Reforma Tributária deixará conta de energia da população de baixa renda mais cara? Entenda

Isenção fiscal praticada pelos estados não existirá mais após a unificação dos impostos, ameaçando o benefício para essa população

Se não houver uma lei complementar para compensar mudança prevista na Reforma Tributária, o custo da conta de luz das famílias de baixa renda aumentará. Isso poderá ocorrer porque, atualmente, essa população possui isenção ou alíquota reduzida do ICMS, a depender do estado. No entanto, pelas novas regras, esse tributo estadual deixará de existir. 

No Ceará, 1,1 milhão de famílias podem ser impactadas, segundo a Associação Brasileiras de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee). Para esclarecer esse assunto complexo ao leitor, o Diário do Nordeste elaborou um tira-dúvidas. Leia abaixo. 

O programa Tarifa Social vai acabar?

Não. O presidente da Comissão de Direito Tributário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-CE), Hamilton Sobreira, explica que a Tarifa Social — programa de descontos de 10% a 100% para consumidores de baixa renda — é uma política de preço público e sua manutenção não cabe à Reforma Tributária. 

Além disso, o Ministério de Minas e Energia (MME) garante que o benefício será mantido, independentemente das novas regras fiscais.

“O MME estuda propostas legislativas para reformular o programa com o objetivo de melhor assistir os seus beneficiários”, afirma.  

No Brasil, 15 milhões de famílias estão enquadradas no Tarifa Social, sendo 1, 1 milhão delas no Ceará, segundo a Abradee. 

Então, por que a conta de luz pode ficar mais cara para a população de baixa renda?

Atualmente, as pessoas assistidas pelo Tarifa Social também recebem a fatura sem a taxa do ICMS, como ocorre no Ceará. Em alguns estados, porém, essa cobrança é apenas reduzida. Portanto, há um alívio tributário vigente para essa população no atual modelo fiscal. 

Mas, conforme explica Sobreira, a Reforma Tributária vai unificar os impostos federais, estaduais e municipais em apenas duas taxas. Ou seja, "o ICMS deixará de existir com a aglutinação de cinco tributos". "Se houver isenção deverá ser por meio de uma lei complementar”, esclarece. 

No texto da Reforma, as cinco cobranças sobre bens e serviços (Cofins, IPI, PIS, ICMS e ISS) serão substituídas por duas: um federal (CBS - Contribuição sobre Bens e Serviços, no lugar de Cofins, IPI e Pis) e uma dividida entre estados e municípios (IBS - Imposto sobre Bens e Serviços, no lugar de ICMS e ISS). Ambas foram batizadas de Impostos sobre Valor Agregado (IVAs).

Resumindo: após a implantação do tributo unificado, consumidores de baixa renda, que hoje têm isenção ou alíquotas reduzidas do ICMS, pagarão o percentual total do novo imposto. Contudo, isso só ocorrerá se não houver uma lei complementar para manter essa política social. 

Quanto a conta de luz poderá ficar mais cara para a população de baixa renda?

Segundo o diretor institucional e jurídico da Abradee, Wagner Ferreira, o acréscimo do imposto pode variar de 25% a 28%. Ou seja, a fatura da população desonerada virá com essa tarifa embutida, como é para as demais faixas de renda.

“A nova Reforma padroniza a tributação e não faz distinção da Tarifa Social. Se nenhum sinal for dado para um tratamento específico para esse consumidor, virá a tributação cheia, com a alíquota a ser estabelecida”, aponta. 

Os percentuais dos IVAs ainda serão definidos. 

O que o governo diz sobre isso?

O Ministério da Fazenda informou apenas considerar "que a melhor forma de equacionar a questão da tarifa social de energia é através do cashback". O cashback é uma proposta de devolução de parte do imposto pago para famílias de menor poder aquisitivo.  

Quando a conta de luz poderá ficar mais cara para a população de baixa renda?

As mudanças previstas na Reforma Tributária passarão por um período de transição, a começar em 2026. A previsão é que o novo sistema tributário esteja plenamente implementado em 2033.

É importante frisar que muitos pontos precisarão de regulamentação posterior, também por meio leis complementares, como a própria definição das alíquotas dos dois novos impostos e o cashback 

Qual seria o impacto da retirada da isenção para o Ceará?

No Estado, 1,1 milhão de famílias de baixa renda estão enquadradas no programa Tarifa Social, totalizando 36% de todos os consumidores, segundo a Abradee.

Pela lei estadual, pessoas em situação de vulnerabilidade econômica com consumo até 140 kWh estão isentas do ICMS cobrado na conta de luz.

Dúvidas frequentes

O que é a Reforma Tributária?

A Reforma Tributária foi proposta com o objetivo de simplicar a cobrança dos impostos. Desde 1960, diversos governos tentaram reformar o sistema tributário brasileiro. Em 7 de julho de 2023, o texto foi aprovado pela Câmara dos Deputados. Em 20 de dezembro do mesmo ano, foi promulgada pelo Congresso.

O que muda com a Reforma Tributária?

A Reforma Tributária vai unificar três impostos federais (IPI, PIS e Cofins), um estadual (ICMS) e um municipal (ISS) em dois tributos diferentes: CBS (competência da União) e IBS (de estados e municípios).

Quando as mudanças entram em vigor?

O novo modelo passará por uma transição para adaptação. Ele estará plenamente implementado, para todos os tributos, a partir de 2033. As mudanças se iniciam em 2026.

Como será feita a cobrança desses impostos?

Haverá um período de transição: IVA federal terá alíquota de 0,9% e o IVA estadual e municipal, de 0,1%.

O que é a Cesta Básica Nacional de Alimentos?

A Reforma aprovada cria a Cesta Básica Nacional de Alimentos. As alíquotas para os impostos federal, estadual e municipal sobre esses alimentos serão reduzidas a zero para os produtos da cesta. Caberá uma lei complementar para definir quais produtos farão parte da cesta básica.

O que é o cashback?

Será criado um sistema de cashback para as famílias de menor renda. O objetivo da medida é reduzir desigualdades de renda com a devolução de impostos para um público determinado.