceará. A chegada dos Ferreira Gomes representou um boom no crescimento do partido, ainda que uma ala da legenda também veja um ônus com essas mudanças. 

“A gente era um partido pequeno de centro-esquerda, mas era unido. Depois da vinda do grupo dos Ferreira Gomes, o partido se tornou grande e hoje está como todo mundo sabe”, avalia o vereador Iraguassu Filho, filiado desde 2001, em referência à recente disputa no PDT. Ele é filho de Iraguassu Teixeira, um dos nomes mais tradicionais do PDT cearense.

A filiação de Ciro e Cid Gomes, principalmente, levou junto o próprio Roberto Cláudio e outros 63 prefeitos do interior do Estado. Ex-governadores, mas por outras legendas, os irmãos reforçaram os quadros do PDT com o poder de articulação construído ao longo das gestões. 

Nas últimas eleições municipais, o partido elegeu 66 prefeitos no Ceará. Além disso, tem a maior bancada da Assembleia Legislativa e da Câmara Municipal de Fortaleza, cinco deputados na Câmara Federal e um senador do Estado.

Ou seja, o Ceará, atualmente, concentra a maior força política do PDT no Brasil. O Estado ajuda, inclusive, a reforçar os índices necessários à manutenção do poder do partido em todo o País. Por exemplo, o Fundo Eleitoral da sigla ficou entre os dez maiores, com cerca de R$ 252 milhões.

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Com os Ferreira Gomes, o PDT ampliou o arco de aliança, permitindo uma maior capilaridade em todo o Estado e a sustentação da sua força política. Já chegou a compor um bloco com 16 partidos (PT, PDT, PP, PSB, PR, PTB, DEM, PC do B, PPS, PRP, PV, PMN, PPL, PATRIOTA, PRTB e PMB) em 2018.

No pleito seguinte, o grupo diminuiu, mas continuou consistente, apesar de não ter saído vitorioso na disputa ao Governo do Estado. A redução do número de aliados se deve ao rompimento com o PT, no âmbito da escolha do candidato pedetista às eleições.

Crise no PDT

Em julho de 2022, o PT, sob a liderança de Camilo Santana e José Guimarães, resolveu romper relações com o PDT após o partido decidir lançar Roberto Cláudio como postulante a governador. 

Os petistas aceitariam formar chapa com os pedetistas, desde que a candidata que encabeçaria a aliança fosse Izolda Cela, então governadora. Contudo, o martelo foi batido de forma diferente e as discussões não pararam por aí.

A cada dia, um novo dilema nascia no PDT. Enquanto o partido apoiou a campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno, uma ala no Ceará sentia resistência a isso.

Depois, a adesão ao Governo Elmano foi pauta de debate, assim como o restabelecimento da aliança com o PT a partir de 2023. Em maio, o cenário se agravou: Cid Gomes comentou com a imprensa a pretensão de disputar a presidência do partido no Ceará, posto ocupado por André Figueiredo à época.

Um cabo de guerra foi iniciado, mobilizando a Executiva Nacional – o presidente licenciado, Carlos Lupi, chegou a vir a Fortaleza para mediar o conflito –, deputados, vereadores, prefeitos e até a Justiça. 

Em julho, um acordo levou ao afastamento de André Figueiredo das funções na Executiva Estadual e à posse de Cid como presidente. Mas no mês seguinte, mais uma atualização do caso: o diretório deu carta de anuência para que Evandro Leitão, presidente da Assembleia Legislativa, saísse do partido sem prejuízo ao mandato.

A decisão gira em torno da disputa pela Prefeitura de Fortaleza em 2024. A ala liderada por Figueiredo, com apoio de Ciro Gomes, defende a reeleição de José Sarto, enquanto o segmento de Cid defende uma aliança com o PT no pleito, cenário inviável para o grupo adversário.

Evandro Leitão surge nessa conjuntura como uma figura próxima ao bloco camilista, possivelmente pré-candidato. A anuência, então, deixou-lhe livre para buscar a viabilização da sua candidatura sem resistência do PDT. 

Mas o partido, sob Figueiredo, contestou a decisão. A questão está sub judice, com parecer favorável à anuência pelo Ministério Público Eleitoral (MPE).

Com a escalada de tensão, novamente Cid tentou colocar em discussão a relação com o grupo petista, o que quebrou de vez o aparente clima de pacificação interna. Figueiredo desativou o diretório estadual e instalou uma comissão provisória. O senador, então, convocou uma reunião para eleição do novo presidente.

A Justiça foi novamente acionada, revertendo o ato do presidente nacional e restabelecendo o diretório permanente. O encontro marcado por Cid foi mantido e ele foi escolhido para comandar a legenda até 31 de dezembro. 

Em dezembro, o PDT deve realizar uma convenção para a escolha da nova Executiva, que assume o mandato a partir de janeiro de 2024. Até lá, a disputa na sigla ainda deve render muito debate.