Elmano e líderes do agro cearense celebram casamento, mas ouvindo verdades

O governador bateu duro em empreiteiro que, ganhando uma licitação e sabendo que não terá condição de executar a obra, pede um aditamento para aumentar o preço do contrato

No princípio, era a desconfiança, mas esta transformou-se em namoro, que virou noivado. 

Ontem, no que parece ter sido uma cerimônia de casamento, o governador Elmano de Freitas e 30 empresários da agropecuária do Ceará, com os quais se reuniu, trocaram juras de amor eterno. 

Elmano usou de toda sua franqueza e foi logo dizendo que tem laços antigos com o MST, mas, ato contínuo, disse que quer reunir-se pelo menos mais duas vezes, neste ano, com as lideranças do agro cearense, que lhe deram, como resposta, fortes aplausos.

Saudado pelo empresário Jorge Parente, sócio e membro do Conselho de Administração da Alvoar (antiga Betânia Lácteos), o governador ficou sabendo que o grupo que o recebia reúne-se há 16 anos, semanalmente, sem ata e sem lista de presença. 

Elmano de Freitas iniciou sua fala, afirmando que há “uma mudança tecnológica no campo, em todos os setores da atividade agropecuária”. Diante desse “cenário novo”, o governador sugeriu que o estado e o setor produtivo construam “soluções dialogadas” para que as cadeias produtivas possam avançar muito mais do que já avançaram, beneficiando não só o grande produtor, mas também o pequeno. 

De acordo com o governador Elmano de Freitas, “a agricultura de subsistência está condenada ao fracasso”, razão pela qual o pequeno produtor rural – que tem extraordinária capacidade de trabalho – precisa de ser capacitado para ganhar uma visão de negócio, e para isto seu governo investirá na transmissão do conhecimento por meio da assistência técnica.

Dirigindo-se aos pecuaristas e laticinistas presentes, ele alertou para a importação de leite estrangeiro, algo que já causa graves prejuízos à pecuária nacional, incluindo a cearense, revelando que já debateu sobre o assunto com o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante. 

O governador disse que quer simplificar a legislação ambiental, já tendo adotado providências importantes neste sentido, como o envio ao Poder Legislativo de um projeto-de-lei que reduz as exigências e os limites para empreendimentos da carcinicultura.

Elmano de Freitas lamentou, porém, que as universidades cearenses contribuam muito pouco, com suas pesquisas, para o crescimento do setor produtivo, e revelou seu desejo no sentido de que a Embrapa instale no Ceará uma unidade capaz de melhorar mais ainda a qualidade do rebanho bovino leiteiro cearense. 

Ele disse que seu plano para a economia rural cearense tem o objetivo não só de fazer crescer a agricultura empresarial, mas igualmente a agricultura familiar, porque quer ver “os pequenos tornarem-se ricos, também”.  Mas salientou que, antes disso, será preciso mudar a cabeça do pequeno produtor, “que quer fazer cinco coisas diferentes ao mesmo tempo, e isto não pode”.

E aproveitou para ampliar sua crítica “aos nossos assistentes técnicos, que fazem várias coisas, mas não sabem fazer contas”, isto é, desconhecem os custos de produzir.

Anunciou que, nos primeiros dias de agosto, quando terminar o recesso parlamentar, encaminhará ao Legislativo Estadual um projeto-de-lei criando uma Agência de Fomento, que, entre outros objetivos, incentivará a criação de cooperativas de crédito. “Uma parte da atividade dessa agência será voltada para o setor rural”, informou.

E anunciou que, na próxima quinta-feira, 27, o ministro da Pesca, André de Paula, estará em Fortaleza. 
  
No final de sua fala, o governador, referindo-se à pulverização aérea de áreas agrícolas do Ceará, disse que o bom senso e a legislação não permitem mais que se pulverizem plantações usando a mão de obra humana, nem a aviação agrícola, que dispersa a calda e atinge espaços muito distantes do cultivo.

E argumentou, usando outras palavras: 

“Um dia, e muito brevemente, estaremos livres dos defensivos químicos, mas enquanto esse dia não chega, temos de buscar uma solução negociada para garantir a produção de alimentos para a nossa população”.

E, abordando a questão da comercialização do leite, disse que a produção e o beneficiamento de laticínios não perderão competitividade, sinalizando que seu governo dará ao setor o mesmo tratamento tributário concedido pelo estado da Bahia, onde a Alvoar (ex-Betânia Lácteos) tem duas fábricas.

Em seguida, o governador ouviu algumas lideranças da agropecuária cearense. O primeiro a falar foi o presidente da Faec, Amílcar Silveira, que lembrou da desconfiança que ele e sua entidade tinham em relação à gestão de Elmano de Freitas. 

Silveira disse com outras palavras: 

“Estamos muito satisfeitos com o senhor. Todos os seus secretários têm nos atendido prontamente. E o foco da Faec são os pequenos, como o senhor deseja. Posso dizer que 78% dos produtores atendidos pelo Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural) são pequenos produtores”.

O presidente da Faec parabenizou o governador pela escolha do deputado Salmito Filho para a Secretaria do Desenvolvimento Econômico e disse que a escolha do argônomo Sílvio Carlos Ribeiro para a Secretaria Executiva do Agronegócio “foi por unanimidade de todo o universo da agropecuária”.

Em nome da indústria de laticínios, José Antunes Mota fez um pedido: a instalação, em Fortaleza ou no interior do estado, de um Laboratório de Análise. Hoje, os industriais são obrigados a enviar para São Paulo amostras de seus produtos para a análise laboratorial, pagando por isto, e por cada vez, R$ 5 mil. Antunes revelou que a Fiec, por meio do Senai, está interessado na instalação desse laboratório, que exigirá um investimento de mais de R$ 10 milhões.

Cristiano Maia, que falou pela carcinicultura e pela infraestrutura, solicitou que seja duplicado o viaduto do IV Anel Viário sobre a BR-116, cujas alças de acesso vivem em constante congestionamento. Também sugeriu a atualização da tabela da Superintendência de Obras Públicas (SOP) e, ainda, a desburocratização dos processos de licenciamento ambiental dos produtores de camarão.

João Teixeira, a quem coube falar sobre os recursos hídricos, disse ao governador que, para o Estado do Ceará, o Projeto São Francisco de Integração de Bacias não terá qualquer serventia sem a construção do Ramal do Salgado, cuja licitação está mourejando há vários meses no Tribunal de Contas da União. A questão é que a Queiroz Galvão, que ganhou a licitação para a construção da obra, quer agora incluir um aditivo, contra o que a concorrente Galvão Engenharia, empresa segunda colocada, já se ergueu.

Luís Eugênio Pontes, que abordou o projeto da Usina de Fosfato de Itataia, declarou-se surpreso com as manifestações de movimentos sociais contra o empreendimento. Eugênio disse que se trata de um investimento de R$ 2,3 bilhões que multiplicará por 10 o PIB da região de Santa Quitéria, em cuja geografia municipal será localizado o projeto.

Também falaram Luís Girão, fundador da Betânia Lácteos, para quem “a agropecuária crescerá no governo Elmano”; Luís Roberto Barcelos, sócio da Agrícola Famosa, que elogiou a disposição do governador de debater com as lideranças do agronegócio e transmitiu informações sobre sua empresa, que dá emprego direto a 8 mil pessoas na região de Icapuí; e Carlos Prado, fundador da Itaueira e da Cemag.

Prado disse que o futuro do Ceará é incalculável, citando o projeto do Hub do Hidrogênio Verde no Pecém, a dessalinização da água do mar, a geração de energias renováveis e até a retomada da cotonicultura, o que é feito pela “ousadia de Raimundo Delfino, que está usando a mais moderna tecnologia e os mais modernos equipamentos para a plantação e a colheita do algodão na Chapada do Apodi”.

Retomando a palavra, Elmano de Freitas respondeu a cada um dos que falaram. Quando chegou a vez de dar resposta sobre a atualização dos preços da SOP disse, com outras palavras, dirigindo-se ao seu amigo Cristiano Maia:

“Cristiano, neste particular relativo à tabela de preços da SOP, temos, primeiro, que eliminar determinado tipo de empreiteiro que, tendo ganhado uma licitação e sabendo que não terá condição técnica ou financeira de executá-la como está no contrato, cuida de pedir um aditamento para aumentar o preço da obra. Isto não pode ser e nem vai ser”. 

Elmano ganhou aplausos, inclusive de Cristiano Maia.