Beneficiado por nova regra no orçamento, deputado cearense privilegia prefeitos aliados

Relator do orçamento de 2020, Domingos Neto ressalta que é missão do parlamentar brigar por recursos ao seu estado

Das 27 prefeituras eleitas pelo PSD no Ceará, em 2020, 22 delas foram beneficiadas com o recebimento de maquinários de obras pesadas na última quinta-feira (10). A destinação dos equipamentos partiu do deputado federal Domingos Neto (PSD), que indicou R$ 60 milhões à Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) para a compra dos equipamentos enquanto relator do Orçamento da União 2020. 

Entre as gestões beneficiadas está justamente a de Tauá, berço político da família do parlamentar, onde a prefeitura é comandada por sua mãe, Patrícia Aguiar (PSD).

Ao todo, 30 prefeitos cearenses – sendo 22 do PSD – foram até o município, na semana passada, onde Domingos Neto fez uma cerimônia para a distribuição dos tratores, motoniveladoras, escavadeiras hidráulicas, retroescavadeiras e pás-carregadeiras. 

As únicas prefeituras comandadas por quadros do PSD que não receberam os equipamentos foram as de Barreira, Icapuí, Iguatu, Pedra Branca e Solonópole. Nas redes sociais, o deputado informou que o evento da semana passada foi apenas a primeira rodada de distribuição dos recursos. 

Correligionário do parlamentar, o prefeito de Tejuçuoca, José Antunízio de Brito, conhecido como Britinho, comemorou a chegada da pá mecânica ao município. “Faz uma diferença grande para nós na recuperação de estradas, e é um equipamento que é difícil para um município pequeno angariar recursos próprios suficientes para adquirir”, disse. 

Origem e destino

Ao jornal O GLOBO, a Codevasf detalhou como os  R$ 60 milhões destinados pelo deputado foram usados. Segundo a Companhia, foram compradas dez retroescavadeiras (R$ 246 mil cada), onze pás-carregadeiras (R$ 234 mil), sete motoniveladoras (R$ 457,8 mil) e três  escavadeiras hidráulicas (R$ 432,1 mil). 

De acordo com Domingos Neto, esses recursos saíram das chamadas “emendas de relator”, instrumento que dá ao parlamentar que relata o Orçamento autonomia para indicar o destino de vultosa quantia em investimentos.

Ao todo, só em 2020, esse dispositivo foi responsável por definir a aplicação de R$ 20 bilhões do orçamento. Como o deputado cearense foi o relator do Orçamento daquele ano, ele teve autonomia de remanejar esses recursos e negociar com outros parlamentares onde seriam aplicados.

As emendas de relator causam polêmica por darem a poucos o poder sobre uma quantidade significativa de recursos, bem acima do que podem indicar os demais parlamentares.

No fim de maio, o Ministério da Economia editou uma portaria modificando a liberação dos recursos do orçamento para esse tipo de mecanismo. Na prática, a liberação dá mais poder ao Congresso sobre o orçamento e, em tese, melhora o apoio ao governo nas casas.

A mudança fez com que críticos da medida dessem ao mecanismo o nome de "orçamento paralelo". A medida, como é o caso do parlamentar cearense, acaba causando distorções. 

Tauá

Boa parte dessas emendas de relator foi destinada por Domingos Neto à Prefeitura de Tauá. A cidade foi a que recebeu maior valor em repasses, considerando as transferências diretas para as prefeituras. Ao todo, foram R$ 146 milhões no final do ano passado.

Ao Diário do Nordeste, Domingos Neto negou qualquer conduta ilegal.

“É missão do parlamentar brigar para conquistar recursos para seu estado e seus municípios, e fiquei muito feliz em poder ajudar ao nosso estado”, disse. “Esses equipamentos são fundamentais para que os municípios possam ter as condições de executar obras como estradas e obras hídricas”
Domingos Neto
Deputado federal

Emendas de relator

A mudança, feita por meio de portaria, fez com que o Governo Federal flexibilizasse as regras para que o Executivo cumpra as recomendações de destinação de recursos das emendas de relator. Na prática, os parlamentares passam a ter mais poder sobre o destino das emendas. 

Essa alteração nas regras ocorre na esteira de uma polêmica. O Governo Federal foi acusado de usar as “emendas de relator” como forma de ampliar a influência de parlamentares na destinação de recursos da União. Através dessa articulação, congressistas alinhados ao Governo Federal acabaram direcionando montante superior aos R$ 16 milhões a que tem direito.