Em primeira refaunação do Ceará, biólogos devolvem periquito cara-suja à Serra da Aratanha; vídeo

Animais são transportados da Serra de Baturité para repovoar o local onde foram extintos

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(Atualizado às 13:06)

A interferência humana pode fazer um animal sumir do mapa, mas, na contramão disso, pesquisadores buscam repovoar uma espécie nordestina na Serra da Aratanha, em Pacatuba: o periquito cara-suja (Pyrrhura griseipectus). Essa é a primeira refaunação no Estado, que é a reintrodução do animal ao espaço onde foi extinto.

Isso começou com o transporte de 12 aves da Serra de Baturité para a Serra da Aratanha, em novembro do último ano. Lá, os animais ficaram em um recinto, em caixas-ninho, para se adaptar ao espaço. No dia 4 de maio, foram soltos e agora batem asas para repovoar a mata.

“É uma espécie nordestina e que hoje, praticamente, só sobrou no Ceará. Existe uma população incógnita na Bahia, mas precisamos descobrir se é um legítimo periquito cara-suja, contextualiza o biólogo Fábio Nunes, coordenador da refaunação.

Fábio faz parte da Associação de Pesquisa e Preservação de Ecossistemas Aquáticos (Aquasis) com um grupo de seis pesquisadores envolvidos no processo. Também faz parte uma doutoranda da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Há apoio da Secretaria do Meio Ambiente do Ceará (Sema), do Criatório Haras Claro e do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres (Cemave/ICMBio).

“A gente trouxe os primeiros indivíduos, animais selvagens na Serra de Baturité, à noite nas caixas-ninho onde estavam dormindo. Eles acordaram na Serra da Aratanha, presos em um recinto para se aclimatar, porque corriam de ir embora sem rumo”, lembra Fábio.

Foi feita a sexagem e os pesquisadores concluíram que as aves estavam igualmente divididas entre machos e fêmeas. O material genético dos animais também foi colhido para as ações de monitoramento.

O repovoamento dos periquitos cara-suja deve acontecer em 3 anos. Isso acontece em meio aos esforços para evitar também a extinção do Uru do Nordeste (Odontophorus capueira plumbeicollis);

“Já levamos um novo grupo do periquito (para o recinto) e a ideia é ser bem mais rápido. Os novos vão ficar por 3 meses e depois vamos trazer outro grupo. Então, a gente vai aumentar a velocidade do processo de refaunação da Serra da Aratanha”, frisa Fábio.

É importante ressaltar que essa é a primeira ação nesse sentido de refaunar uma área de extinção no Ceará. Nunca foi feita a translocação desse dessa forma
Fábio Nunes
Biólogo

O periquito cara-suja já viveu em grande grupo na Serra da Aratanha. No século XIX, a ave era exportada para países como Inglaterra e França com origem relacionada à serra cearense.

Como acontece o repovoamento

A variabilidade genética é decisiva para a população de periquitos se multiplicar até ocupar a Serra da Aratanha sem precisar de intervenção. “Porque aí eles vão ter viabilidade no longo prazo e, para isso, estamos tirando amostra de todos os indivíduos soltos”, completa.

Dessa forma, os bandos vão se misturando, e a expectativa da equipe é de ter entre 50 a 60 indivíduos soltos nessa fase inicial.

“Se a gente não tiver uma genética adequada, vamos pegar filhotes ou ovos e trocar por indivíduos da Serra de Baturité até que a gente tenha uma variabilidade suficiente para que eles se mantenham por si só”, reforça Fábio.

Essa, pode-se dizer, é a segunda conquista do grupo. Nos últimos 10 anos, a população de periquito cara-suja cresceu de forma expressiva na Serra de Baturité devido às ações de preservação.

"Estavam diminuindo por conta da ação de traficantes. A gente colocou as caixas e eles passaram a ir se reproduzindo”, explica o biólogo. Na Aratanha, o sucesso da operação vem quando for verificado o nascimento das aves.

“Como eles estão no primeiro ano, e já passaram de período reprodutivo, estavam copulando e tendo vários comportamentos reprodutivos, mas não chegaram a colocar ovos. A gente acredita que isso vai acontecer só no próximo ano” estima.

Monitoramento

Mesmo livres, as aves voltam ao recinto e usam os ninhos instalados pelos pesquisadores, onde devem colocar os primeiros ovos. Tudo será monitorado de perto para assegurar a reprodução.

“Se eles reproduzirem em ninhos naturais, que são os troncos de árvore, a gente também tem equipamento para isso. A gente sobe na árvore, coloca uma câmera de inspeção e observa o desenvolvimento da reprodução com a quantidade de ovos e de filhotes”, acrescenta.

A Serra da Aratanha é uma ilha isolada de mata úmida, no meio de uma caatinga, que guarda elementos que só existem ali. É um local que pode ajudar a evitar que animais entrem em extinção dividir o peso da responsabilidade com a Serra de Baturité
Fábio Nunes
Biólogo