Os modelos oceânicos apontam uma tendência de 70% do retorno do El Niño – fenômeno que reduz os volumes de chuva – para os meses de janeiro a março de 2024, o que pode prejudicar as precipitações no Estado. O aviso foi feito pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme) nesta quinta-feira (1º).
Caso confirmada a volta do El Niño, o período chuvoso de 2024 no Ceará pode ser semelhante aos anos de 1958, 1998 e 2016, quando os acumulados ficaram bem abaixo da média histórica. Apesar do anúncio, os meteorologistas alertam que ainda é cedo para atestar o fenômeno.
A maior preocupação é com a segurança hídrica do Estado com menos água nos açudes, por exemplo. Os reservatórios mais estratégicos, como Banabuiú, Orós e Castanhão, caso o El Niño se instale, podem ser prejudicados.
O presidente da Funceme, Eduardo Sávio Martins, contextualiza que o receio acontece pelo aquecimento dos Oceanos Atlântico e Pacífico, além da costa da América do Sul.
"Isso preocupa muito, temos visto em alguns anos um efeito de 'secamento' das chuvas, de Sudeste para Noroeste. Se esse aquecimento permanecer, as regiões mais importantes em termos de reservatórios estratégicos podem ser afetadas", completa.
Os açudes menores, como acrescenta Eduardo, também possuem uma função importante para as comunidades e isso amplia a seriedade da situação. Os avisos sobre o retorno do El Niño acontecem pela Funceme desde janeiro.
Ainda é muito cedo para fazer prognóstico, mas as condições que temos no Atlântico hoje são de aquecimento quase generalizado. Isso tende a mudar e a gente não sabe o que vai ser no início do ano
Eduardo lembra do último cenário em que o El Niño atuou com intensidade sobre o Ceará, em 2016, quando as chuvas ficaram cerca de 40% abaixo da média histórica, entre fevereiro e maio daquele ano.
"Em termos de aporte isso é drástico, porque mesmo em anos normais nós temos 50% de chance do aporte ser abaixo da média. Em anos secos é quase certo ser abaixo da média, se não houver uma concentração de chuvas em poucos dias", conclui.
Os últimos anos foram de atuação da La Niña, quando há o resfriamento das águas oceânicas e as chuvas são favorecidas no Nordeste.
O que é o El Niño?
O El Niño é caracterizado pelo aquecimento anormal e persistente da superfície do Oceano Pacífico, na região da Linha do Equador, conforme o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
Ainda segundo o Instituto, o fenômeno começa a se formar no segundo semestre do ano, quando as águas ficam, pelo menos, 0,5°C acima da média por um longo período de tempo. O fenômeno pode persistir até dois anos ou mais.
Na prática, o fenômeno dificulta a formação de nuvens de chuvas, como explica Eduardo Martins.
"Se o El Niño se consolidar, o que acontece é que teremos uma descida de ar sobre o Norte e o Nordeste, o que impede a formação de nuvens. O vapor quente e úmido não consegue se elevar, se condensar e formar nuvens para se precipitar", explica.
Situação dos açudes
A quadra chuvosa de 2023 ficou dentro da normalidade e foi suficiente para acumular 51% do volume dos açudes monitorados pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh). No período, 71 reservatórios sangraram.
Isso traz um conforto hídrico para regiões que ficaram por anos com baixos volumes de chuva. Mas uma queda nas precipitações do próximo ano pode comprometer esse cenário.
"Estamos numa condição favorável, a chuva parece lavar a nossa memória de secas passadas, então é muito importante termos cautela nas decisões de alocação de água pensando, principalmente, no próximo ano”, analisa.
Por isso, ele indica a necessidade de antecipação de um eventual programa de resposta a uma quadra caracterizada por uma seca hidrológica.