Está no 8º Relatório de Subsídios Tributários, Financeiros e Creditícios do Ministério do Planejamento uma informação que revela o tamanho da renúncia fiscal do governo da União: no ano passado de 2023, ela chegou a incríveis 4,78% do PIB. Em 2003, ou seja, havia 20 anos, esse percentual era de 1,96% do PIB.
Para que o leitor entenda o tamanho dessa renúncia, basta dizer que, no exercício de 2023, ela representou uma montanha de dinheiro do tamanho de R$ 519 bilhões, o suficiente não apenas para zerar o déficit atual das contas públicas, mas para a obtenção de um robusto superávit primário.
Mas aí surge o aviso do deputado Mauro Benevides Filho, doutor em economia pela Universidade de Vanderbilt, de Nashville, no Teenessee (EUA), que, falando na quinta-feira passada para 80 empresários e advogados tributaristas reunidos pelo Lide-Ceará, advertiu: “Nunca, nunca, haverá um superávit primário capaz de pagar os juros da dívida pública, que hoje representam R$ 836 bilhões por ano.”
A dívida pública brasileira é um Evereste de R$ 7,2 trilhões. TRILHÕES!
Comecemos pelas renúncias fiscais, que, se deixarem de existir, injetarão na receita da União R$ 519 bilhões. Para revisá-las no sentido de reduzi-las, o Poder Executivo terá de confrontar o Legislativo bicameral, em cujas duas casas trabalham, em tempo integral, poderosos grupos de interesse e de pressão junto a deputados e senadores.
Exemplo: qualquer tentativa de pelo menos diminuir o percentual dos incentivos fiscais concedidos pela União à Zona Franca de Manaus será o mesmo que declarar guerra não só à bancada dos estados da Amazônia, mas a toda a indústria eletroeletrônica, que há quase 50 anos goza desses benefícios tributários.
Agora, imagine uma iniciativa do Palácio do Planalto na direção da extinção ou mesmo da redução do cardápio de incentivos fiscais que são concedidos, também há quase meio século, aos estados da região Nordeste. Significaria um tsunâmi de protestos, aos quais adeririam, imediatamente, os governos de Minas Gerais e do Espírito, ambos do Sudeste, cujos municípios de suas regiões Norte são beneficiários dos mesmos benefícios dados à região Nordeste. Qualquer tentativa nesse sentido colidirá contra o muro de concreto dos interesses regionais, mesmo porque o governo do presidente Lula não tem maioria no Parlamento.
Para aprovar qualquer Projeto de Lei ou Medida Provisória, o governo tem de negociar com as bancadas que o apoiam, e isto custa muito caro ao Tesouro Nacional.
Mas o problema existe e agora foi escancarado pela informação oficial sobre as renúncias fiscais. No mesmo relatório citado na abertura deste texto, há, também, outra notícia importante: em 2003, havia 23 benefícios fiscais concedidos pela União a diferentes setores da atividade econômica. No ano passado de 2023, o número desses benefícios foi catapultado para 60. Eis aí uma das causas do déficit das contas públicas, que vem desde 2014 (em 2022, houve um superávit).
Mas, segundo o deputado Mauro Benevides Filho, o que deve preocupar o governo, sua equipe econômica, deputados, senadores, governadores e empresários da indústria, da agropecuária, do comércio e do serviço são duas contas que se agravam a cada ano: a da Previdência e a do serviço da dívida.
De acordo com o Balanço Gral da União de 2023, o gasto do governo com o pagamento dos benefícios previdenciários fechará este exercício de 2024 com um rombo de R$ 326, 2 bilhões, ou seja, 2,5% do PIB.
“A soma do déficit da Previdência com o pagamento dos juros da dívida passa de R$ 1 trilhão. Reparem que a União, anualmente, está transferindo para o sistema financeiro R$ 836 bilhões só de juros da dívida, e esta segue crescendo. Atenção, senhores, para o que direi agora: nunca, nunca, haverá superávit primário capaz de garantir o pagamento dos juros da dívida pública” – foi o que o deputado Mauro Filho disse aos empresários e advogados tributaristas para os quais falou na última quinta-feira a convite do Lide-Ceará.
Mauro Filho não disse, mas deixou no ar a semente da desconfiança de que, por trás da trilionária dívida pública brasileira, há razões que a própria razão desconhece.