Uma servidora do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) conseguiu na Justiça do Trabalho no Ceará garantir o direito à redução da jornada sem a redução de salário e a exercer as suas atividades em regime de teletrabalho para poder cuidar do filho autista.
A decisão foi dos desembargadores da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (TRT-CE), sob a relatoria do desembargador Durval Cesar de Vasconcelos Maia.
Os magistrados reconheceram, por unanimidade, o direito da trabalhadora à redução da sua jornada semanal de trabalho de 40 para 30 horas, com flexibilidade de horário, sem redução do salário e demais vantagens inerentes ao contrato de trabalho.
Decisão concilia família e trabalho
O advogado Eduardo Pragmácio Filho, responsável pelo caso, destaca que a servidora conseguiu comprovar que possui um filho autista e que necessita de constante acompanhamento de vários profissionais das áreas de saúde.
Foi uma importante decisão, que garante o direito à família e à proteção da pessoa com deficiência, reconciliando família e trabalho, garantindo à máxima efetividade a direitos fundamentais inespecíficos de trabalhadores"
O advogado acrescenta ainda que, "além de se estabelecer um direito ao teletrabalho, foi garantida a redução da jornada sem redução salarial, para que a mãe possa cuidar do filho menor e autista, o que demanda tempo e vultosos gastos com a equipe multidisciplinar de saúde".
Precedente em benefício de crianças com necessidades especiais
A decisão, destaca Pragmácio Filho, considerou ainda que o Serpro tem o dever de assegurar a efetivação dos direitos à pessoa com deficiência, sobretudo a vida, saúde e convivência familiar, bem como zelar pela proteção da família, conforme disposto nos artigos 226 e 227 da Constituição Federal.
"Apesar de nossa legislação trabalhista não tratar especificamente da redução da jornada de trabalho do empregado público, o caso desta trabalhadora abre um precedente importante e impõe uma interpretação sistemática e analógica para resguardar os cuidados e os direitos da criança portadora de necessidades especiais", explica.
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão"
O relator entendeu que, "embora não haja no ordenamento jurídico pátrio norma que autorize a redução da jornada de trabalho do empregado público, o caso em tablado impõe uma interpretação sistemática e analógica, como forma integrativa do direito, mormente porque a discussão diz com a necessidade de se resguardar o direito da criança portadora de necessidades especiais".
Considerando o dispositivo constitucional citado, o desembargador Durval Cesar de Vasconcelos Maia justificou seu voto afirmando que o Estado-juiz deveria "decidir as causas que envolvam interesses de crianças, sobretudo quando acometidas de doenças graves ou incuráveis, a encontrar soluções criativas capazes de suplantar os vazios legislativos que impedem a fruição de direitos que a lógica, a razão e o bom senso, há muito, decidiram reconhecer como único meio de por em prática o ideal de justiça".