Alvo de críticas da classe artística, nova gestão da Secultfor segue sem planejamento definido

Em meio à contínua crise do setor cultural na pandemia, Secretaria da Cultura de Fortaleza ainda não apresentou um plano emergencial específico para 2021

Em março, mês que demarcou um ano da pandemia do novo coronavírus, os profissionais da Cultura em Fortaleza emitiram um alerta. Em carta aberta, enviada no dia 31/03, inúmeros representantes do setor cobraram dez ações urgentes ao prefeito Sarto (PDT) e à Secretaria da Cultura de Fortaleza (Secultfor).  

Os profissionais pedem socorro. Entre os pedidos, conta a solicitação de ajuda com cestas básicas. O documento exige a criação de editais que garantam recursos de sobrevivência para quem atua na área. Dois outros pontos adicionam questionamentos pontuais. A classe quer saber quem fala pela pasta e qual o planejamento da nova administração.

Para o setor, a falta de diálogo e ausência de ideias e soluções mais concretas ao longo de um ano de crise sanitária são alvos de crítica. A grave situação não mudou com a chegada de Elpídio Nogueira, que assumiu o comando da Secultfor em janeiro

À reportagem do Diário do Nordeste, que detalha as cobranças feitas pelos trabalhadores da cultura, a secretaria reforçou que "se mantém à disposição para dialogar com a classe sobre as demandas e pleitos do setor". A gestão enumerou as ações realizadas ao longo de 2020:

"Diante da crise econômica e social gerada pela pandemia da Covid-19, em que o setor cultural foi, sem dúvidas, um dos primeiros a sofrer os efeitos, a Secultfor manteve ações de apoio aos artistas com as apresentações virtuais, o auxílio emergencial, o pagamento do Edital das Artes e a execução da Lei Aldir Blanc", destacou a secretaria. 

Secultfor x Pandemia? 

A reposta cita “ações de apoio aos artistas com as apresentações virtuais”, “auxílio emergencial”, “pagamento do Edital das Artes” e “execução da Lei Aldir Blanc". Vale conferir quais destas medidas são inéditas e projetadas pela Secultfor para amenizar os impactos da pandemia.  

“Ações de apoio aos artistas com as apresentações virtuais”. Aqui, é citado que a programação dos equipamentos culturais foi mantida. Ou seja, o que já existia em anos anteriores, passou a adotar o modelo virtual. No tocante a “execução da Lei Aldir Blanc", a PMF cumpriu o que determina a Lei Federal. 

A Aldir Blanc exige que municípios e Distrito Federal devem agir em duas frentes específicas. Do recurso que cabe ao município (Fortaleza recebeu R$ 17,8 milhões), a secretaria deve garantir o subsídio de R$3 mil a R$10 mil para a manutenção dos espaços culturais.  

Em outra esfera, 20% deste valor deve ser direcionado a ações de fomento à cultura. O que pode variar de pensar editais, por exemplo, voltados à aquisição de bens e serviços vinculados ao setor cultural. Em 2020, a Secultfor lançou duas ações.

O “Edital para Grupos ou Coletivos Culturais” (nº 7203) e “Edital para Artistas, Agentes Culturais e Profissionais da Cadeia Produtiva da Cultura” (nº 7204). 

Uma força à cultura 

“Auxílio emergencial” e “pagamento do Edital das Artes” guardam relação e podem ser explicadas juntas. Em abril de 2020, de forma emergencial, a Câmara Municipal aprovou antecipação do Edital das Artes 2020. 25% da verba de R$ 4,1 milhões (total de R$ 1 milhão) foi destinada ao programa "Uma Força para a Cultura 2020".  

A previsão era atender até cinco mil trabalhadores. Ao todo, 4.953 pessoas realizaram o cadastro. Deste total 3.744 foram aprovados em análise técnica e 3.729 receberam o recurso de R$200 (R$100 por dois meses). 

Para o “Auxílio emergencial”, a PMF pegou uma quantia já garantida por Lei ao setor cultural e a realocou. Com 48 horas de inscrição, mais de 1.300 pessoas efetivaram cadastro.

Para 2021, a pasta liderada por Elpídio Nogueira repete a iniciativa. Até 8 de abril, a Secultfor recebe a revalidação cadastral de quem recebeu o auxílio em 2020.

Para  "Uma Força para a Cultura 2021", o investimento informado reduziu em relação ao ano passado. De R$ 1 milhão passou para R$745.800,00. Segundo a Secultfor, por não ter atingido a meta dos cinco mil contemplados, parte da verba vai completar o auxílio de 2021.

A meta é atender até 3.729 profissionais. Caso as vagas não sejam preenchidas será aberto novo processo de inscrição

Prejuízos na pandemia

Outra situação segue indefinida nos quatro meses de administração Elpídio Nogueira. Maracatus, agremiações e blocos carnavalescos estão desassistidos. A Lei Orçamentária Anual (LOA) aprovada para 2021. garante mais de R$ 5 milhões para o Ciclo Carnavalesco, além de R$ 123 mil reais para o projeto “25 é Dia de Maracatu”. 

Nenhuma ação foi projetada. Nem mesmo o edital de “Carnaval fora de época”, a ser realizado virtualmente, conforme promessa de fevereiro, foi apresentado pela Secretaria de Cultura de Fortaleza até agora.

Ainda em março, (dia 17), a Secultfor enviou nota à reportagem. Pedimos, inicialmente, qual balanço a secretaria faz de sua colaboração nos 12 meses de pandemia. A resposta é a mesma do trecho citado no quinto parágrafo desse texto:  "Diante da crise econômica e social gerada pela pandemia da Covid-19, em que o setor cultural foi, sem dúvidas, um dos primeiros a sofrer os efeitos, a Secultfor manteve (...)."

Foi perguntado se existe algum plano em andamento, ou projeto que pense no reerguimento do setor até 2024. Outra questão é voltada à previsão dos editais do ciclo carnavalesco. "A Secultfor ainda prevê o lançamento de outras medidas de apoio, que seguem em estudo, aos trabalhadores da Cultura, a serem lançadas ao decorrer do ano".

Quais os entraves em utilizar o orçamento da secretaria no auxílio a artistas nesse momento?

"Em tempos de calamidade pública, como a pandemia sem precedentes pela qual estamos passando, os recursos previstos para as secretarias são contingenciados para uso emergencial para a Saúde. Mantemos a responsabilidade de encontrar caminhos e soluções para equilibrar as ações voltadas aos artistas. Fizemos isso no ano passado e continuaremos de forma aguerrida durante toda essa gestão, reunindo esforços de toda a nossa equipe e com o apoio e a sensibilidade do prefeito José Sarto", explica a nota.

A Secultfor confirmou que protocolou a carta aberta dos artistas nessa segunda-feira (5/4). A resposta deve vir ainda essa semana.

Nota da Secultfor emitida no dia 17/04:

"RESPOSTA - SECRETÁRIO ELPÍDIO NOGUEIRA:

"Diante da crise econômica e social gerada pela pandemia da Covid-19, em que o setor cultural foi, sem dúvidas, um dos primeiros a sofrer os efeitos, a Secretaria Municipal da Cultura de Fortaleza (Secultfor) manteve ações de apoio aos artistas com as apresentações virtuais, o auxílio emergencial, o pagamento do Edital das Artes e a execução da Lei Aldir Blanc, que beneficiou mais de mil artistas de Fortaleza de forma direta, além de profissionais da cultura de forma indireta, contratados pelos proponentes agraciados.

A Secultfor acredita que as ações destinadas à Cultura, principalmente diante do atual cenário de pandemia, devem ser construídas através do diálogo entre a gestão e os trabalhadores da Cultura. Neste ano, já foram realizados encontros com os membros do Conselho Municipal de Política Cultural (CMPC) e do Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Histórico e Cultural de Fortaleza (Comphic), além de reuniões com representantes dos fóruns das linguagens artísticas e das agremiações carnavalescas. A pasta ainda segue em constante diálogo com outros órgãos da Prefeitura de Fortaleza e do Governo do Estado do Ceará. Atualmente, estamos em fase de escuta e análise das melhores propostas para a categoria artística.

 Além disso, o prefeito de Fortaleza, José Sarto, anunciou, no dia 11 de março, um pacote de ações de proteção social destinado à população mais vulnerável da Capital, como medida de enfrentamento à pandemia da Covid-19. Serão investidos mais de R$ 31 milhões, beneficiando pelo menos 392 mil pessoas. Entre as ações, destaca-se o auxílio emergencial de R$ 200 (R$ 100 por dois meses) para profissionais do setor da Cultura.

A medida foi submetida à aprovação da Câmara Municipal de Fortaleza e prevê um investimento total de R$ 745.800,00 para 3.729 trabalhadores da cultura da Capital cearense. Após a edição da lei, será expedida portaria que regulamenta a concessão do benefício. O programa será lançado após esse trâmite, com a abertura das inscrições. A Secultfor ainda prevê o lançamento de outras medidas de apoio, que seguem em estudo, aos trabalhadores da Cultura, a serem lançadas ao decorrer do ano.

Em tempos de calamidade pública, como a pandemia sem precedentes pela qual estamos passando, os recursos previstos para as secretarias são contingenciados para uso emergencial para a Saúde. Mantemos a responsabilidade de encontrar caminhos e soluções para equilibrar as ações voltadas aos artistas. Fizemos isso no ano passado e continuaremos de forma aguerrida durante toda essa gestão, reunindo esforços de toda a nossa equipe e com o apoio e a sensibilidade do prefeito José Sarto"."