O Governo Federal quer criar um voucher (vale) de R$ 250 por mês para que crianças tenham acesso a creches no setor privado. A medida teria custo de R$ 6 bilhões por ano e seria bancada com recursos do Fundeb, fundo de financiamento da educação básica do País cuja prorrogação está em discussão pelo Congresso.
O plano do Ministério da Economia é pagar esse valor ao beneficiário do Renda Brasil, programa que o Governo desenha para substituir o Bolsa Família.
A mudança no escopo do Fundeb para permitir o pagamento dos valores foi incluída na proposta do Governo para reformulação do fundo, apresentada no sábado (18). Esse é um dos pontos mais polêmicos do texto do Governo, proposto nas vésperas da votação do texto na Câmara.
O fundo é composto pelos impostos de estados e municípios e, hoje, a União arca com 10% do montante para complementar o valor destinado a estados que não alcançam um valor mínimo por aluno.
A proposta do Governo aumenta sua complementação para 15% de maneira gradativa, e destina 5% para o novo programa social (o equivalente a R$ 6 bilhões). Os deputados querem ampliar a complementação para 20%.
O Governo chegou a marcar uma entrevista ontem para apresentar sua proposta para o Fundeb, mas depois cancelou. Técnicos do Ministério da Economia discutem com o Palácio do Planalto possíveis alterações no texto, mas insistem em manter a vinculação de recursos para o voucher.
A estimativa dos técnicos da Economia é que o déficit de vagas para crianças de 0 a 3 anos dentro da faixa a ser atendida pelo Renda Brasil é de 2 milhões, já descontadas as famílias desse universo cujos filhos não estão em creche por opção. Segundo esses técnicos, o valor de R$ 6 bilhões seria suficiente para bancar o voucher para a creche e atender 2 milhões de pessoas.
O plano faz parte de um dos quatro pilares que estão sustentando o Renda Brasil. A medida viabiliza, por exemplo, que mães de famílias pobres não sejam prejudicadas no mercado de trabalho.
A ideia não envolveria a construção de creches públicas. Na visão da equipe, a concessão de vouchers seria mais eficiente porque permitiria que as famílias escolhessem os estabelecimentos em que querem matricular as crianças. Assim, seria possível aproveitar a estrutura de instituições já estabelecidas, como creches privadas e até igrejas.
O Ministério avalia também que é mais eficiente transferir recursos diretamente para as famílias, pois isso seria um incentivo a manter as crianças e os jovens na escola.
A inclusão da proposta de assistência social no Fundeb também é uma maneira de o Governo tirar parte do Renda Brasil da regra do teto de gastos. Essa regra limita o acréscimo das despesas da União à inflação do ano anterior.
O Fundeb, porém, sempre esteve fora do teto. Ao colocar o vale creche no Fundeb, o Governo dribla o teto de gastos e facilita a implantação do programa sem as amarras dessa regra fiscal.
Votação
Para o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o Governo enviou "ideias soltas" sobre o Fundeb ao Congresso, sendo que já houve um "debate longo" para consolidar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que deve ser votada nesta semana.
Uma das propostas do Governo, criticada por líderes, é que os efeitos do fundo só começariam a valer em 2022. Ou seja, em 2021, os recursos para a educação básica poderiam vir do Orçamento. Na prática, haveria mais flexibilidade para usar a verba destinada ao Fundeb em outras finalidades, como assistência social. "Não vejo sentido nesse encaminhamento. Até porque para alguns temas o Governo entende que tem dinheiro, e em outros temas eles geram mais resistência".
Após três anos em discussão na Câmara, o debate em torno da PEC do Fundeb vive uma queda de braço às vésperas do desfecho. A votação, antes prevista para ontem, terá uma nova tentativa hoje (21).
A proposta do Governo de transferência direta de recursos para famílias com crianças em idade escolar e em situação de pobreza ou extrema pobreza não tem consenso entre os parlamentares.
Segundo os críticos, a medida é uma tentativa do Governo de criar um programa de assistência social com recursos destinados à educação.
Recurso
Em vigência desde 2007, o Fundeb, considerado essencial para a educação do País, fica em vigor só até o fim deste ano. É composto por impostos estaduais, municipais e federais. No ano passado, os recursos do fundo somaram cerca de R$ 166,6 bilhões - R$ 151,4 bilhões de arrecadação estadual e municipal, e R$ 15,14 bilhões da União.
No formato atual, a União complementa o fundo com 10% sobre o valor aportado por estados e municípios. O texto da relatora, Dorinha Seabra (DEM-TO), prevê um aumento escalonado que começaria em 12,5% em 2021 e chegaria a 20% em 2026. Pela versão do Governo, o fundo seria retomado em 2022.