Tom Barros

Os senhores donos do futebol e suas decisões abomináveis

Na década de 1950, o notável cantor Chico Alves, o Rei da Voz, apresentava na Rádio Nacional do Rio de Janeiro o famoso programa "Quando os Ponteiros se Encontram". Pelas ondas curtas, audiência em todo o Brasil. Ia ao ar exatamente ao meio-dia. Horário nobre, ocupado por um ídolo muito amado. Naquele tempo, coitado daquele que ousasse marcar futebol para o meio-dia. Seria execrado. Nada de desrespeitar o horário sagrado do almoço em família, com direito à sesta. Bola rolando no futebol só depois das 16 horas. Nos estádios que não dispunham de sistema de iluminação elétrica, ainda se admitia começar o jogo às 15h30. E, assim mesmo, as reclamações eram gerais. Prioridade dada à saúde dos atletas e dos torcedores. Daí veio a ideia dos jogos noturnos, logo aprovada e concretizada. Enfim, nem pensar colocar em campo os times de futebol sob o calor sufocante de 12 ou 13 horas. Hoje, quando mais se prega cuidados especiais contra os prejudiciais efeitos da luz solar, a FIFA, dona do mundo, autoriza jogos às 13 horas até mesmo no semiárido nordestino. Não posso silenciar. E me dói ver a conivência de entidades que permanecem caladas, quando deveriam lançar verdadeiro libelo contra tamanho absurdo. Qualquer mortal sabe que, sob calor sufocante de sol a pino, nenhum atleta pode ter o elevado rendimento que teria no frescor do cair da tarde ou na suave brisa da noite. Sob a luz solar de 13 horas a qualidade do futebol fica seriamente comprometida. Mas o senhores donos do futebol assim querem. Os senhores donos do futebol assim mandam, determinam. Os senhores donos do futebol são intocáveis. Os senhores do donos futebol, nos seus gabinetes refrigerados, nas temperaturas reguláveis a seu bel prazer, decidem encaminhar à canícula, ao fogo do inferno, os astros que teriam de dar os maiores espetáculos de futebol do planeta. Submetidos ao calor de 13 horas, os que lutam e correm em campo não são respeitados nem como homens nem como atletas. E as confederações aceitam; e as federações aceitam; e os sindicatos aceitam; e a sociedade aceita. E os senhores donos do futebol, bem acomodados nos pontos privilegiados dos estádios, contemplam insensíveis e indiferentes o terrível desgaste físico dos jogadores. Estes, sim, derretidos pelo esforço sobre-humano e desmanchados no suor que deles escorre incessante como numa bica. Fica aqui o protesto. Pode não prosperar, mas repousa a consciência por não ter sido omissa. Década de 1950, 12 horas: sagrado momento do almoço. Chico Alves encantava com sua bela voz no programa "Quando os ponteiros se Encontram". Ano 2014, 13 horas: hora de afligir e torrar atletas nos gramados brasileiros. 11

Submetidos ao calor do meio-dia, os que lutam e correm em campo não são respeitados nem como homens nem como atletas