Uma música para Margarida

De livro biográfico a um encontro com o ídolo Seu Jorge, uma família se debruça em homenagear uma matriarca de 92 anos que se recusa a parar de sonhar

Margarida Maria Alacoque Correia dos Santos chegou ao mundo de surpresa. Quando a mãe dela começou a sentir as dores do parto, chamou uma parteira na cidade de Aurora para lhe ajudar a parir. Veio um menino, Geraldo, que foi celebrado pela família. Mas o tempo passava, a mãe dela sentia uma febre que não passava e, de repente, a parteira apara uma menina mais de 24 horas depois do primeiro bebê.

Margarida nasceu arroxeada, mas também determinada. O irmão gêmeo não sobreviveu, e ela transformou toda a dor em atitude nas muitas décadas que viveria desde então. De Aurora, mudou com a família para o Crato e, em seguida, refez a rota comum de muitos jovens do interior e foi estudar na capital Fortaleza. Foi lá que conheceu o marido, com quem se mudou para São Paulo, antes de retornar ao Ceará e fincar raízes na cidade de Maracanaú. Lá, trabalhou décadas como educadora.

Toda essa história está sendo escrita em um livro, um desejo dos familiares para eternizar a sua trajetória.

Margarida teve quatro filhos, um deles vítima fatal de um assalto aos 33 anos. Um final trágico como o do marido, também assassinado. Ela trincou os dentes, pegou força de onde não sabia que tinha e ficou com as três mulheres.

Aprendeu a conduzir e administrar uma casa sozinha, enquanto dava aulas. Mas não deixou de se envolver no movimento municipalista de Maracanaú. "Na minha família, praticamente só tem mulher. Todas com personalidade forte de guerreiras. Todas são líderes", diz uma das filhas, Micheline.

Mulher de atitude, Margarida nunca aceitou menos do que correr em busca de seus sonhos. Neste mês, completa 92 anos e até bem pouco tempo seguia completamente dona de si, fazendo compras nos supermercados e dando aulas de culinária. Até ser diagnosticada há um ano com uma cardiopatia grave, um caso cirúrgico que os médicos decidiram não levar adiante pelos altos riscos por conta da idade. Precisou desacelerar.

Enquanto é tratada com medicamentos, Margarida segue os dias com a vontade de viver que acompanhou toda a sua trajetória. Amante de surpresas desde que nasceu, viu a família inteira se empenhar em realizar quantas mais forem possíveis enquanto ela viver. 

Um dia, ouvindo pela milésima vez a música "Felicidade", do cantor Seu Jorge, disse: "Essa música foi feita pra mim. É como vejo a vida". E desde então a família se empenhou numa verdadeira saga para que Margarida realizasse o sonho de conhecê-lo. "Ela gosta muito de cantar e conversar. E como essa música, ela se vê feliz, apesar de todas as dificuldades", conta Micheline.

E o que era difícil se fez em pleno mês de junho, quando o cantor foi fazer um show no São João de Maracanaú. Os familiares fizeram uma camisa com uma margarida. Ao redor da flor, um trecho da música. Gravaram um vídeo cantando para a matriarca e a levaram ao hotel onde o cantor estava. Pouco antes do show, ele a recebeu no saguão. Conversaram, fizeram fotos. Margarida, aos 92 anos, não está disposta a deixar de lado seus sonhos. O próximo é conhecer um ídolo ainda mais antigo: Roberto Carlos. Salve, Margarida!