Reconhecida, no ano passado, como patrimônio imaterial do Brasil, a literatura de cordel recebe um espaço exclusivo na Biblioteca Central da Universidade de Fortaleza (Unifor) para armazenamento e catalogação de títulos desse gênero. A instituição de ensino é a primeira a inaugurar uma Cordelteca na Capital. O lançamento do espaço ocorre na manhã desta terça-feira (20), no auditório da biblioteca da Universidade.
O evento integra a programação especial da Unifor para a Bienal Internacional do Livro do Ceará, que ocorre entre os dias 16 e 25 de agosto no Centro de Eventos. A Cordelteca Unifor recebe o nome da poeta Maria das Neves Baptista Pimentel, a primeira mulher a publicar no Brasil um folheto do gênero, em 1938.
O espaço também é o primeiro do País a catalogar os títulos com a mesma deferência de qualquer outra obra literária, preservando informações básicas como autor, assunto e ano de publicação.
Conforme a coordenadora da Cordelteca, Paola Tôrres, a proposta foi armazenar de forma organizada os importantes títulos do cordel brasileiro. "O cordel é um folheto de feira que, dentro de uma Cordelteca dessa natureza, ascende e passa a ser um livro. Ele é cadastrado com a normatização internacional, passa a ser reconhecido e, consequentemente, pesquisado", explica a médica e professora, que também pesquisa e escreve cordéis.
Para isso, a equipe da Unifor adaptou o sistema de catalogação de livros para os folhetos de cordel, conferindo ao gênero um armazenamento profissional, diferentemente de espaços em que os títulos são expostos em tradicionais cordões.
"Muitas vezes, a literatura de cordel é relegada a espaços assim. Quando ela se insere dentro de uma catalogação de uma biblioteca, por exemplo, isso valoriza a obra. A gente consegue dar mais visibilidade para os autores", considera a gerente da Biblioteca da Unifor, Leonilha Lessa, que coordenou todo o projeto de catalogação. O trabalho, que durou cerca de um mês, contou com dois bibliotecários e três auxiliares.
Interação
Localizada no espaço onde funciona a coleção Rachel de Queiroz, a Cordelteca será inaugurada com 1,2 mil títulos. O interesse da coordenação é de que o espaço, além de servir para consultas, possa estreitar laços entre o gênero e as diversas áreas do conhecimento.
Uma das atividades programadas será a Quinta do Cordel. Prevista para acontecer na primeira quinta-feira de cada mês, ela consiste em reunir cordelistas e pesquisadores dos departamentos da Universidade para dialogar sobre um tema específico a partir de um folheto. "A gente vai fazer essa interlocução. O cordel é algo que aproxima, todo mundo entende. A partir de um folheto, as pessoas entendem o que um médico, um advogado ou um arquiteto quer dizer", considera Paola Tôrres.
O vice-reitor de extensão e comunidade universitária, Randal Martins Pompeu, entende a Cordelteca como um estímulo à pesquisa. "Temos como o principal objetivo contribuir para esse resgate da literatura de cordel, que é muito ligada à cultura nordestina, e também usá-la como recurso pedagógico", afirma.
A iniciativa foi comemorada por pesquisadores e guardiões do gênero literário. O escritor e compositor Bráulio Tavares, autor de vários títulos de literatura de cordel e um dos convidados confirmados na inauguração, enfatizou a importância de entender os folhetos como uma obra literária.
"O cordel tem que ser tratado como livro. Se um romance chega a uma biblioteca, ele logo ganha um número, é devidamente armazenado e preservado. O cordel também merece esse cuidado", pontua.
O presidente da Academia Brasileira de Literatura de Cordel, Gonçalo Ferreira da Silva, concorda. "Essa contato das pessoas com o cordel desperta a curiosidade de estudantes, por exemplo, e isso ajuda a preservar o gênero. Essa é a importância", considera Randal.
títulos de cordel foram catalogados e estão disponíveis para o público
Homenageada
A paraibana Maria das Neves Baptista Pimentel (1913 - 1994), autora do folheto "O violino do diabo ou o valor da honestidade" (1938), dá o nome à Cordelteca Unifor. Vinda de uma família de poetas, ela resolveu apostar na escrita dos folhetos para sustentar os filhos depois da morte do marido.
Para se afastar do preconceito de gênero, no lugar da própria identidade, inventou um pseudônimo que misturava o nome do marido falecido e o Estado onde ele tinha nascido. Assinou como "Altino Alagoano".
Com a ousadia, ela se tornou a primeira mulher a escrever um folheto de cordel. "Toda a família está muito feliz com a homenagem porque é um reconhecimento", diz Alzinete Alencar Pimentel, filha caçula da poeta.
SERVIÇO
Lançamento da Cordelteca Unifor
Nesta terça-feira (20), às 9h, no Auditório da Biblioteca Central da Unifor (Av. Washington Soares, 1321 - Edson Queiroz). Visitação: De segunda a sexta-feira, das 7h às 21h55. Aos sábados, das 7h30 às 16h25. Informações: (85) 3477.3000