Há exatos 10 anos, uma visita pastoral do então cardeal arcebispo de Fortaleza, dom Aloísio Lorscheider ao Instituto Penal Paulo Sarasate (IPPS), acabou se transformando em cenas de terror e morte. Liderados por Antônio Carlos Barbosa, o “Carioca”, 14 detentos se rebelaram, fizeram dom Aloísio e mais 12 pessoas reféns e horas depois fugiram do presídio. A liberdade a qualquer custo era o principal objetivo, mas os presos reclamavam das condições subumanas da penitenciária. Uma década depois, foram poucas as mudanças relacionadas ao episódio. As duas novidades são a aposentadoria de dom Aloísio e a aposta do Governo na privatização do setor. No mais, o sistema carcerário continua preocupante: superlotação, ociosidade e precariedade na assistência jurídica
Às 9 horas de 15 de março de 1994, dom Aloísio Lorscheider, e cerca de 20 integrantes do movimento de Direitos Humanos, iniciou uma visita pastoral ao IPPS. No auditório, Dom Aloísio foi feito refém e se iniciou uma rebelião. A partir daí, o Arcebispo e mais 13 pessoas ficaram mais de 20 horas em poder dos detentos. Os presos saíram do IPPS às 23h15min num furgão e só liberaram os reféns às 06h00 horas da manhã.
A rebelião começou por volta das 10h45min do dia 15. O então coordenador do Sistema Penal do Estado, Raimundo Brandão, falava quando três presos subiram no palco. Com uma faca, “Carioca” imobilizou Dom Aloísio, e os outros dois dominaram os Bispos Auxiliares, Dom Edmilson Cruz e Dom Geraldo Barbosa (hoje Eméritos), e o então vigário Episcopal de Fortaleza, hoje Bispo de Sobral, Dom Aldo Pagotto. Brandão também foi imobilizado.
Houve troca de tiros, tendo morrido o preso Pedro Cosme Taveira e ficado feridos dois policiais militares, dentre eles, o soldado Demétrio Costa Araújo que foi feito refém. Ficaram feridos também os presos Ivan Carlos Pereira da Silva e João Wilson Guedes Serafim que morreu no IJF.
A negociação iniciou ainda pela manhã com a coordenadora da Pastoral Carcerária, Eunísia Barroso, sendo enviada pelos presos para tentar a abertura dos portões, mas ela não retornou. Depois, enviaram a repórter do Diário do Nordeste, Erilene Firmino, com as exigências, mas ela também não voltou.
Só quando o então governador do Estado, Ciro Gomes, chegou ao IPPS é que as negociações avançaram. Os presos pediam um furgão, 10 rifles e 10 revólveres. No final da noite, o furgão saiu do IPPS com 26 pessoas seguindo para a Ibaretama, onde vivia a família de Roberto Aguiar Muniz, o Betinho Fazendeiro.
A viagem até a Serra, garantem Mário Mamede (na época presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa e atual secretário adjunto de Direitos Humanos) e Raimundo Brandão, foi um dos momentos mais difíceis. A estrada escura, a polícia perseguindo o veículo e Betinho dirigindo a toda velocidade.
Neste momento, garantem os dois ex-reféns, sentiram a morte perto. “Eu pensei que tinha direito a morrer de uma maneira diferente”, diz Mário.
Já Brandão, chegou a ver seu velório no Parque da Paz, quando ainda no IPPS ouviu o aperto de um gatilho atrás de sua cabeça. Uma imagem inesquecível. Principalmente porque, Brandão a relata no livro “O pastor e os doze reféns”.
É nele que conta, por exemplo, que a caçada aos fugitivos levou 10 dias. A “Operação Serra Azul” recapturou 12 fugitivos. Francisco Evandro de Lima Oliveira, o Evandro Baixinho, morreu em troca de tiro com a Polícia e Betinho Fazendeiro foi baleado, morrendo dias depois no IJF.
Erilene Firmino