Quem mantém há décadas o hábito de circular pelo Centro de Fortaleza pôde acompanhar ao longo desse tempo uma série de mudanças: pequenas reformas, lojas que saem e que chegam, muitos negócios de produtos chineses, afloramento de problemáticas. Mas nem tudo mudou.
Ainda é possível, por exemplo, passar pela Casa Bachá e A Libaneza em busca de itens de papelaria para a volta às aulas. Aproveitando a proximidade das lojas em questão com a Praça do Ferreira, um pequeno intervalo é a oportunidade perfeita para o tradicional pastel com caldo de cana na Leão do Sul.
As lojas citadas acima são três das mais antigas que habitam o bairro que já chegou a ser morada principal da elite alencarina. A Casa Bachá completa, em 2024, 113 anos. Já A Libaneza chega ao centenário neste ano. A Leão do Sul está quase lá: completa 100 anos em 2026.
As datas foram levantadas por esta coluna por meio de pesquisa direta em páginas oficiais das lojas ou por telefone com as próprias empresas.
Além delas, outros negócios estão no Centro de Fortaleza há muitas décadas, como a tradicional Farmácia Oswaldo Cruz, de 1934 (na Praça do Ferreira), e a Ótica Cruz de Ouro, de 1938 (Rua Barão do Rio Branco). A Casablanca também integra essa lista, tendo sido fundada em 1945.
Veja a lista de algumas das lojas mais antigas do Centro
Casa Bachá
A distribuidora de origem libanesa trabalha com a venda de material escolar, de escritório, papelaria, informática e material de limpeza. É a loja mais antiga encontrada por esta coluna durante o levantamento, tendo sido fundada em 1911. Fica localizada na Rua Floriano Peixoto, próxima a outras tradicionais lojas do bairro comercial.
Libaneza
Assim como a Casa Bachá, a Libaneza também trabalha com papelaria, além de atuar na venda de material de escritório e para artesanato. De acordo com publicação feita no Instagram oficial da empresa, foi fundada em 1924 pelo imigrante sírio-libanês Nagib Gazelli e hoje está sob a quarta geração da família. Também fica localizada na Rua Floriano Peixoto.
Pastelaria Leão do Sul
"Desde 1926 fazendo o melhor pastel de Fortaleza". É o que diz a Leão do Sul em seu Instagram. A lanchonete é, de fato, um dos mais tradicionais estabelecimentos alimentícios em Fortaleza. É difícil passar pelo local, na Praça do Ferreira, e não ver uma fila para consumir o produto.
Farmácia Oswaldo Cruz
Também na Praça do Ferreira está a Farmácia Oswaldo Cruz, que chama a atenção pela arquitetura do século passado e pelos costumes de outras décadas. A fundação, de acordo com a página oficial de Instagram da loja, ocorreu em 1934.
Óticas Cruz de Ouro
Com duas unidades no Centro, sendo uma na Rua Barão do Rio Branco e outra na Liberato Barroso, a Óticas Cruz de Ouro é mais uma das lojas tradicionais que resistem às mudanças e problemáticas do bairro comercial. Foi fundada em 1938.
Casablanca
Atuando no segmento de cama, mesa, banho, tecidos e decoração, a Casablanca fica na Floriano Peixoto (também há uma unidade na Major Facundo) e foi fundada em 1945. Possui outras lojas no Centro e espalhadas por Fortaleza, na Avenida Bezerra de Menezes e na Desembargador Moreira, por exemplo.
Casa dos Relojoeiros
A Casa dos Relojoeiros atua com a venda de óculos, joias e acessórios, tais como relógios de pulso. Foi fundada em 1963 e possui, além de loja no Centro, na Rua Pedro Pereira, unidades espalhadas em outros locais de Fortaleza e do Ceará.
Palácio das Canetas
Além, é claro, das canetas, o Palácio das Canetas, na Rua Barão do Rio Branco, oferece serviços de plastificação e gravações em garrafas e outras superfícies. A inauguração da loja data de 1966.
Óticas Visão
Assim como a Casa dos Relojoeiros, a Óticas Visão é mais uma tradicional loja do segmento que segue operando no Centro de Fortaleza, mas possui unidades em outros bairros e fora da Capital cearense, atuando no interior do Estado. Existe desde 1974.
BD Sports
No mesmo logradouro da Casa dos Relojoeiros e da Óticas Visão, a BD Sports é uma loja de materiais esportivos cuja inauguração data de 1966. Também há uma unidade na Senador Pompeu.
A permanência dessas lojas no Centro enquanto, paralelamente, grandes varejistas têm deixado o bairro comercial não deixa de chamar a atenção. O que mantém esses negócios operando no Centro? Há uma receita?
O que os mantêm no Centro?
Para além da realidade e das estratégias de cada negócio - obviamente não é qualquer empresa que consegue se manter ativa por um século -, o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Fortaleza (CDL), Assis Cavalcante, que também é proprietário da Óticas Visão, explica um dos fatores que contribuem para que esses negócios se mantenham nesses locais. De acordo com ele, isso ocorre porque a maioria desses negócios está localizada em prédios próprios, não tendo custo com aluguel.
“A maioria está em prédios próprios e não querem se submeter a aluguéis exorbitantes”, pontua Assis Cavalcante.
Além disso, claro, não dá para deixar de mencionar que esses negócios buscaram se reinventar e modernizar ao longo dos anos, tanto que todos possuem páginas ativas nas redes sociais, espaços nos quais foi possível encontrar informações importantes sobre as empresas.
“Esses negócios continuam se reinventando dentro do próprio mix de produtos, buscando o consumidor, investindo em tecnologia, tudo dentro da realidade atual e aí são prédios próprios, eles não pagam aluguel”, reforça o presidente da CDL de Fortaleza.
Queda na movimentação
Em outra ocasião, o presidente da CDL já havia lamentado o fechamento da C&A e da Renner no Centro e pontuado as problemáticas do bairro comercial, que podem levar à saída de outros players. Ele revela que a movimentação no Centro registrou queda intensa ao longo dos últimos anos. “Precisamos resolver a questão da moradia no Centro para que o bairro tenha vida noturna”.
O historiador e autor do livro Fortaleza Belle Époque, Tião Ponte, corrobora que o futuro do Centro de Fortaleza é preocupante. "Precisa mesmo de amplos debates, projetos e de políticas públicas".
"As propostas de varejistas, urbanistas, arquitetos, sociólogos são muitas e elas apontam para a necessidade de qualificar o Centro como, por exemplo, estimular o retorno de residências que permitam que aquele bairro tenha uma sociabilidade mais animada, tranquila e segura de noite e aos domingos", detalha o historiador.