Mara Alexandre é rainha. Ainda criança entrou para a realeza do movimento junino. E já são mais de 20 anos carregando a faixa de rainha de quadrilhas juninas cearense. Este ano, ela não competiu. Se afastou das quadras, mas se dedicou a ensinar o encanto e o charme que a fizeram reinar absoluta por tanto tempo a outras damas.
Apaixonada pela dança e pelo São João, a cearense reconhece a riqueza dos movimentos juninos, mas também alerta sobre a rivalidade exagerada e tóxica que existe entre as quadrilhas. No episódio desta quinta-feira (11) do Que Nem Tu, ela divide que já sofreu com páginas fakes que criticavam e debochavam dela por conta da surdez.
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"Existe uma rivalidade como toda competição. Mas às vezes eu não acho saudável. O que acontece hoje no movimento junino quando chega ao ponto da agressão física ou psicológica. Muitas pessoas chegaram a criticar, falar, desejar o meu mal. Chegaram ao ponto de dizer que não queriam me ver andando. Porém isso nunca me afetou. Eu consigo abraçar as críticas com sabedoria. Teve um ano que falaram da minha deficiência. Fizeram uma página fake. Foi bem pesado. Mas o mundo junino falou mais do que eu", disse Mara.
Neste ano, a rivalidade a levou até a delegacia. No entanto, a bailarina disse que resolveu não seguir adiante com a denúncia contra a pessoa que criou o perfil para zombar de sua surdez. Para ela, já havia tido a resposta necessária para que a pessoa entendesse que ela tinha errado e, mais, teria cometido até crime.
Mara começou a brincar quadrilha aos 4 anos. Aprendeu a andar e já dançou. Em casa, todo mundo vivia quadrilha e o São João passou a ser coisa séria ainda na infância. Aos sete anos, competia como brincante do grupo Puxando Fogo, ao lado de suas irmãs mais velhas. Aos 38 anos, é estrela de primeira grandeza do movimento junino do Brasil. Como integrante da Quadrilha Ceará Junino, uma das mais premiadas no circuito dos festivais, Mara projetou seu nome como rainha há mais tempo na função.
Aos 12 anos ela perde a audição. Mas não abriu mão de sua paixão pela dança. Criou uma técnica para conseguir sentir a música e entrar no ritmo.
"Quando eu perdi minha audição eu fiquei pensando: 'como vou conseguir voltar a dançar?' Porque a gente se isola. É difícil lidar com a situação de buscar formas de acessibilidade. Devido ao meu estudo, a minha descoberta com a dança, fui descobrindo isso no meu corpo. Fui desenvolvendo, vendo as possibilidades que eu poderia ter a dança, a forma de ouvir o ambiente. Eu fiquei colocando minha mão na caixa de som pra identificar que ritmo era aquele e como eu conseguiria permanecer naquele movimento", relata. "Não só os ouvidos são os principais convidados para uma escuta de consciência corporal. Pra mim é a visão, o sentir, a vibração", completa.
Para continuar a dançar sem ouvir, criou técnicas próprias. Aí ela começou com a dança de salão, faz balé clássico na Vidança, se formou pelo Curso Técnico em Dança, do Porto Iracema das Artes, e se graduou em Dança pela Universidade Federal do Ceará. Ela então juntou todas essas expressões e levou para suas performance no movimento junino.
Mara relembra que chegou a receber críticas por inovar na tradição. Mas depois, suas danças se tornaram movimentos assinados e repetidos por outras rainhas. O sucesso de Mara Alexandre é tamanho, que hoje ela ministra oficinas Brasil afora seu método.
No episódio, a bailarina conta também sobre as mudanças na estética junina, fala sobre a rotina de quem integra o movimento, relata valores gastos para que brincantes possam se apresentar e também explica como as quadrilhas sobrevivem mesmo com pouco investimento.