Não ter onde morar. Residir em condições precárias ou aguardar décadas para ter o papel da casa. Realidades difíceis, mas persistente em Fortaleza, onde, o déficit habitacional que é permanente, em 2019, era estimado em 130 mil famílias. A Capital também tem 89 áreas de risco, habitadas por 22 mil famílias. Há ainda a fila de moradores que aguardam regularização fundiária, ou seja, na forma mais prática esperam ter acesso à posse formal da casa, geralmente, localizada em ocupações, ocorridas há anos. Dilemas urgentes em Fortaleza que requerem ações incisivas da nova gestão.
O mobilizador social, José Ivan da Silva, morador do Grande Bom Jardim, periferia de Fortaleza, reforça que, dentre todas as demandas, aquelas ligadas à moradia são prioridade. “Porque sofremos muito com os alagamentos no inverno e com doenças, viroses, provocadas por falta de saneamento”, alerta. Ele é um dos moradores atuantes no processo de regularização das Zona Especial de Interesse Social (Zeis) do Bom Jardim.
“Depois de 20 anos de luta por melhores condições habitacionais, conseguimos ser reconhecidos como área de Zeis, chamada de Zeis Bom Jardim”. A ação, relata ele, envolveu as organizações sociais da região, como a Rede de Desenvolvimento Local e Sustentável do Grande Bom Jardim, formada por 24 entidades comunitárias e diversos coletivos e a Prefeitura.
Conforme a Secretaria Municipal do Desenvolvimento Habitacional (Habitafor), entre 2018, 2019 e 2020, até setembro, Fortaleza, em parceria com o Governo do Estado e Tribunal de Justiça, garantiu o título definitivo de posse a 14.578 famílias. Outras 30 mil seguem em processo de regularização.
Localização é ponto chave para assegurar moradia digna
O professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC), e integrante do Observatório das Metrópoles, Alexandre Queiroz Pereira, ressalta que, de fato, “o acesso à moradia digna, bem situada, que dê as famílias dignidade, capacidade de locomover-se, é usar os serviços públicos, é um grandes desafio”.
A solução para esse dilema, explica ele, nos últimos anos têm recaído nas políticas públicas federais e tem ênfase na construção de grandes conjuntos habitacionais. No entanto, a estruturação desses moradias longes das centralidades de serviços gera efeitos também problemáticos.
“O que se precisa fazer é buscar uma política de verificação de vazios urbanos. Estudos da academia já detectaram terrenos e áreas em que podem ser construídos pequenos e médios conjuntos habitacionais, que deem aos mais pobres condição de inserção na vida urbana com qualidade”, ressalta.
A arquiteta e urbanista, Naggila Frota, também ressalta que o déficit habitacional em Fortaleza “é bastante preocupante”. Ela reforça que essa conta inclui as famílias que comprometem mais de 30% da renda em aluguel, que moram em habitações construídas com materiais improvisados e aquelas em situação de coabitação, quando mais de um núcleo familiar divide a mesma casa.
Além da construção de novas moradias, afirma ela, uma das forma de solucionar o problema é “a conversão de imóveis subutilizados ou abandonados em habitação de interesse social, estimulando assim o cumprimento da função social da propriedade e garantindo o direito à moradia”.
Em relação às áreas de risco, Naggila explica que na Capital, geralmente elas são localizadas em regiões ambientalmente frágeis, como margens de rios e lagoas. Para amenizar essa situação, sugere ela, “as intervenções em áreas de risco devem ser feitas em sintonia com o manejo dos recursos hídricos”.
Além disso, a arquiteta lembra que o Plano Diretor de Fortaleza, de 2009 e que ainda vigora, estabelece as Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis) como áreas prioritárias para regularização fundiária. E esse processo, acrescenta, envolve melhorias urbanísticas e reconhecimento da posse ou propriedade dos imóveis.
“Há mais de 10 anos, diversos grupos ligados ao meio acadêmico e a movimentos sociais vêm lutando para implementar essas melhorias e visibilizar essas áreas, um avanço dos últimos anos foi a elaboração dos Planos Integrados de Regularização Fundiária para 10 Zeis”.
Continuar esse processo, destaca ela, é ação fundamental a ser assegurada pela próxima gestão.