Diante de casos de ‘fura-fila’, como é o controle e a prestação de contas dos vacinados contra Covid

A quantidade de vacinas disponíveis no Brasil, atualmente, é baixa. Na imunização, há um monitoramento tanto nos municípios como no âmbito federal sobre a fila de prioridade. Mas é nas cidades onde o controle, de fato, pode e deve ser mais rigoroso.

A quantidade  de vacinas contra a Covid disponível, no atual momento, no Brasil, é muito baixa frente à necessidade. Por isso, tem sido preciso escolher quem vai ser imunizado primeiro até mesmo entre aqueles incluídos na fila de prioridade no Plano Nacional de Imunização (PNI). Por exemplo, entre os profissionais da saúde, agora, só quem atua na linha de frente dos atendimentos de Covid deve ser vacinado.

Mas, registros de situações nas quais a fila de prioridade pode ter sido furada têm surgido Brasil afora e também no Ceará. Então, como é feita a prestação de contas das pessoas vacinadas contra Covid? Há um controle de quem vai ser escolhido em cada cidade?

No fluxo da vacinação, o Governo Federal estabelece o Plano de Imunização no qual há a ordem de prioridade para receber o imunizante. Cada estado e cidade também produz esse documento. Nos planos, deve constar exatamente quais grupos da população e quantas pessoas inclusas neles serão imunizadas. Mas, na prática, são os municípios que detêm a autonomia para a aplicação das doses no dia a dia. 

Na pandemia de Covid, foram estabelecidos grupos prioritários que, no atual momento, no Ceará são:

  • Profissionais da saúde - (no momento, somente aqueles da linha de frente contra a Covid);
  • Idosos com mais de 60 anos institucionalizados em abrigos;
  • Pessoas com deficiência acima de 18 anos que estejam em abrigos;
  • População indígena

Esta é a primeira fase da vacinação, e no plano nacional, estadual e nos municipais, também constam, nessa etapa, idosos a partir de 75 anos. Mas, devido à baixa quantidade de doses disponíveis, esse grupo ainda não começou a ser vacinado.

Sistemas registram informações dos vacinados

Pela forma como tem ocorrido, pode-se dizer que no Brasil há um controle, tanto nos municípios como no âmbito federal, das informações sobre as pessoas que recebem a vacina. Esse monitoramento ocorre, sobretudo, porque as prefeituras, por meio das secretarias da saúde, obrigatoriamente têm que registrar os dados dos vacinados em sistemas oficiais do Ministério da Saúde.  

A portaria GM/MS nº 69, de 14 de janeiro de 2021, estabelece que, dentre outros registros, deve constar no sistema de informação: 

  • Nome completo do vacinado
  • CPF
  • Sexo
  • Data de nascimento
  • Nome da mãe
  • Grupo prioritário ao qual pertence
  • Código da vacina
  • Nome da vacina
  • Tipo de dose aplicada
  • Data da vacinação
  • Número do lote da vacina, nome do fabricante
  • CPF do vacinador e;
  • Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) do serviço de vacinação.

Contudo, o controle prévio como, por exemplo, saber sobre a regularidade das listas de pessoas que ainda serão vacinadas, especialmente, daquelas inclusas no rol de profissionais da saúde, no atual momento, não é um processo tão claro e efetivo assim. 

Compete às cidades produzirem a contagem e a escolha dos profissionais que serão imunizados, respeitando rigorosamente os critérios dos planos de vacinação. No entanto, se uma pessoa que supostamente não deveria ser vacinada, nesta etapa, é incluída não há uma instância de inspeção preliminar hoje.

A apuração tem se dado de forma posterior à ocorrência e, no Ceará, tem ficado a cargo dos ministérios públicos - tanto estadual, como federal - que acompanham os procedimentos, e também são provocados por denúncias.    

Em nota, o Ministério da Saúde afirma que “está trabalhando em todas as frentes” para que haja o cumprimento do Plano da Vacinação contra a Covid, e reforça que, apesar da autonomia de estados e municípios na distribuição das vacinas, há a necessidade de seguir as orientações coordenadas pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI). 

Além disso, o órgão informou que terça-feira (19), alertou o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass) e Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasem) “que é imprescindível que todas as unidades de saúde da Federação cumpram as diretrizes para que o país tenha doses suficiente para imunizar com as duas doses previstas este primeiro ciclo da campanha”. 

Prioridade entre os profissionais da saúde

As cidades recebem do Ministério da Saúde um total de doses pré-estabelecido e, segundo a presidente do Conselho das Secretarias Municipais de Saúde (Cosems) e secretária municipal de Saúde do Cedro, Sayonara Cidade, a cada vacina aplicada, as informações obrigatoriamente são cadastradas pelo município no Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunização o (SI-PNI) do Ministério da Saúde. 

“Nesse cadastro nós informamos o nome, a unidade em que ele trabalha, o cadastro da unidade. O que nós estamos vendo de municípios, que por situações diversas, imunizou alguém que não estava na lista de prioridades, vai ser acompanhado. O Ministério Público ajuda nesse momento", explica ela.

De acordo com Sayonara, diante da baixa quantidade de doses, os municípios pactuaram com o Governo Federal uma ordem específica de vacinação na primeira etapa. "É a prioridade na prioridade", ressalta. No acordo, os trabalhadores da saúde foram categorizados, e devem ser vacinados conforme o grau de exposição à doença:

O pacto é pela priorização dos profissionais que atuam na linha de frente do combate à pandemia, sejam os trabalhadores com nível superior ou aqueles com menos formação, como o dos serviços gerais. A ordem na fila é, profissionais ativos de:

1. Unidades hospitalares Covid, enfermaria e UTI
2. Transporte pré-hospitalar (SAMU)
3. UPAS
4. Laboratórios de biologia molecular
5. Centros de coleta, testagem e atendimento Covid
6. Agente Comunitário de Saúde, enfermeiro e técnico de enfermagem, médicos da Estratégia de Saúde da Família

MP quer acesso prévio à lista de pessoas a serem vacinadas

O Ministério Público Estadual do Ceará (MPCE) requisitou que, algumas prefeituras, entreguem o plano de imunização, e junto, a lista prévia de quem vai se vacinar nos municípios do Ceará, nesta primeira etapa. Conforme o promotor de Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional da Cidadania (Caocidadania), Eneas Romero, até a próxima semana, essa recomendação deve ser emitida para as 184 cidades do Estado.

A orientação do MP, reforça ele, é que de fato sejam imunizados, nesse momento de pouca quantidade de vacinas, somente o público que se enquadra nas exigências. "Infelizmente, não tem vacina para todo mundo. Cabe ao município fazer a sua listagem de acordo com esses critérios, e não estão dentro desses critérios gestores, secretários, prefeitos, vereadores ou qualquer outra pessoa, por mais justa que possa ser a demanda. Quando você coloca outra pessoa na frente, você está excluindo, por exemplo, um profissional de saúde que está na linha de frente", enfatiza.

Alguns casos de "fura-fila" já estão sendo investigados no Estado, reforça ele. Mas antes de se ingressar com ações de improbidade administrativa, explica, é preciso dar oportunidade às pessoas envolvidas nas denúncias para que elas possam responder sobre o fato. "Além da improbidade administrativa, que pode acarretar a perda do cargo, a suspensão dos direitos políticos, existe a possibilidade de responsabilização criminal, que vai depender do crime e da análise dos fatos, como quem fez, quem foi beneficiado", completa.

Pressões para vacinar figuras ilustres

Um dos movimentos que ocorre em cidades cearenses e também chama a atenção, relata a presidente do Cosems, Sayonara Cidade, é a pressão para imunização de pessoas tidas como relevantes às localidades, sobretudo, aquelas que prestam serviço na área da saúde. 

"Um exemplo, no Cedro, é que tem um médico muito importante para nós. Mas ele não está na linha de frente. As pessoas pedem para ele ser vacinado pela importância que tem. Mas esse não é o critério. Nesse momento, é o risco que a pessoa está correndo naquele atendimento que deve contar", ressalta. 

Sayonara reforça que, apesar da atuação na gestão pública, não há disponibilidade ainda para a imunização de pessoas que atuem em setores administrativos, ainda que ligados diretamente à área da saúde.