Criar tilápia no Castanhão com pouca água é atividade ilegal

O maior reservatório do Ceará não tem água em volume suficiente para suportar a criação intensiva de tilápia em gaiolas. Ambientalmente, é um crime. Mas não há fiscalização

Uma atividade que vinha crescendo no Ceará era a tilapicultura, ou seja, a criação intensiva de tilápia, o peixe mais consumido pela população nordestina. 

Produzida em água doce, a tilápia – um híbrido surgido do processo de hipofisação desenvolvido pelos cientistas da Divisão de Ictiologia do hoje agonizante Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) – perdeu, por causa da seca, o seu maior habitat na geografia cearense: o espalho d’água do açude Castanhão. 

Quando esse reservatório encheu e verteu em 2004, com um volume de 6,5 bilhões de m³ de água, a tilapicultura do Ceará quintuplicou sua produção. Instalaram-se dentro do açude Castanhão – e, também do Orós, com 2,2 bilhões de m³ – centenas de gaiolas nas quais entrava o alevino e saía, três meses depois, um peixe pesando, em média, 1,6 kg de carne de excelente qualidade e alto poder proteico. 

Com a redução da pluviometria no Nordeste – no Ceará, mais ainda – o volume de água acumulado pelo Castanhão está agora abaixo de 30%, volume insuficiente para a produção de tilápia em escala, isto é, em quantidade capaz de atender à demanda estadual, que só cresce. E no modo ambientalmente legal. 

Neste momento, sem a fiscalização de quem deveria fiscalizar, ainda há recalcitrantes tilapicultores que insistem em manter sua atividade no Castanhão, algo que está ambientalmente ilegal e sujeito ao castigo da Lei – se, repita-se, houvesse fiscalização.
 
Um empresário, que já produziu tilápia em gaiolas no Castanhão, disse à coluna que essa atividade, nas atuais circunstâncias, “pra começo de conversa, já deveria ter sido proibida, uma vez que, por falta de oxigenação da água, daqui a pouco vai aparecer peixe morto lá, e aí teremos um lamentável crime ambiental”. 

Grande parte da tilápia hoje consumida pelo cearense está vindo da Bahia, de Minas Gerais e até do Paraná. Antigos criadores cearenses migraram para o Piauí, instalando-se às margens do rio Parnaíba, que corre o ano inteiro, onde seguem desenvolvendo sua atividade. “Mas eles retornarão para cá, tão logo o Castanhão volte a ficar cheio de novo”, aposta o empresário. 

No Ceará – acrescenta a mesma fonte – a criação de tilápia, nos moldes da que exista em 2004 e nos anos seguintes, só retornará se, e quando, voltarem as boas estações de chuvas, como a daquele ano, que fez transbordar todos os grandes reservatórios da região nordestina, inclusive a barragem de Sobradinho, que chegou a verter o equivalente a 15 mil m³/s, maior volume já despejado no oceano, em sua foz entre Sergipe e Alagoas. 

Em 2004, foi a primeira e, até agora, a última vez que o Castanhão verteu (sangrou, no cearensês). E o Orós, idem.