Nas telenovelas e nos filmes, os protagonistas são componentes corriqueiros nos roteiros e nas tramas. Por eles e elas nos apaixonamos; nos identificamos e até nos espelhamos. São figuras centrais das histórias e que, geralmente, ao final encontram respostas para os mais duros dilemas da vida. Na urbanidade real, da mesma forma, há protagonistas, não os atores e as atrizes das telonas, mas agentes sociais, ou melhor, pessoas ou coletivos que partem de princípios e objetivam produzir mudanças na realidade urbano-social na qual estão envolvidos.
Aqui, abramos um parêntese. O protagonismo não se assemelha ao heroísmo performático, pois se no segundo caso o indivíduo vira símbolo, representação do que é bom; no primeiro, são as causas e suas ações os elementos mais importantes. A essência é: os indivíduos passam, as bandeiras permanecem.
Tenho usado muito teclado de computador para retratar agruras e problemas persistentes em nossas cidades. Infelizmente, ainda há muito a relatar. Por outro lado, não devemos esquecer dos numerosos protagonistas urbanos espalhados pelos quadrantes da cidade, apoiados por suas justas e diferentes causas, trabalham para suplantar problemas sociais característicos das cidades brasileiras.
No Conjunto Palmeiras, na periferia sul da cidade, bairro a registrar um dos mais baixos índices de desenvolvimento humano, anos se passam e o Banco Palmas permanece símbolo e modelo de ativismo social cujas ações apontam para mudanças sociais e se fundamentam na economia circular, na solidariedade e nos dispositivos comunitários a fim de superar as desigualdades socioeconômicas conhecidas por todos.
No Grande Bom Jardim, uma das áreas mais populosas e carentes de Fortaleza, a Rede de Desenvolvimento Sustentável do Grande Bom Jardim (DLIS) representa um conjunto de protagonistas, posto reunir outros tantos coletivos e associações. Muitos já são seus feitos (leia a coluna O planejamento popular e a construção de uma cidade melhor), sobremaneira, na orquestração de planos e metas para o desenvolvimento urbano comunitário.
A Rede DLIS manifesta uma outra grande potência, pois é capaz de associar-se às instituições científicas e promover pesquisas simultaneamente a intervenções sociais. Para quem não acompanhou, este Diário produziu matéria sobre a organização de cozinhas comunitárias e a produção de mapeamento das condições relativas à insegurança alimentar no bairro.
No Grande Mucuripe, próximo às áreas mais badaladas do mercado imobiliário, é árdua a luta daqueles intencionados em valorizar a memória e o patrimônio (material e imaterial) das comunidades. É destacada a importância da gente simples, humilde e trabalhadora que ajuda cotidianamente a construir a cidade.
Ao visibilizar a história dos trabalhadores e trabalhadoras, o lugar de moradia é transformado em território insubstituível e representação latente do protagonismo urbano. Um dos maiores emblemas é o Velho Farol do Serviluz cuja requalificação é medida almejada e simboliza um marco para alcançar todos outros objetivos.
Provavelmente, desconheço muitos outros casos de protagonismo urbano. Eles são inspiradores, pois atualizam nossas esperanças e põem em prática um modelo de cidadania ativa. Tal ativismo reafirma a necessidade de revisarmos o padrão de governança urbana, principalmente, no que concerne a relação sociedade e Estado.
Para concluir, um adendo é necessário. Os protagonistas urbanos não substituem o papel do Estado. Esse tem suas obrigações constitucionais e deve aprimorá-las na direção da justiça social e da democracia. Aí sim entra um importante papel dos protagonistas urbanos, qual seja: apontar os problemas, indicar as possibilidades, fazer valer o interesse coletivo e cobrar das instituições republicanas ações no sentido de conduzir uma urbanização social e ambientalmente melhor do que constatamos hoje.