As fura-bolhas: quando Samantha Schmütz e Juliana Paes ousaram falar do que importa

Passado pouco mais de uma semana da “briga” de Samantha Schmütz e Juliana Paes, estou aqui para agradecê-las por terem saído do silêncio da maioria dos influenciadores e por se posicionarem, ajudando algumas pessoas a refletir sobre temas que não lhe apeteciam, mas são fundamentais para a melhora do país.

Pra quem não sabe, a confusão pode se resumir em quatro momentos.

1. Schmütz, sobretudo a partir da morte de Paulo Gustavo, denuncia a má condução da política brasileira de combate à pandemia e critica a falsa neutralidade dos artistas que calam quanto à matéria.

2. Paes defende a médica Nise Yamaguchi - propagandista do que chama de tratamento precoce para Covid - porque esta, supostamente, teria sido vítima de interrupção e machismo na respectiva CPI. Juliana disse, em seus stories, que “certa ou errada, tem que haver respeito”.

3. Schmütz, depois disso, continuou a denunciar o isentismo e fez piada, lançando o Shampoo Neutro Geno Clin, com slogan e tudo: “pode não estar bom pra você, mas está bom pra mim”.

4. Paes faz um vídeo, de “resposta a uma colega”, dizendo que não é bolsominion, que tem direito a um presidente elegante que não fale besteira, um estado menos inchado, mas que também não quer ir pro outro lado, onde haveria delírios comunistas.

Foi o suficiente para algumas pessoas se perguntarem sobre conceitos de política e etiqueta social, o que me deixou feliz e cheio de esperança.

Sobre machismo

O primeiro questionamento: a médica Nise Yamaguchi foi mesmo alvo de manterrupting e machismo?

Alguns alunos meus, advogados, outrora tão alheios a temas menos interessantes como CPIs de Pandemia (estou sendo irônico, caro usuário de internet), chegaram a me dizer que, na Justiça, a interrupção dos depoimentos pelo juiz - com o insistente reforço de que o depoente deverá se ater apenas à pergunta feita - é muito comum. Alguns seguidores meus ressaltaram que mulheres são alvo de maior energia e, porque não dizer, de violência, em tais ocasiões.

Como negar que juízes e senadores da CPI podem ser mais objetivos e respeitosos ao mesmo tempo? Concordo com Juliana Paes: mesmo uma médica negacionista merece respeito, mesmo que o negacionismo tenha matado tanta gente que eu conheço, que você conhece. Seu amigo, sua mãe, seu irmão. Aqui não há ironia. Mas não há como negar que depoentes não devem discursar, e que quando um Senador pergunta a diferença entre um vírus e um protozoário, tem direito a uma resposta sobre isso, sobretudo de quem recomenda o uso de um remédio comum para tratar Covid e Malária, como é o caso da médica bolsonarista.

Nem todos, mas alguns dos apoiadores de Nise Yamaguchi, neste caso específico, levantando-se contra o que seria violência sofrida por ela, são defensores de ocasião: porque apoiam tortura, o torturador Brilhante Ustra e o AI-5; porque pronunciam todos os dias que Deus dá as expressões “mimimi” e “lacre”; porque usaram aquele adesivo pornográfico da Dilma; vaiaram Dilma em cerimônia pública; disseram que uma jornalista deu o furo; chamaram outra de quadrúpede; quebraram a placa da difunta Marielle e se elegeram tirando foto disso; apoiam spray no rosto e tiro no olho de pessoa que nem em manifestação estava.

Sobre tratamento precoce

Vivi para ver um outro questionamento de gente que não se ligava muito em pesquisar: existe mesmo tratamento precoce para Covid? Para minha felicidade, porque a menina do Zorra e a dona da Novela “discutiram”, descobriram que Ivermectina é um fármaco usado no tratamento de vários tipos de infestações por parasitas e que Azitromicina é um antibiótico usado no tratamento de várias infeções bacterianas.

Outros checaram que a Hidroxicloroquina é usada na prevenção e tratamento de malária. Uns, mais percucientes, descobriram que, mesmo sendo comum o uso de remédios fora da função original (Off Label), nenhuma desses três mostrou resultado para Covid.

A minha surpresa maior foi meu vizinho e meu ex-eletricista, fãs do Terça Livre e do Constantino, que descobriram sozinho duas coisas que, na minha bolha, são comezinhas. Um deles viu que o uso de hidroxicloroquina importou na alta de mortes em pacientes com Covid. Pois é. Ele sozinho achou uma meta-análise de 28 estudos que registrou mortalidade maior em 10 mil pacientes. O outro descobriu que Didier Raoult, o primeiro a defender o uso de Cloroquina para Covid, voltou atrás no que disse.

Sobre comunismo

Por fim, um terceiro tipo de questionamento ocorreu em Dona Odete, mãe de uma grande amiga: o que é delírio comunista? E mais: o que é comunismo? O Lula, a Globo e o Doria são comunistas mesmo? Depois, perguntou-se se todo mundo que não apoia Bolsonaro é, realmente, comunista. O livro da quinta série ajudou, mas o vídeo do Enem e uma ligação para a filha foram fundamentais para sanar a dúvida, que não mais existe.

Espero que o amigo leitor, se for o caso de não saber do que se trata, procure se informar em fontes científicas sobre o tema acima – será um grande exercício de liberdade e autonomia de pensamento. Enquanto isso, estou torcendo para que Samantha e Juliana discutam sobre outros assuntos importantes, como participação militar no governo e impeachment, por exemplo.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.