Todos os anos, costumeiramente entre março e maio, os contribuintes devem fazer a entrega da Declaração do Imposto de Renda da Pessoa Física (DIRPF). Informar rendimentos, aplicações financeiras e comprovar despesas médicas ou escolares pode ser feito em poucos cliques, no computador ou até mesmo pelo celular.
Há algumas décadas, entretanto, era necessário preencher formulários em papel e entregar o documento em repartições do Ministério da Fazenda ou bancos públicos. A primeira declaração de rendimentos do Imposto de Renda foi apresentada pelo Governo Federal há 100 anos, em fevereiro de 1924.
O formulário era dividido em dois tipos, um voltado para rendimentos de trabalho com comércio ou indústria, e outro para capitais e valores imobiliários, profissões não comerciais e subsídios, bonificações e remunerações.
Ao longo de um século, a declaração foi atualizada diversas vezes e adaptada para acompanhar a transformação digital. A evolução fez com que o modelo adotado no Brasil seja um dos mais avançados do mundo, segundo Adalberto Vitor dos Nascimento, vice-presidente de Ações Institucionais do Conselho Regional de Contabilidade do Ceará (CRC-CE).
“O modelo que nós temos aqui, para o nível de dificuldade que temos que enfrentar, é um dos mais avançados. A entrega da declaração é feita de uma forma um tanto quanto facilitada, para a quantidade de situações que existem no País. Estamos bem à frente de vários países, em especial os latino-americanos”, explica o contador.
Adalberto aponta que, para a maioria dos contribuintes, grande parte das informações já aparecem automaticamente no sistema e precisam apenas ser confirmadas pelos cidadãos. Com a facilitação do processo, os contribuintes estão cada vez mais conscientes dos pormenores da declaração.
O contador aponta que o sistema digital tem se tornado mais intuitivo, sem complexidade de uso para o público com pouco costume e acessar meios digitais. “O que a gente recomenda é que, independente da idade, a pessoa possa realizar a análise e a entrega da declaração contando com a colaboração do profissional que entenda do processo”, explica.
O auditor-fiscal da Receita Federal Marcondes Fortaleza reitera que o Brasil está na vanguarda tecnológica do preenchimento e entrega da DIRPF. Ele ressalta que, desde a sua criação, o portal e-CAC (destinado para a declaração) passa por atualizações anualmente.
“O Brasil partiu na frente na questão da automação, do preenchimento, comparando internacionalmente. Com a internet, a partir de 1997, foi um grande salto. Antes era um formulário em papel, depois evoluiu para entregar por disquete, que já era um meio eletrônico, em 1991”, aponta.
O auditor ressalta que, apenas seis anos após ser lançada, a entrega da declaração por disquete superou o uso do formulário físico. O documento em papel foi extinto em 2011, após 87 anos de sua instituição. A principal dificuldade da modalidade era a demora para preenchimento e processamento, segundo o auditor-fiscal.
O contribuinte tinha que preencher com aquela máquina de datilografia e eram muitos erros. E o processamento era de certa forma manual também. Com o sistema eletrônico, o sistema já faz críticas na hora do envio e já evita uma série de erros. Tem um tratamento de dados que facilita muito
Do papel à ligação telefônica: a evolução do Imposto de Renda
O Imposto de renda no Brasil foi instituído em 31 dezembro de 1922, mas não foi implementado de imediato devido à complexidade. O primeiro modelo de declaração de pessoa física foi encaminhado pelo Ministro da Fazenda dois anos depois.
Em papel, os contribuintes deveriam declarar rendimentos e deduções do ano anterior em um dos formulários instituídos, a depender do tipo de rendimento. Esse primeiro modelo sofreu modificações em 1926 e foi unificado.
O número de informações solicitadas aos contribuintes cresceu com o tempo, sendo necessária a mudança do layout da declaração e o acréscimo de anexos. Para instruir os contribuintes, o Departamento do Imposto de Renda lançou, em 1965, um guia prático para habilitar o cidadão a preencher sozinho a declaração.
Os principais sinais de digitalização surgiram em 1968, ano em que a declaração foi processada eletronicamente pela primeira vez pelo Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro). Os contribuintes, entretanto, ainda realizavam a declaração em papel.
No mesmo ano, foi criada a Secretaria da Receita Federal, instituída órgão central de direção superior da administração tributária da União. Foi a primeira vez também que a declaração ganhou cores.
Em 1977, a quantidade de informações exigidas dos contribuintes cresceu ainda mais e o número de anexos da declaração chegou a sete. A necessidade de facilitar o processo começou a ser sanada em 1991, quando a Receita lançou a segunda forma de entrega: o meio magnético. Contribuintes com computador poderiam instalar um programa para preencher a declaração e entregá-la em um disquete.
O programa foi adaptado para o sistema operacional Windows em 1996 e, apenas um ano depois, mais da metade dos declarantes já utilizava meio eletrônico para preencher a declaração.
O principal avanço ocorreu também em 1997, quando se tornou possível declarar o Imposto de Renda pela internet. Não era mais necessário se deslocar a um banco autorizado ou sede da Receita Federal; o contribuinte precisava apenas acessar o 'Receitanet'.
Outra possibilidade apresentada pela Receita foi o de realizar a declaração por telefone, método que ficou disponível de 1999 a 2005. O último grande avanço ocorreu em 2013, quando o sistema de declaração chegou a tablets e aparelhos celulares. O aplicativo da Receita Federal viabilizou fazer a declaração na palma da mão.
Processo cada vez mais rápido
A revolução da forma de declarar o Imposto de Renda trouxe facilidade para os contribuintes e também simplificou o processamento dos dados. O auditor fiscal Marcondes Fortaleza ressalta que o número de declarantes cresceu de forma considerável após a digitalização.
No exercício de 2002, ano-calendário de 2001, foram recebidas mais de 16 milhões de declarações de ajuste anual do imposto de renda pessoa física, um recorde até então. Já em 2023, esse número ultrapassou 41 milhões, recorde consecutivo absoluto.
O ganho de escala viabilizou o fim da prorrogação dos prazos e uma brevidade da restituição, explica Marcondes. No primeiro ano de declaração, por exemplo, foi instituído o prazo de 1º de abril para os contribuintes entregarem a declaração, mas devido à complexidade de um processo novo, foi adiado até 14 de novembro. Posteriormente, foi postergado de novo até 14 de março de 2025.
As prorrogações eram constantes até os anos 1990 e, em 2002, a Receita Federal comemorou sete anos sem prorrogar o prazo de entrega da declaração. O adiamento voltou a ocorrer em 2021, devido às dificuldades impostas pela pandemia de Covid-19.
Neste ano, os contribuintes devem declarar o imposto de renda entre 15 de março e 31 de maio. O período é de dois meses e meio, o mesmo instituído no ano passado. Caso o envio do documento não seja feito dentro do prazo, o contribuinte poderá ser multado.
Mesmo com a facilidade, o contador Adalberto Vitor dos Nascimento recomenda redobrar a atenção nas informações exigidas pelo fisco. Também é importante se certificar em relação aos critérios para isenção de declaração. “É necessário perceber que existe uma grande diferença entre pagar Imposto de Renda e estar isento de enviar a declaração do Imposto de Renda. O imposto sobre o rendimento é apenas um dos itens. Existem outros pontos, como movimentação no mercado financeiro, recebimento de indenização”, explica.