O que muda com a aprovação do arcabouço fiscal no Congresso Nacional

Novas regras fiscais aguardam a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para serem aplicadas

A mudança nas regras fiscais brasileiras foi aprovada, nesta terça-feira (22), pela Câmara dos Deputados após mais de cinco meses de discussão no Legislativo federal e agora aguarda apenas a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O arcabouço fiscal, apresentado ainda em março pelo Governo Federal, substitui o chamado Teto de Gastos, instituído no início do Governo Michel Temer (MDB).

A principal mudança trata da referência usada para o crescimento das despesas públicas, que passa a ser superior à inflação, como previsto nas normas anteriores — o que, na prática, congelava os gastos da máquina pública, limitando os investimentos. Agora, por outro lado, passa a ficar estabelecido um piso para os investimentos.

O texto aprovado pelo Congresso Nacional também prevê exceções às novas normas fiscais, incluindo o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação).
 
E, apesar de prever punições ao Governo Federal em caso de descumprimento das regras fiscais, o salário mínimo foi protegido, garantindo o aumento real no reajuste anual. 

O Diário do Nordeste explica as principais mudanças nas regras fiscais do País com a aprovação do arcabouço fiscal: 

Flexibilidade para o aumento das despesas

Em vigor desde 2017, o Teto de Gastos estabelecia que o aumento das despesas do Governo Federal seria feito apenas dentro do limite da inflação registrada durante 12 meses, até junho do ano anterior. Na prática, isso congelava os gastos públicos, sem a possibilidade de um crescimento real das despesas. 

Um dos principais problemas nisso, segundo o Governo Lula, era a limitação quanto a investimentos, além da falta de flexibilidade em casos de gastos emergenciais ou imprevistos. 

Depois de sancionada, a regra para o crescimento de despesas públicas muda e passa a ser vinculada às receitas arrecadadas pela União. O arcabouço fiscal estabelece um aumento real das despesas variando entre 0,6% e 2,5%, anualmente — percentuais que passam a funcionar, na prática, como piso e teto deste crescimento. 

Além disso, o Governo Federal também irá precisar cumprir as metas de resultado primário — valor obtido a partir da diferença entre a receita e os gastos públicos, excluídos os juros da dívida pública. 
 
Caso a meta seja cumprida, os gastos podem aumentar até o limite de 70% do crescimento de arrecadação. No caso de descumprimento, esse limite cai, passando a 50% do crescimento da receita. 

Com isso, sempre haverá um aumento real dos gastos públicos no País, mesmo quando o aumento de arrecadação não cumprir a meta estabelecida. E se, por outro lado, houver sobras, o montante poderá ser usado exclusivamente para investimentos. 

Valor mínimo para investimentos

Outra mudança é o estabelecimento de um percentual mínimo de investimentos públicos. Anteriormente, pelo Teto de Gastos, não era estabelecido um valor mínimo para os investimentos, que entravam no conjunto de gastos públicos limitados pelas regras fiscais. 

O arcabouço fiscal estabelece que, anualmente, deve ser investido um valor equivalente a, pelo menos, 0,6% do Produto Interno Bruto, o PIB, previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA).

Estes serão os valores a serem aplicados na construção de obras de infraestrutura, na criação de novos programas sociais ou na ampliação dos projetos já existentes, por exemplo. 

O que fica de fora das regras do arcabouço fiscal

Um dos motivos do arcabouço fiscal ter retornado para votação na Câmara dos Deputados foi alteração feita pelos senadores ao retirar o Fundeb e o Fundo Constitucional do Distrito Federal dos limites estabelecidos pelas regras fiscais. 

Outras exceções às novas normas também estão descritas no texto. As transferências constitucionais a Estados e municípios, como os tributos, por exemplo, estão isentos, assim como recursos extraordinários para despesas urgentes, como as provenientes de calamidades públicas.

Confira todas as exceções previstas no arcabouço fiscal:

  • Transferências constitucionais a entes federativos, como as de tributos;
  • Repasses feitos para atender despesas urgentes, como as calamidades públicas;
  • Recursos do Fundeb;
  • Parcelamento de precatórios obtidos por estados e municípios relativos a repasses do antigo Fundef; 
  • Repasses ao Fundo Constitucional do Distrito Federal;
  • Despesas bancadas por doações, como as do Fundo Amazônico;
  • Recursos obtidos em razão de acordos judiciais ou extrajudiciais relativos a desastres de qualquer tipo;
  • Despesas não recorrentes da Justiça Eleitoral, como a realização das eleições;
  • Despesas da União com obras e serviços de engenharia custeadas com recursos transferidos por estados e municípios; 
  • Pagamento de de precatórios com deságio aceito pelo credor; 
  • Despesas com a quitação de precatórios usados pelo credor para quitar débitos ou pagar outorgas de serviços públicos licitados;
  • Transferências legais a estados e municípios de parte da outorga pela concessão de florestas federais ou venda de imóveis federais em ocupação localizados em seus territórios;
  • Despesas custeadas com receitas próprias ou convênios obtidas pelas universidades públicas federais, pelas empresas públicas da União que administram hospitais universitários, pelas instituições federais de educação, ciência e tecnologia, vinculadas ao Ministério da Educação, pelos estabelecimentos militares federais e demais instituições científicas, tecnológicas e de inovação. 

Punições ao descumprimento das normas

Durante a tramitação na Câmara dos Deputados, foram acrescentadas punições ao Governo Federal caso as metas fiscais não sejam cumpridas. 

No primeiro ano de descumprimento, a União fica proibida de:

  • Criar cargos que aumente a despesa;
  • Alterar estrutura do funcionalismo público, que resulte em aumento de gastos;
  • Criar ou elevar auxílios para servidores federais;
  • Conceder ou ampliar incentivos fiscais a empresas ou setores econômicos. 

Caso o governo continue a não conseguir cumprir a meta por um segundo ano consecutivo, as limitações aumentam. Além das proibições anteriores, a União não poderá:

  • Conceder reajuste salarial aos servidores federais;
  • Realizar concurso para novas vagas no funcionalismo público. 

As restrições são suspensas de imediato no ano em que o Governo Federal conseguir cumprir as metas. O presidente em exercício também pode enviar projeto de lei ao Congresso Nacional propondo corte de gastos ou medidas para aumento de receitas. Caso a proposição seja aprovada, as restrições também são retiradas ou reduzidas. 

As restrições também serão aplicadas quanto às despesas obrigatórias do governo ultrapassarem 95% dos gastos totais.

Proteção ao salário mínimo

Apesar da previsão de punições, o arcabouço fiscal protege o salário mínimo das restrições previstas em anos de descumprimento das metas. 

Assim, o governo poderá reajustar o salário mínimo, com ganho real e impacto nos benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), mesmo em anos que estiverem sendo aplicadas restrições aos gastos públicos.