Após 15 anos em jejum do Carnaval de Pernambuco e dois anos sem a festa mais popular do país, decidi carnavalizar nas ladeiras de Olinda e nas ruas históricas de Recife. Hoje, compreendo que a música interpretada por Alceu Valença, com o verso que diz “foi a saudade que me trouxe pelo braço” é muito mais do que uma canção que empolga blocos e foliões; é um sentimento verdadeiro.
Acho que eu tinha esquecido como era essa experiência de viver um carnaval tão cultural e tão democrático. Pelas ruas, não existem cordões ou camarotes, nem divisões.
É tudo junto e misturado: gerações, classes, cores e sexualidades. E nada é bagunçado, apesar de tudo parecer caótico.
Entre crianças, jovens, adultos e idosos brincantes, que pulavam e cantavam os clássicos frevos e hinos, havia uma sistemática organização. Tudo tem a sua hora, a sua regra e o seu percurso. Tudo deve ser respeitado, como manda a tradição. Dentro dessa estrutura, aí sim, você pode se libertar e aproveitar.
O Galo da Madrugada - uma das mais populares manifestações carnavalescas do país - é grandioso e comovente, principalmente pela valorização dos artistas locais. Os trios são comandados por músicos que fazem parte da história de Pernambuco e as celebridades da música brasileira são convidados como participantes. Essas participações dão um charme, mas são pontuais, pois as estrelas do evento, são mesmo os artistas locais. Para quem é de Fortaleza, isso é muito marcante.
Em Olinda, vivi ainda outro momento impactante, a saída do Homem da Meia Noite. Há 91 anos, o calunga promove uma concentração gigantesca no bairro de Bonsucesso com o tradicional percurso de entregar a chave da cidade e abrir, oficialmente, o carnaval olindense passando, na madrugada, para o Bloco Cariri continuar o percurso até o amanhecer do dia.
O momento em que se revela a roupa do Homem da Meia Noite e ele aparece para o grupo público é absolutamente apoteótico e comovente. Pelas ruas, podemos ver as pessoas, durante a passagem, soltando fogos, penduradas nas sacadas, telhados e cantando o enredo desse personagem tão emblemático.
É durante o desfile do Homem da Meia Noite que vemos claramente que o pernambucano ama seu carnaval e sua cultura. As crianças nos ombros dos pais cantando e com olhos vidrados, homens e mulheres chorando de alegria e buscando espaço para se aproximar e tocar no boneco gigante que segue elegante e contagiante.
E como não falar de Alceu e sua potência no palco, aclamado por seus conterrâneos. Sem falar no frevo e na música brega, que está na ponta da língua de qualquer pernambucano. Um povo que sabe amar e expressar seu carnaval com orgulho e maestria.
Que lindo foi ver o Carnaval nas ruas novamente. Que incrível ver de perto um povo que ama e tem orgulho da sua cultura. Nordestino sabe mesmo fazer festa e não é bairrismo meu, é fato. Que emocionante foi ver o Brasil feliz assim mais uma vez.
Feliz Ano Novo!
*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor