Biblioteca comunitária Livro Livre Curió celebra dois anos com criação de revista digital

Revista Coletiva nasce como meio de contornar tempos extremos e reforçar vínculos da biblioteca, uma das maiores conquistas da literatura cearense nos últimos anos

Transformar angústia em potência: foi com essa motivação que a "Coletiva" nasceu. A revista digital surge ao público como resposta que a Livro Livre Curió - Biblioteca Comunitária encontrou para driblar os efeitos da pandemia do novo coronavírus sobre as atividades da casa. Para além disso, a ideia é também continuar a fomentar a circulação da literatura em Fortaleza e no Ceará.

"Nos primeiros dias de quarentena, ficamos muito tristes por estar fechando a biblioteca. Então, começamos a inventar coisas que fizessem com que a gente não perdesse os vínculos com os escritores e escritoras e as pessoas que ajudam a casa", explica Talles Azigon, poeta, produtor cultural, editor, mediador de leitura, curador de eventos literários, contador de histórias e um dos idealizadores da Livro Livre.

"E também foi sobre pensar em soluções criativas para continuar vendendo nossa produção e conseguir mobilizar algum recurso", complementa. Não à toa, a primeira edição da revista está à venda, no valor de R$ 10, no site da Aliás Editora (é possível adquirir por PayPal, Mercado Pago, cartão de crédito ou boleto bancário).

Ao comprar o produto, há um bônus: com ele, vem a versão digital de "Saral #2", livro de Talles Azigon e Leo Silva.

Amplitudes

A pretensão é que novas edições da Coletiva possam ser lançadas no período de duas semanas, no máximo. O segundo número, inclusive, já está sendo produzido, e deve contar também com uma gratificação. Neste caso, será o livro "O mais feliz dos silêncios", da escritora cearense Ayla Andrade.

Contudo, vale ressaltar que, já na edição piloto, a revista chega com um time de peso. O projeto gráfico é de Daniel Firmino, colagens de Pâmela Soares, revisão de Jéssica Gabrielle Lima, coordenação editorial de Talles Azigon, e textos de Nina Rizzi, Heliana Querino HQ, Thiago Noronha, Yuri Marrocos e Tércia Montenegro.

São escritores e escritoras que caminham junto com a bibilioteca e devem ressoar textos sobre diferentes modos de escrever juntas uma nova realidade, em sintonia com o que vai na capa da publicação. 

"Quando pensamos a revista foi justamente considerando esse momento para tentar refletir: 'E agora, como vamos escrever outra narrativa dentro desse mundo que não será mais o mesmo?'. É isso que estamos buscando", afirma Talles, contando que, pelo fato de a literatura já ser um setor fragilizado da cultura, há sempre que acontecer movimentações, a fim de impulsionar sonhos e conquistas no meio.

Emoção e resultados

Não à toa, a fala sobre o novo rebento da Livro Livre Curió faz emergir uma fala inspirada sobre os dois anos de caminhada da biblioteca comunitária, completos no último 1º de abril.

Azigon é todo emoção ao situar que a casa mudou e continua a mudar a realidade do bairro em que está inserida, projetando uma nova identidade do local para toda a cidade e o Estado.

"O Curió, que antes era conhecido como o bairro da chacina, hoje é conhecido como o bairro da biblioteca", diz. "Ela ajuda a construir a narrativa das crianças que moram aqui, passam pela casa e mudam completamente a vida. Parece que estamos há cinco anos em atividades", confessa

Isso porque os pequenos passam a ter acesso a vários equipamentos culturais e contato com uma série de pessoas que transformam positivamente suas trajetórias. Resultado: tornam-se protagonistas do próprio caminhar.

"É tanto que, na nossa última festa das crianças, elas fizeram o lançamento de uma zine publicada pela minha mãe e Daniel Firmino, com poemas próprios. No dia do lançamento, a satisfação delas mostrando o trabalho para os pais, mães e amigos é algo que jamais teria pagamento, de tão grandioso que é", descreve.

Segundo ele, o sentimento é de felicidade e orgulho por tudo que realizaram nesse par de anos exemplo recente foi a doação de mais de três mil livros para outras bibliotecas de Fortaleza e do interior do Estado, durante a XII Bienal Internacional do Livro do Ceará e também incontida satisfação, por conseguirem mobilizar pessoas para tornar o equipamento um dos mais importantes redutos da literatura cearense.

Neste momento de isolamento físico, Talles e todos os envolvidos com a biblioteca estão se empenhando em pensar noutras possibilidades para continuar a reverberar as atividades do local, cuja característica sempre foi de estar de portar abertas: acesso livre para as letras para prenuciar os ares de liberdade quando desse mágico contato.

"Acho que, se não existisse a Livro Livre Curió, a literatura e a leitura no Ceará não seriam a mesma coisa. Eu tenho uma satisfação enorme de olhar e dizer assim: 'Isso foi o que nós oferecemos para esse Estado e para essa cidade'. Sei que é muito difícil ter esse reconhecimento dentro de um contexto em que a leitura, a cultura, o conhecimento e a ciência não são tão valorizados como deveriam ser. Mas eu também sei que a gente pode modificar muitas coisas, e a gente sempre está com esse espírito de continuar. E nós vamos continuar".