Com área equivalente a 7 areninhas, sede da Expoece há 68 anos segue deteriorada e espera venda

Localizado no bairro São Gerardo, o Parque de Exposições, que pertence ao Governo do Ceará, já foi posto à venda por R$112 milhões, mas não teve compradores

Um grande terreno público em Fortaleza com árvores, plantas e construções como prédios e galpões, encravado em uma área completamente dotada de infraestrutura. Situado no bairro São Gerardo, o Parque de Exposições Governador César Cals, patrimônio da Secretaria de Desenvolvimento Agrário (SDA) do Governo do Estado, é conhecido por, há 68 anos, sediar a Exposição Agropecuária do Ceará (Expoece). 

Mas, apesar de não ser totalmente inativa, a grande área, que tem 122.488,23m², continua subutilizada e acumula precariedades, com epaços subutilizados e deteriorados. Atualmente, quem passa pelo que já foi a entrada principal do espaço, na Avenida Sargento Hermínio, encontra um amontoado de lixo.  

Em fevereiro de 2022, uma parte pequena do terreno, 208,23m², o equivalente a 0,17% da área total, foi cedida pelo Governo à Prefeitura  de Fortaleza para o alargamento da Av. Sargento Hermínio. 

A doação ao Município avança cerca de 10 metros no terreno - na entrada pela Sargento Hermínio - e consta no Diário Oficial do Estado, do dia 22 de fevereiro. 

O Parque de Exposições é um patrimônio localizado entre a avenida Sargento Hermínio e a Rua Coronel Raimundo Guanabara, em uma região cujos bairros têm infraestrutura, como sistema de água, energia, esgoto, e acesso a diversos serviços, como corredores de transporte público, escolas e comércio. 

E o que pode ser feito para garantir o melhor uso do local? Qual o impacto da subutilização dessa área? O que o Governo pretende fazer?

 

Impactos no planejamento urbano

O diretor da Associação Comunitária do Bairro Ellery e do Monte Castelo (ambos são áreas adjacentes ao Parque de Exposições), Wescley Sacramento, explica que o uso desse terreno não é uma pauta tratada oficialmente nas comunidades, mas destaca que nos dois bairros há uma grande demanda por construção de moradia popular. Uma das alternativas para uso dessa área, sugere, poderia ser essa. 

De acordo com ele, sobretudo, nos últimos anos, com o crescimento da área e a chegada de novos empreendimentos como shopping, supermercado, condomínios e a retomada das obras na Sargento Hermínio, os terrenos desses bairros tiveram valorização. 

Na região, as pessoas que precisam de moradia, quando contempladas em programas habitacionais, relata ele, têm que mudar de território, já que as construções ficam em bairros distantes. 

A professora do curso de gestão de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará (UFC), doutora em sociologia, Roselane Gomes Bezerra, explica que situações como estas, nas quais equipamentos dessa dimensão ocupam áreas centrais e são subutilizados, geram prejuízos para a as políticas urbanas, e podem inclusive provocar problemas de saúde pública, em casos, por exemplo, de ocupações irregulares. 

"Essa é uma questão muito delicada e que, de fato, o poder público precisa tomar medidas cabíveis, com a desapropriação, parcerias público privada ou venda". 
Roselane Gomes Bezerra
Professora do curso de gestão de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará (UFC) e doutora em sociologia,

Segundo ela, o Brasil tem uma legislação adequada para lidar com essas questões, desde a Constituição Federal, o Estatuto das Cidades, até os planos diretores. “O plano diretor de Fortaleza está para ser revisto e vai ver áreas da cidade de renovação. Quando ocorrem episódios como esse, de equipamentos de grande dimensão parados em áreas centrais, é preciso destinar outros usos”. 

Na avaliação da professora, mesmo havendo controvérsias, uma das alternativas para o poder público, de fato, é a venda de terrenos assim. “É um caminho sim, inclusive garantido na Constituição. Podemos lançar mão da nossa legislação e justificar esse tipo de procedimento que é a venda. Porque esses imóveis parados, vazios, geram impactos para a cidade toda”. 

Ela ressalta que embora se cogite a possibilidade de o poder público dar outros usos a terrenos assim, seja para moradia ou construção de parques públicos, na prática, nem sempre “há recursos para desenvolver uma política pública social nesses equipamentos, logo, a venda é uma justificativa”, completa. 

 

Edital de venda

A propriedade é dos terrenos públicos listados, em 2016, pelo Governo do Estado, como possível de ser vendido para arrecadar dinheiro para os cofres públicos. Em 2019, a gestão estadual lançou editais e abriu concorrências públicas nacionais para vender, além do Parque de Exposições, outras duas áreas, uma em Fortaleza e outra no Eusébio.

Na época, o terreno do Parque de Exposições, cujo tamanho no edital é definido em 98.861,95 m², foi posto à venda por 112,8  milhões de reais. O espaço é um dos maiores terrenos públicos cogitados para venda. Mas a concorrência foi deserta, ou seja, não houve nenhum interessado na proposta. Depois disso, veio a pandemia de Covid e o processo está paralisado. 

Para se ter dimensão, a área posta à venda equivale ao tamanho de 7 Centro Urbano de Cultura, Arte, Ciência e Esporte (Cuca) da Barra do Ceará. Outra comparação é que no Estado, a maior areninha esportiva entregue pela Prefeitura de Fortaleza e o Governo, no Antônio Bezerra, tem 13 mil m². No terreno do Parque de Exposições cabem 7 areninhas de dimensões semelhantes a essa.  

Espaço tradicional da Expoece

No Parque de Exposição podem ser realizados eventos de natureza diversa, mas o local é conhecido por sediar a Expoece e a Feira Cearense da Agricultura Familiar (Feceaf). A Expoece é o maior evento agropecuário do Estado, sendo um dos mais tradicionais, desde 1954 é organizada no espaço, à época, conhecido como Granja Modelo. 

No Parque, segundo a SDA, devido à crise sanitária, não houve eventos oficiais no local entre março de 2020 e este mês. A projeção da Associação dos Criadores do Ceará (ACC) é que a Expoece 2022 aconteça no final de outubro e início de novembro no local. 

Na área do Parque, diz a SDA, existem 17 prédios, sendo 14 casas e outros 3 prédios: edificação central com auditório e salas, restaurante e um complexo com casa de farinha e engenho. No local, funciona um restaurante, que é administrado pelo mesmo proprietário de uma venda de alimentos e  produtos da agricultura familiar no local. 

Além disso, sedes de associações também funcionam em prédios da SDA localizados dentro do terreno. O presidente da Associação dos Criadores do Ceará (ACC), Walfrido Monteiro, cuja sede fica no Parque de Exposições, explica que a entidade tem uma concessão para uso,  e queixa-se que a área está “completamente abandonada”. 

Walfrido classifica a situação do local como complexa e diz que as edificações e a estrutura do terreno estão “abandonadas e carecem de intervenções”. “Eu acho que tem sido um descaso muito grande com o Parque há muito tempo. É difícil. Já procuramos muito o Governo. Eles escutam, dizem que vão procurar o que pode ser feito no Parque, mas até agora nada”. 

Ele ressalta que as condições estão deploráveis e indica que há vários veículos da SDA parados no Parque sem serventia. Além disso, destaca a falta de segurança. 

Já a SDA diz que a manutenção do Parque ocorre “sistematicamente e se refere especialmente a limpeza com a capinação para a retirada da vegetação invasora e coleta e retirada do lixo”.

Em determinados períodos do ano, acrescenta, “as limpezas são mais severas e com menor intervalo de tempo”  para garantir uma área livre de entulhos, e evitando a proliferação de insetos, ratos e outras pragas.