Ana Marlene: um patrimônio do teatro cearense

Aos 45 anos de carreira, a atriz se renova e se lança em uma empreitada inédita, seu primeiro monólogo

Sempre que penso em trajetória no teatro cearense, penso naqueles que abriram os caminhos pra que eu pudesse ser o ator que sou hoje. Imediatamente, nomes como Ricardo Guilherme, Silvia Moura, Antonieta Noronha, Paulo Ess e tantos outros vêm à minha mente como grandes baluartes. Hoje, quero falar especificamente de outro grande alicerce, Ana Marlene.

Atriz e diretora de teatro, Marlene é um patrimônio da nossa cultura, com uma carreira extensa, premiada e aplaudida por toda sua versatilidade, suas performances, da comédia ao drama, do clássico ao contemporâneo, seja nos palcos do teatro ou nos palcos das ruas.

São 45 anos dedicados à arte, mais tempo do que tenho de idade. Entre espetáculos e filmes, um feito se destaca muito nessa história. Em 1990, junto de Paulo Ess, um grande mestre, Marlene fundou em Fortaleza a Trupe Caba de Chegar, o primeiro grupo de teatro de rua da cidade, que segue em atividade até hoje, aos 34 anos, na resistência.

Fazer peça em um teatro, com segurança, iluminação, som, estrutura, temperatura e um público que foi até aquele espaço para ter essa troca artística com você, já é difícil. Imagina se dedicar a essa arte sob a camada da imprevisibilidade, na rua, céu aberto, carros, transeuntes e conseguir conquistar as pessoas a ponto delas pararem o seu trajeto para assistir o que você tem a apresentar. Ana Marlene faz!

E como se não bastasse, depois de tantos espetáculos e filmes, aos 60 anos, ela escolheu se lançar em uma empreitada completamente nova, atuar em seu primeiro monólogo. A peça “Egoísta”, dirigida por Juracy de Oliveira, está em cartaz neste fim de semana no Teatro Dragão do Mar e depois segue para temporada no Rio de Janeiro.  

Só de ser um solo de Ana Marlene já seria motivo suficiente pra se assistir, mas a temática do espetáculo é de extrema importância. “Egoísta” conta a história real de Josefa Feitosa, mulher preta, cearense, que depois de aposentar, colocou sua mochila nas costas e resolveu tornar-se viajante do mundo, nômade, viver onde sua mala está. Entre essas andanças, a personagem traz à tona questões sobre maternidade, liberdade e etarismo.

Sem dúvidas, essa é uma daquelas obras de se levar mãe, pai, avó, tia, porque é urgente que se debata o preconceito contra pessoas de idade avançada, especialmente contra mulheres. Nossa sociedade está envelhecendo.

Estamos preparados para isso? Sinto que conhecer a história de Josefa e ver Ana Marlene atuando será um marco, duas mulheres que resolveram subverter o que se espera de uma mulher depois dos 60.

*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor