Estar entre livros é sempre imperativo, tanto mais quando um novo ano se inicia e ainda precisamos nos resguardar em casa devido à alta dos casos de contaminação por Covid-19 no Ceará e em todo o País. A literatura, assim, realça a característica de ser refúgio e instrumento de reflexão, promovendo discussões e capacidade de empatia, além de também protagonizar experiências de entretenimento e prazer.
Nesse sentido, o Verso convidou três profissionais cearenses ligados ao livro para que enumerem ferramentas e estratégias utilizadas por eles de modo a fomentar um maior mergulho na palavra neste ciclo que já se iniciou. A estudante e bookstagram Suyany Nogueira, idealizadora do perfil @sentirliterario, afirma que, para quem possui uma rotina agitada, é interessante estar sempre com uma obra por perto para ler nas horas vagas.
“É comum vermos pessoas lendo em ônibus, né? Porque é o momento que elas têm, então é uma ótima alternativa levar sempre um livro dentro da bolsa para quando precisar”, recomenda. Por sua vez, aos que possuem mais tempo na agenda, o ideal, segundo ela, é estabelecer metas de páginas a serem lidas por dia, acostumando e estimulando o cérebro a perceber aquele momento de receber as informações.
“Outra coisa que pode ajudar é acompanhar perfis nas redes sociais em que as pessoas falam sobre livros, pois isso pode funcionar como uma forma de incentivo para você ler mais e conversar sobre”, completa.
Suyany utiliza o Skoob, rede social na qual usuários de vários lugares compartilham o andamento das leituras, selecionam títulos que desejam conferir no ano, avaliam pontos positivos e negativos sobre uma obra, entre outras atividades.
Mesmo assim, ela confessa não abdicar do caderno em que faz anotações sobre passagens interessantes de cada exemplar. Também sempre valida a importância da participação em clubes de leitura; o respeito para com o próprio tempo de apreciação de uma obra, evitando comparações; e adquirir o hábito diário de ler. “Costumo pensar assim: não importa se você lê cinco, 10 ou 100 páginas por dia, o que importa verdadeiramente é que você leia”, diz.
Disciplina e planejamento
Esse rigor também é levado a sério pelo escritor Thiago Noronha, autor de “O primeiro parágrafo das memórias de um louco”. Ele reserva uma quantidade de tempo por dia para se dedicar a leituras de ficção, realizando uma seleção do que vai conferir. Nesse movimento, vê como relevante estabelecer prioridades de leitura.
“Porque a gente tá sempre lendo – conteúdos nas redes sociais e notícias, principalmente. Então essa estratégia tem funcionado bem para mim há alguns anos. Desde que comecei a contar, li uns 50 livros por ano, além de acompanhar três ou quatro páginas literárias na internet com publicações frequentes de contos e crônicas”, situa.
Thiago defende a ideia de que é necessário perceber a leitura como algo para além do entretenimento, sendo ela, sobretudo, um exercício de capacitação e formação. Assim agindo, não tendemos a substituí-la por outras mídias, a exemplo de filmes e séries, que, feito os livros, também contam boas histórias, nos informam, emocionam e divertem. “Ainda assim, elas não são tão envolventes como a leitura, penso eu, e nem estimulam essa interação com a língua e a capacidade de imaginação e criação de imagens”.
Quanto aos critérios para selecionar livros, o autor gosta de checar o que os concursos literários estão premiando, visto que costuma ter boas experiências com os títulos oriundos dessas curadorias e seleções. Desta feita, não desgruda o olho dos finalistas e vencedores de concursos como Jabuti, Prêmio Oceanos, Prêmio Sesc de Literatura, dentre outros, apreciando as obras tanto na versão física quanto em dispositivos como o Kindle. “Acostumei-me a ler com ele e a tendência é que faça isso cada vez mais”, acredita.
Articulação
Atuando em 11 bibliotecas comunitárias e uma escolar, a mediadora de leitura Sâmia Alves percebeu que o mundo virtual ganhou ainda mais força no último ano, no que se refere às maneiras de mergulhar na palavra. Não à toa, considera que uma das estratégias para quem deseja intensificar as leituras é estar articulado com outros leitores por meio das redes sociais.
“Assim, é possível ter acesso a indicações de livros, assistir a lives e até mesmo participar de clubes de leitura e outras ações de bibliotecas, como por exemplo Pic Nic Literário, Clube Literanegra, Rede de Leitura Jangada Literária, Biblioteca Comunitária Viva Barroso e Biblioteca Comunitária Livro Livre Curió, que têm se reunido por meio de plataformas digitais”, dimensiona, citando projetos e iniciativas cearenses.
De forma pessoal, ela tenta dividir a lista de obras que quer conferir em categorias, indo de livros pedagógicos a títulos infantis e juvenis e literatura cristã. “Atualmente utilizo um planner para organizar minhas leituras. A cada dia destaco alguma frase ou impressão sobre o material que li. Como também amo escrever, de vez em quando esses momentos servem como inspiração para uma nova produção literária”.
Para quem ainda não possui o hábito de ler, a mediadora explica que o livro só cumpre realmente seu papel quando é lido, o que torna o leitor o centro dessa relação literária. “Muitos espaços – como, por exemplo, a escola – tornam a leitura algo obrigatório, mas o ideal é despertar o prazer em ler. O ponto de partida é cada um se ver como sujeito autônomo, capaz de escolher a leitura que mais lhe agrada”, sugere.
“Você pode ir conhecendo os gêneros literários, não se importando com a quantidade de livros que vai ler, mas, sim, com a qualidade literária e impactos que essa leitura vai causar. Quando lemos um livro, nunca permanecemos iguais”. Bons atravessamentos pela frente!
>> Confira os livros que os entrevistados desejam conferir neste ano:
Suyany Nogueira, bookstagram, idealizadora do perfil @sentirliterario
Algumas das metas da estudante é finalizar algumas séries de livros que iniciou em 2020. Também deseja ler mais autoras e autores brasileiros e livros que prezam pela inclusão de personagens LGBTQI+, por exemplo. “Acho que é fundamental analisarmos o que estamos lendo, isso diz muito sobre quem somos”, considera Suyany.
Thiago Noronha, escritor
Está priorizando obras escritas por cearenses ou radicados no Estado. Já leu dois: “à cidade”, do poeta Mailson Furtado, e “Me acusaram de querer mudar”, de Josi Siqueira. Neste momento, está esperando receber dois títulos que adquiriu via campanha de financiamento: “Sarau#3”, de Talles Azigon, e “Viço manco voo”, de João Paulo Lima.
Na lista de leituras para este ano, ainda estão inclusos “Prelúdio para os olhos”, da estreante Nádia Fabricio; e um destaque do Prêmio Jabuti 2020, o livro de contos “Redemoinho em dia quente”, de Jarid Arraes.
“Também quero ler ‘Veneno da Madrugada’, do Gabriel García Márquez, que ganhei recentemente de uma amiga; e talvez releia ‘Amor nos tempos do cólera’, do mesmo autor. Ainda desejo ler ‘Os Sinos de Encarnação’, da Angela Gutiérrez, pois me disseram que lembra o meu livro de contos”, situa. “A meta é um livro por semana e focar na diversidade de vozes e temas”.
Sâmia Alves, mediadora de leitura
“Educar na Curiosidade”, de Catherine Lecuyer (Fons Sapientiae, 2016);
“Uma Clareira no Bosque”, de Gilka Girardello (Papirus Editora, 2015);
“A Mecânica do Coração”, de Mathias Malzieu (Galera, 2011);
“As Crônicas de Nárnia”, de C.S. Lewis (Martins Fontes, 2009);
“O Arroz de Palma”, de Francisco Azevedo (Record, 2014)