Após recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) na tentativa de reverter uma decisão da justiça estadual do Ceará sobre a obrigação de ampliar vagas em creches em Fortaleza, a Prefeitura perdeu a ação e, dentre outras iniciativas, terá que prever no orçamento de 2025 um incremento de, ao menos, 1.000 matrículas de crianças nessa etapa do ensino.
A ação judicial foi movida pelo Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) e pelo Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca) ainda em 2019, tramitou em diversas instâncias e no STF teve um desfecho este mês: o recurso da Prefeitura não foi acolhido pela Suprema Corte e, portanto, a gestão municipal deve cumprir a decisão que já havia sido proferida pela justiça estadual. Não cabe mais recurso.
A sentença da Justiça do Ceará, que agora precisa ser acatada, determinava uma ampliação gradual de no mínimo 1.000 vagas/ano, a partir de 2025, até que seja atendida toda a demanda existente, explicou ao Diário do Nordeste a assessora jurídica do Núcleo de Atendimento do Cedeca Ceará, Giovanna Pessoa.
Mas a decisão também estabelece que a Prefeitura deve prever essa execução no orçamento público do município a partir do ano seguinte ao trânsito em julgado da ação, ou seja, a partir de 2025 já que o processo foi encerrado em 2024.
“Existe essa previsão de ampliação das vagas, mas é necessário que o orçamento público consiga ser planejado para isso a partir do ano subsequente, ou seja, 2025. Quando ela diz ‘devendo o ente público providenciar as respectivas dotações orçamentárias no ano subsequente ao trânsito em julgado desta sentença’ é que a Prefeitura deverá planejar o orçamento de 2025 para cumprir a gradual ampliação de vagas, de no mínimo mil vagas no ano”, destaca Giovanna.
Questionada pelo Diário do Nordeste sobre a decisão judicial, a Secretaria Municipal da Educação de Fortaleza (SME) informou que recebeu a notificação oficial nesta terça-feira (22) referente à ação mencionada, e “está analisando a decisão”.
Histórico da ação
A ação civil pública teve início em 2019 e foi movida pelo MPCE e o Cedeca contra a Prefeitura de Fortaleza. No processo, as instituições pediram que, em 90 dias, a Prefeitura apresentasse e cumprisse integralmente um plano de ampliação de vagas em creches. À época, o incremento solicitado pelas instituições na Justiça, com base em cálculo que considerou a oferta e a procura, era de ao menos 1.964 vagas por ano de 2020 a 2025.
A primeira decisão sobre o caso foi proferida em 2020, quando a 3ª Vara da Infância e da Juventude do Tribunal de Justiça do Ceará condenou o Município de Fortaleza a garantir o direito de acesso à educação infantil em creches a crianças com idade de 0 a 3 anos, inclusive com instalação de berçários. A decisão estabeleceu que a ampliação de vagas teria que ser de, no mínimo, 1.000 matrículas por ano.
Em caso de impossibilidade de garantir o acesso dessas crianças às unidades da rede pública, a sentença determinou que a Prefeitura poderia disponibilizar as vagas em escolas conveniadas.
Além disso, o poder público municipal deveria comunicar ao juízo o número de matrículas realizadas e o número de remanescentes, bem como disponibilizar, através de meio oficial, a publicação de relatório de cumprimento da decisão judicial, sendo atualizado semestralmente.
Mas, conforme a assessora jurídica do Núcleo de Atendimento do Cedeca Ceará, Giovanna Pessoa, a Prefeitura, naquela ocasião, recorreu da decisão dando continuidade à ação. Já em 2023, o Tribunal de Justiça do Ceará, na 2ª instância, confirmou a sentença da 3ª Vara.
“Os desembargadores mantiveram a decisão e o município continuou recorrendo. Agora em caráter de discussão técnica, já que o mérito do processo, isto é, a discussão em torno da garantia de vagas em creches já havia sido confirmada pelas duas instâncias do Ceará”, acrescenta ela.
O município mais uma vez entrou com recurso e o processo, em abril de 2024, chegou ao STF. O sistema de registros de processos da Suprema Corte indica que foi distribuído em maio de 2024, ficando a análise a cargo do ministro Nunes Marques. Na decisão monocrática proferida por ele em agosto de 2024 o ministro não reconheceu o recurso da Prefeitura de Fortaleza pois, na prática, a gestão municipal não teria conseguido demonstrar de forma clara e precisa, por que a decisão anterior está equivocada.
“É importante sempre lembrar que nenhuma criança deve estar fora da escola e que a lista de espera é uma ferramenta de organização dessa demanda, mas não pode se perdurar ou ser naturalizada. Se crianças estão demandando por creches e não estão conseguindo garantir esse direito basilar e constitucional, a violação está configurada”, reforça a assessora jurídica do Cedeca, Giovanna.
Conforme o sistema de processos do STF, no mês passado, a decisão do Tribunal de Justiça transitou em julgado e os autos foram remetidos para a primeira instância da justiça estadual para que o município possa executar o que foi determinado anteriormente. Giovanna reforça que a decisão (proferida pela justiça estadual e reiterada pelo STF) “está inteiramente válida e não há nenhum recurso que impeça o seu cumprimento”.
Prefeitura aponta melhorias
Em nota, a Prefeitura de Fortaleza ressaltou que “a educação infantil é uma prioridade na gestão Sarto”. Em um balanço sobre as ações nesta área, a gestão afirma que desde 2021, foram criadas 7.109 novas vagas para crianças do berçário ao Infantil III.
A Prefeitura também diz que “inaugurou 34 novos Centros de Educação Infantil (CEIs) com atendimento de berçário”. Segundo a gestão, “10 novos CEIs estão em construção na Capital, o que vai gerar cerca de 2 mil novas vagas”.