Investigações da Polícia Federal apontam que uma reunião da alta cúpula do governo presidido por Jair Bolsonaro teria incentivado "promoção da ilegal desinformação e ataques à Justiça Eleitoral" em 2022. O momento teria ocorrido no dia 5 de julho do ano em questão e o próprio presidente estava no local, segundo vídeo obtido e transcrito pela PF, divulgado nesta quinta-feira (8).
A gravação aponta que Bolsonaro acreditava na veracidade das pesquisas feitas à época, que demonstravam a vitória de Lula à presidência do Brasil. O então presidente chegou até a reiterar que o adversário ganharia o processo, ao que foi interpelado pelo chefe do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, afirmando que era preciso "virar a mesa" antes da eleição.
O vídeo foi apreendido em um computador na casa do ex-ajudante de ordens, Mauro Cid. Estavam presentes os seguintes nomes:
- Anderson Torres (então ministro da Justiça)
- Augusto Heleno (então ministro do Gabinete de Segurança Institucional)
- Jair Bolsonaro (então presidente da República)
- Mário Fernandes (então servidor da Secretaria-Geral da Presidência)
- Paulo Sérgio Nogueira (então ministro da Defesa)
- Walter Braga Netto (candidato a vice na chapa de Bolsonaro)
A reunião teria como objetivo a formação de estratégias para deslegitimar a eleição do presidente Lula, enfraquecendo, em consequência, o sistema eleitoral e as urnas eletrônicas.
"Eu tenho falado com os meus 23 ministros. Nós não podemos esperar chegar 23, olhar para trás e falar: o que nós não fizemos para o Brasil chegar à situação de hoje em dia? Nós temos que nos expor. Cada um de nós. Não podemos esperar que outro façam por nós. Não podemos nos omitir. Nos calar. Nos esconder. Nos acomodar. Eu não posso fazer nada sem vocês. E vocês também patinam sem o Executivo", disse Bolsonaro na reunião.
Em seguida, o ex-presidente solicitou que os ministros difundissem informações fraudulentas, ressaltando que quem não quisesse deveria explicar o motivo para tal.
"E a gente vê que o DataFolha continua ... é ... mantendo a posição de 45% e, por vezes, falando que o Lula ganha no primeiro turno. Eu acho que ele ganha, sim. As pesquisas estão exatamente certas. De acordo com os números que estão dentro dos computadores do TSE", também afirmou Bolsonaro.
Bolsonaro também apontou a ideia de convocar embaixadores para citarem fraudes no sistema eleitoral brasileiro. Essa reunião, inclusive, com falsas afirmações sobre as urnas eletrônicas, motivou a inelegibilidade do ex-presidente pelo TSE.
"Daqui para frente quero que todo ministro fale o que eu vou falar aqui, e vou mostrar. Se o ministro não quiser falar ele vai vim falar para mim porque que ele não quer falar. Se apresentar onde eu estou errado, eu topo. Agora, se não tiver argumento para me ti... demover do que eu vou mostrar, não vou querer papo com esse ministro. Tá no lugar errado. Se tá achando que eu vou ter 70% dos votos e vou ganhar como ganhei em 2018, e vou provar <como que eu ganhei>, o cara tá no lugar errado", aponta a transcrição.
Ataques ao TSE
Na mesma reunião, general Augusto Heleno citou a ideia de "virar a mesa" antes que se concretizasse o resultado das eleições. Investigadores apontam que ele também teria comentado sobre a infiltração de agentes da Abin nas campanhas eleitorais.
"Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa é antes das eleições (...) Eu acho que as coisas têm que ser feitas antes das eleições. E vai chegar a um ponto que nós não vamos poder mais falar. Nós vamos ter que agir. Agir contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas. Isso para mim é muito claro", afirmou na ocasião.
O então ministro da Justiça, Anderson Torres, e o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, também tiveram falas transcritas pela investigação da Polícia Federal.
"O Diretor Geral da Polícia Federal montou um grupo de policiais federais. E agora uma equipe completa. Não só com peritos. Mas com delegados, com peritos, com agentes pra poder acompanhar, realmente, o passo a passo das eleições para poder fazer os questionamentos necessários que têm que ser feitos e não só as observações.(...) A gente vai atuar de uma forma mais incisiva. Já estamos atuando", disse o primeiro.
Já o segundo determinou o Tribunal Superior Eleitoral como "inimigo" do grupo bolsonarista. "O que eu sinto nesse momento é apenas na linha de contato com o inimigo. Ou seja ... na guerra a gente … linha de contato, linha de partida. Eu vou romper aqui e iniciar minha operação. Eu vejo as Forças Armadas e o Ministério da Defesa nessa linha de contato. Nós temos que intensificar e ajudar nesse sentido pra que a gente não fique sozinho no processo", confirmou na reunião.