Projeto São Francisco internado na UTI, onde respira por aparelhos

Não há indícios de que será retomado o bombeamento da água para o Canal Norte, que está abandonado. Falta dinheiro para bancar o custo da energia elétrica e para concluir as obras.

Com profundo pesar, esta coluna informa que o Projeto São Francisco de Integração de Bacias – um sonho mais do que centenário dos nordestinos de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará – foi internado na UTI da irresponsabilidade, estado a respirar por aparelhos. 

Os especialistas em obras hídricas não afastam a hipótese de morte cerebral do empreendimento, se algo não for feito com urgência. Mas qualquer coisa que vier a ser feita exigirá dinheiro.

Acontece que, neste momento, o governo federal – que iniciou a execução do projeto em 2007, investindo nele até agora cerca de R$ 10 bilhões – não tem dinheiro para retomar as obras. Para a conclusão das obras, faltam menos de 2%, incluindo os ramais do Apodi e do Salgado, suas últimas etapas.


 
Nas redes sociais, há dezenas de vídeos mostrando a situação em que se encontram partes do Canal Norte, que traz água para o Ceará, para o Oeste da Paraíba e para o Oeste do Rio Grande do Norte. Tudo está abandonado. A Estação Elevatória de Salgueiro (PE), que bombeava água para o açude Castanhão, está fora de operação há meses, não havendo o menor indício de que voltará a operar.

Há várias pedras no caminho do Projeto São Francisco, a principal dos quais é o custo de sua manutenção, máxime em relação às despesas com energia elétrica necessária ao funcionamento das gigantescas motobombas das três Estações Elevatórias do Canal Norte. 

Esse custo anual estava, no começo de 2022, estimado em R$ 300 milhões. Até outubro do ano passado, esse dispêndio vinha sendo sustentado pelo então Ministério do Desenvolvimento Regional, que mudou de nome, passando a chamar-se Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional, mas mantendo a sigla MDR.
 
Pois bem, o MDR não tem hoje dinheiro, no seu orçamento, para continuar mantendo esse alto encargo. Deve ser lembrado que a Chesf, que fornece a energia elétrica, não é mais uma empresa pública: em junho de 2022, ela foi privatizada junto com o Grupo Eletrobras por R$ 100 bilhões em leilão realizado na Bolsa de Valores B3. 

Os governadores de PE, PB, RN e CE e, também, os empresários da indústria e da agropecuária desses estados estão muito preocupados com o que poderá acontecer, se o fenômeno El Niño – que causa seca no Nordeste e inundações no Sul – voltar no final deste ano e prolongando-se por 2024, como acenam alguns institutos de monitoramento do clima. 

No Ceará, as chuvas deste 2023, infelizmente, não foram ainda suficientes para recarregar o açude Castanhão até o nível de 30%, algo como 2 bilhões de m³, suficiente para garantir água ao abastecimento humano, à dessedentação animal e às atividades econômicas na região do Baixo Jaguaribe. 

O Projeto São Francisco, se estivesse em operação, garantiria o abastecimento da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF).

Como essa operação está suspensa por tempo indeterminado até agora, surge a pergunta: como ficará o abastecimento da RMF e, também, do Complexo Industrial e Portuário do Pecém, onde está prevista a implantação do Hub do Hidrogênio Verde?

Para as indústrias do Pecém e as do futuro Hub do H2V, a Cagece acena com um projeto que promete a construção de uma adutora para levar até lá a água de sua Estação de Tratamento de Esgotos (ETE) da Avenida Leste-Oeste. Mas deve ser dito que o bom funcionamento dessa ETE dependehoje e dependerá amanhã  da regular oferta de água de sua rede de açudes localizados na RMF e, também, do Castanhão.

Resumindo: está na hora de as lideranças empresariais da indústria e da agropecuária do Ceará juntarem-se às do governo estadual que, por sorte e por decisão popular, estão abrigadas sob o pálio do mesmo partido – o PT – do presidente da República, tornando mais fácil o encaminhamento da solução desse grave e crescente problema.
 
Com certeza, desse mesmo esforço participarão os empresários de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, que, igualmente, são aliados do governo federal.