A recente decisão do Conselho Federal de Medicina (CFM) proibindo a prescrição de terapias hormonais com anabolizantes e esteroides androgênicos para fins estéticos repercutiu entre profissionais de saúde, pessoas que realizam esse tipo de tratamento e até mesmo entre os que são contra ou a favor do veto. Entretanto, a determinação é cercada, antes de tudo, de discussões profundas sobre uma regulamentação específica dessas substâncias.
Estudos já haviam indicado um aumento do uso de anabolizantes entre indivíduos que buscam o ganho de massa muscular e definição mais rápida do corpo. Pelo menos é o que explica o médico gestor em saúde e sanitarista Álvaro Madeira Neto, que esclareceu a esta coluna um dos motivos pelo qual a discussão teve a proibição como finalidade.
"As pessoas buscam os efeitos anabólicos destas substâncias. Então, pensam no crescimento rápido de massa muscular, uma definição rápida do corpo e desconsideram os sérios e graves efeitos colaterais, além dos riscos do uso indiscriminado", opina, de pronto, o profissional.
Apoio de médicos
A resolução acolhida pelo CFM foi elaborada pela Câmara Técnica de Endocrinologia e Metabologia do Conselho Federal de Medicina, coordenada pela endocrinologista Annelise Meneguesso. É a profissional, inclusive, quem aponta a luta para o apoio de oito sociedades médicas nessa causa, algo que culminou com a aprovação da proposta.
"A resolução visa coibir o uso indevido desses hormônios, já que existe sim a indicação, de serem prescritos pelos colegas no país inteiro, mas, ressalto, são indicações que já tem o respaldo na literatura segundo as últimas evidências científicas", pontua a médica.
Agora, os cenários se alteram para um caminho de maior segurança no uso, ela reforça.
"O paciente vai ter a garantia de que ao procurar um profissional de saúde, no caso um médico, ele vai estar sendo bem acompanhado e bem conduzido em relação à terapêutica em questão", diz.
Mas afinal de contas, o que são os anabolizantes e esteroides androgênicos? Quais os reais perigos que trazem ao corpo e por qual motivo têm sido utilizados como via de escape para resultados mais rápidos e visíveis em corpos considerados dentro do "padrão"? Veja a seguir detalhes sobre as substâncias e quando elas devem ser prescritas conforme a literatura médica.
O que são anabolizantes e esteroides?
Entender o que são de fato perpassa a compreensão do cenário geral, sem dúvidas. Segundo Álvaro Madeira, os esteroides androgênicos e anabolizantes são "compostos derivados do hormônio sexual masculino chamado testosterona e são conhecidos pelas propriedades anabólicas". Assim, promovem crescimento muscular em meio à reposição de testosterona, estimulando características sexuais secundárias masculinas, justamente por possuírem propriedades androgênicas.
A Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde aponta, nesse sentido, que eles podem ser utilizados quando ocorre um déficit desse hormônio, algo comum no envelhecimento, por exemplo, quando o crescimento celular e em tecidos do corpo se mostra deficiente.
"Eles são indicados para uso terapêutico em casos específicos bem diagnosticados por um médico e devem ser prescritos, portanto, por um médico", reforça Álvaro Madeira.
Os exemplos citados por ele para utilização dessas substâncias estão em casos de grande perda de massa muscular, distúrbios hormonais masculinos, anemias refratárias e até em algumas condições específicas de puberdade tardia em meninos.
Quais os riscos?
Na contramão dos ganhos, os riscos se sobressaem quando usados para fins não previstos na literatura, como alertam os médicos. A unanimidade é clara: a prática para finalidade estética não tem comprovação científica e expõe uma série de malefícios à saúde.
"As pessoas se esquecem das alterações cardiovasculares que podem causar, da hipertensão, disinipidemia, problemas hepáticos, alterações no sistema reprodutivo, aumento da agressividade e até mesmo transtornos psiquiátricos. Então, trata-se de um caso de saúde populacional importante e as autoridades, portanto, tem o dever de olhar com muito cuidado para essa situação", alerta o gestor em saúde.
Para Annelise Meneguesso, os danos ao corpo são inúmeros e precisam de atenção. "Eles podem trazer insuficiência cardíaca, infarto agudo do miocárdio, estados de hipercoagulabilidade, doenças hepáticas, carcinoma hepatocelular, agressividade", reforça.
Ela também afirma, não adianta só lembrar do uso por homens quando, na verdade, mulheres têm recorrido a essa prática tanto quanto eles. "Quando se fala em história de androgênico masculino, a gente só pensa que a utilização é nos homens, mas o uso aumentou muito de forma indiscriminada em mulheres. Temos, além desses danos que eu acabei de falar, o aumento do clitóris, por exemplo", completa.
Veja a lista de alguns dos riscos:
- tremores;
- aumento da pressão sanguínea;
- tumores no fígado e pâncreas;
- agressividade;
- aumento do colesterol;
- calvície;
- infertilidade;
- impotência sexual;
- redução dos seios em mulheres;
- irregularidade ou pausa das menstruações;
- engrossamento da voz;
- crescimento do clitóris;
- crescimento de pelos no corpo e no rosto.
O que muda com a proibição?
Com a efetivação da proibição, caberá à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), como órgão fiscalizador do Brasil, a regulação, fiscalização da produção, a distribuição e o consumo, além do estabelecimento das normas de venda.
"A Anvisa faz com que só sejam vendidas as medicações por meio de uma determinada receita prescrita por um médico. Mas recentemente nós tivemos a edição de uma resolução do Conselho Federal de Medicina, que fiscaliza e orienta a prática médica no Brasil", orienta Álvaro Madeira.
Segundo ele, as mudanças já estão valendo. "A partir de agora, o médico que prescrever alguma medicação sem uma indicação comprovada e adequada estará incorrendo em uma infração ética muito grave, portanto, estando sujeito a sanções do Conselho Federal de Medicina", continua ele.
Em conclusão, o gestor de saúde direciona um apelo à quem utiliza o método para fins não previstos na literatura, definindo-o como "um atalho que compromete o futuro de cada indivíduo", mas também se direciona ao âmbito mais geral.
"Vale um apelo aos nossos gestores maiores para que por meio de uma campanha e de educação permanente se possa conscientizar cada indivíduo do seu papel e do risco que vai estar correndo caso use esse tipo de medicação", finaliza com ênfase.