Pelo segundo ano consecutivo, os foliões cearenses estão proibidos de aproveitar as grandes festas de Carnaval no Estado. Devido à pandemia, o Governo do Ceará determinou uma série de medidas para impedir aglomerações. A decisão, porém, não tem impactos somente na saúde pública.
Municípios que, tradicionalmente, promovem festas nesta época do ano veem as finanças públicas afetadas com a pandemia e, sem atrair a mesma quantidade de turistas, buscam alternativas para amortecer as perdas econômicas.
No Ceará, além da Capital, que passou a investir nas festas de rua nos últimos anos, municípios como Caucaia, Paracuru, Jijoca de Jericoacoara, Aracati, Aquiraz e São Benedito atraem multidões nesta época do ano. Com os visitantes, há também uma injeção de recursos nas economias desses locais, o que não ocorreu no ano passado e deve se repetir neste ano.
Em Fortaleza, por exemplo, ainda em novembro de 2021, o prefeito José Sarto (PDT) cancelou os investimentos nos festejos. Estavam previstos R$ 14 milhões para serem aplicados no Pré-Carnaval e no Carnaval.
Sem folia na Capital
"Estamos cancelando os recursos que seriam usados no ciclo carnavalesco, como Pré-Carnaval e o Carnaval. São recursos que estão sendo discutidos na Câmara e que têm uma quantia de quase 14 milhões de reais. Esses recursos nós vamos usá-los para proteção alimentar, para a saúde e para o incentivo à cultura"
Mesmo com a capacidade de reinvestir os recursos em outras áreas, a Capital – destino e local de partida de milhares de foliões – sente os impactos do cancelamento da festa, evidência disso está na rodoviária.
Conforme a Coordenadoria de Transporte da Agência Reguladora do Estado do Ceará (Arce), de sexta-feira (25) a quarta-feira (2), a estimativa é de que 22 mil passageiros passem pelo local. Esse valor é 51% inferior ao registrado em 2019, antes da pandemia. À época, 45 mil pessoas viajaram partindo da rodoviária da Capital.
Manifestação cultural
Um dos mais tradicionais carnavais do Ceará ocorre em Aracati, na Região Metropolitana de Fortaleza. Em dezembro do ano passado, a festa do município foi reconhecida pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) como uma manifestação da cultura nacional.
A folia se espalha em diversos pontos da cidade, como as praias de Majorlândia e Canoa Quebrada, a Praça da Comunicação, a Rua Coronel Pompeu e a Rua Coronel Alexanzito. Em 2019, cerca de 474 mil pessoas celebraram os festejos em uma única noite e movimentaram a economia local, segundo dados da Prefeitura.
À época, de acordo com Fátima do Carmo, secretária de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Renda de Aracati, a festa injetou cerca de R$ 200 milhões no município. “É um consumo muito grande de latinhas de cerveja, compras nos supermercados, aluguéis de casas, pousadas, hotéis, é uma movimentação geral de toda a cadeia”, aponta a secretária.
Festas privadas
Assim como foi no ano passado, neste ano o cenário por lá será diferente. O decreto estadual Nº 34.544, publicado pelo Governo do Ceará, que deve valer para o Carnaval, veda a realização de festas públicas e prevê um limite de 500 pessoas em festas privadas, caso sejam realizadas em locais abertos. Em ambientes fechados, esse público deve ficar limitado a 250 pessoas. Além do limite de pessoas, o documento determina a exigência de passaporte vacinal e uso de máscaras.
O Estado também recomendou o adiamento do feriado de Carnaval para comércio, escolas e indústria como mais uma medida para desestimular as festas e viagens no atual cenário epidemiológico. A secretária ressalta a importância de controlar o avanço da Covid-19 no Ceará, mas lamenta os impactos na cidade.
“O prefeito Bismarck Maia faz questão de cumprir os decretos estaduais e não fará nada diferente disso, mas, de fato, é uma perda grande para nosso município. É uma perda muito grande para a economia local, para as pessoas que aproveitam essa época do ano para conseguir uma renda maior, isso sem falar do ciclo carnavalesco como um todo, porque tem também o período de Pré-Carnaval. É uma perda de arrecadação enorme para todos”
Destino dos foliões
Apesar de não ter dados comparativos ao período pré-epidêmico, o município de Caucaia também sente os efeitos da pandemia sem as grandes festas de Carnaval que atraíam multidões, principalmente, para a Praia do Cumbuco.
Conforme Yrwana Albuquerque, secretária de Turismo e Cultura na cidade, a previsão é de que a rede hoteleira do município tenha taxa de ocupação superior a 78% neste ano. Porém, o valor ainda é inferior ao registrado em 2018, por exemplo, quando dados da Secretaria do Turismo do Ceará (Setur) indicavam que a Praia do Cumbuco era o destino mais procurado do Ceará. No município, a média de ocupação hoteleira era de 93,5%.
A secretária ressalta que, mesmo diante do cancelamento dos festejos públicos, a Praia do Cumbuco segue sendo um dos destinos mais procurados, principalmente devido aos investimentos municipais para manter a área atrativa para os turistas. "Políticas públicas de fortalecimento do turismo e do trade turístico e melhorias na infraestrutura tornaram a praia do Cumbuco um dos destinos mais desejados pelos turistas”, conclui.
Carnaval diferente
Enquanto municípios investem recursos para manter destinos mais tradicionais atrativos mesmo sem grandes festas, alguns municípios dizem perceber pouco impactados. Em Jijoca de Jericoacoara, a Prefeitura aponta que os turistas chegam à cidade atraídos pelas belezas naturais – tanto antes da pandemia quanto atualmente.
“O perfil de turista que vem à Jericoacoara é aquele que escolheu o destino por conta das praias, não pelas festas de carnaval, então isso nos mantém como um destino movimentado mesmo sem grandes festas"
“O cancelamento das festas não alterou muito para nós, vamos receber todos que estavam com viagem já marcada, obviamente que respeitando os decretos municipal e estadual”, pondera.
Em busca de alternativas
Em Aracati, a secretária Fátima do Carmo explica que, desde o ano passado, o município passou a promover uma série de eventos como forma de atrair turistas para cidade ao longo do ano, amortecendo as perdas que passou a ter no carnaval.
“No ano passado, conseguimos fazer o Festival de Gastronomia e Cultura, quando tivemos um público de 10 mil pessoas nas ruas. Para este ano, estamos na expectativa de que a pandemia diminua bastante até junho, porque, tendo um cenário estável e uma ampla vacinação, será possível fazer as festas juninas”, ressalta.
Segundo ela, o município também passou a atrair eventos esportivos. “Adotamos a estratégia de sediar eventos esportivos, que são ao ar livre, mais seguros, e chegamos a receber 800 atletas em um só evento no ano passado, isso ajuda a movimentar toda a cadeia”, conclui Fátima do Carmo.
Fiscalização
Sem festas públicas autorizadas neste ano, o Governo do Ceará deve, em trabalho conjunto com o Ministério Público do Ceará (MPCE) e os órgãos de segurança pública dos municípios, aumentar a fiscalização sobre o cumprimento das regras do decreto no período.
"Esse não é momento para estarmos fazendo festa. É momento de superarmos a terceira onda, vacinar a população. (...) A Operação Carnaval, que a gente sempre teve, vamos colocar no sentido de que a gente evite qualquer tipo de celebração nesse período", disse Camilo Santana no início deste mês em pronunciamento na Assembleia Legislativa.
Os municípios ouvidos pela reportagem também ressaltaram que atuarão em conjunto com as forças da Segurança Pública do Estado para inibir aglomerações acima do permitido pelo decreto estadual.
O Diário do Nordeste procurou as prefeituras de São Benedito, Paracuru e Aquiraz, mas não houve retorno.